Plantas não convencionais geram renda para agricultores

Por Laura Carvalho

A beldroega, espécie que nasce frequentemente sem cultivo em vários tipos de terreno, é considerada por muitos uma erva daninha e descartada das plantações. Mas a planta é uma hortaliça com propriedades medicinais que pode ser usada em saladas e chás.

Assim como a beldroega, existem diversas hortaliças, frutas e raízes comestíveis pouco incorporadas à alimentação, elas são as Plantas Alimentícias Não Convencionais, conhecidas também como PANC

A definição desse grupo de alimentos é vasta, com mais de 350 espécies catalogadas. “Envolve tudo que não é corriqueiro na nossa alimentação, que não está nas gôndolas dos grandes supermercados. E aí vai de hortaliças tradicionais em algumas regiões a frutas silvestres", define Geraldo Aquino, coordenador da Rede PANC Bahia e professor de Biologia na Ufba.

Por não serem amplamente conhecidas, as PANC têm seu potencial nutritivo desperdiçado. “Existem dados mostrando que essas plantas são mais ricas em nutrientes do que as convencionais. A ora-pro-nobis, por exemplo, é uma planta riquíssima em proteínas”, afirma Geraldo.

De acordo com pesquisa realizada pela Associação Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (ABTA), as folhas da major-gomes, planta considerada invasora e conhecida na região Nordeste como bredo, apresentam 100% a mais de ferro que vegetais mais utilizados a exemplo do espinafre.

Pratos dos brasileiros

Décadas atrás, as plantas alimentícias não convencionais estavam mais presentes nos pratos brasileiros. Isso foi alterado com a mudança de padrão alimentar a partir da globalização, que gerou diminuição do consumo de alimentos locais e regionais.

O pesquisador da Embrapa na unidade Hortaliças Nuno Madeira afirma que resgatar as PANC é importante, principalmente, por conta das facilidades que elas proporcionam ao agricultor.

Devido à sua rusticidade, são adaptáveis a diferentes solos e climas. As nativas, geralmente, não demandam a compra de sementes. Apesar de responderem bem à adubação, elas nem sempre requerem esse processo. 

Além disso, não precisam de agrotóxicos ou outros produtos fitossanitários.

“Os produtores falam que está cada vez mais difícil produzir, que cada vez dá mais praga, cada vez a semente tá mais cara. E, do lado, tem um monte de comida nutritivamente muito mais rica e absolutamente adaptada e que pode vir a ser negócio”, afirma Nuno.

A facilidade de cultivo dessas plantas é destacada pela agricultora Lucia de Oliveira, que já as produzia em seu sítio, na zona rural de Camaçari, ainda antes de conhecer o termo PANC. Ora-por-nobis, vinagreira e serralha estão entre as espécies que mais saem da grande variedade que ela comercializa. A maioria nasceu espontaneamente em seu terreno.

A cultura quase não tem custo já que o processo de produção é simples. “Elas são boas para cultivar. Com um solo com muita matéria orgânica, elas dão bastante e com boa qualidade. Eu cultivo durante o ano inteiro. Só algumas que não aguentam muito sol ou muita chuva, mas num geral são fáceis de produzir”, diz Lucia


Para a empresária Vera Martins, outro fator que simplifica o cultivo das PANC, é sua resistência, que torna a manutenção dessas plantas mais fácil e barata. Além disso, Vera observa que elas costumam interagir positivamente com as espécies ao redor. “Você nem precisa desmatar ou se desfazer de outras coisas para plantar elas. Pelo contrário, mantém a agroecologia mais forte”, afirma.

Há cerca de 45 anos, Vera comercializa PANC no empório GRÃO, que hoje conta com três unidades em Salvador. 

O plantio de várias espécies é feito no quintal de sua casa. A empresária é uma entusiasta do tema e divulgadora dos benefícios e vantagens das plantas não convencionais. “É incrível porque a cada dia você descobre mais coisas. Você vê quanta coisa boa que dá pra plantar e consumir e a gente ignorou por anos”, diz.

Povos tradicionais

As plantas alimentícias não convencionais não costumam ser vegetais de monocultura e, geralmente, fazem parte da cultura de pequenos produtores e de povos tradicionais. Por se adequar a diversos ambientes, seu cultivo é mesclado com a produção de espécies convencionais. As PANC podem ser uma boa alternativa para o agricultor que busca diversificar sua produção e apresentar opções mais variadas e distintas das dos concorrentes.

Foi do desejo de produzir algo que não estivesse no mercado local, que Messandro Costa chegou às PANC. O agricultor, que também trabalha na área de tecnologia da informação, mas pretende em breve ser produtor em tempo integral, comercializa raízes alimentícias não convencionais, como inhame-roxo, mangarito e tupinambor.

Algumas espécies são nativas da sua fazenda em Candeias. Outras ele busca de diferentes regiões. Por se tratar de raízes, a produção tem um pouco mais de dificuldade. A cadeia é maior e às vezes as plantas de outros lugares não se adaptam ao solo do recôncavo baiano. Messandro já encontrou espécies que desconhecia em seu terreno e passou a comercializá-las depois de identificadas como comestíveis.

Assim como Messandro, Fátima Aparecida Mendonça, lavradora em Mucugê, preza pela diversidade em sua produção. Entre o que cultiva, o maior destaque é o arroz-vermelho. A cultura desse tipo menos popular de arroz está em sua família há gerações. Foi passado a ela pelos pais.

Rico em nutrientes, o arroz-vermelho tem um preço maior que o arroz branco por conta da sua produção mais trabalhosa. Mas isso não o impede de ser bastante atrativo. Aparecida conta que o interesse é constante entre os moradores da região e também por pessoas que vêm de fora.


Fonte: Jornal A Tarde

* Sob a supervisão da editora Cassandra Barteló

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