Fé na Festa Anatomia dos Festejos de Santo António na Bahia.

"Entre a memória e o esquecimento há um hiato, uma lacuna perigosa, que se deixada de lado, sem o reavivamento, pode ter um custo de uma morte geracional.

Memoria é a historia viva, individual e coletiva, e deve ser restaurada de tempos em tempos, como uma forma de celebrar a nossa existencia."

Eu pedi numa oração

Ao querido São João

Que me desse um matrimônio

São João disse que não!

Isto é lá com Santo Antônio!

Isto é lá com Santo Antônio!

Eu pedi uma oração

Ao querido São João 

Que me desse um matrimônio

Matrimônio! Matrimônio!

Isto é lá com Santo Antônio!”

As lembranças das rezas de Santo Antonio em minha cidade, Nazaré das Farinhas – Recôncavo da Bahia, povoam meu coração de alegrias.



Com elas começavam os festejos juninos, Santo Antonio – São João – São Pedro, dando início às conversas sobre fogueiras, balões, chapéus, fogos, roupas de caipira, comidas típicas, e sobre tudo que envolvia as comemorações juninas.

O Santo casamenteiro, sempre foi tratado com muitas regalias, as rezas  aconteciam em várias residências, envolviam muitos preparativos: preparação do altar bem decorado com paninhos brancos rendados, flores, velas e é claro a imagem de Santo Antônio.

As casas geralmente ficavam com um cheirinho gostoso de folhas de pitanga e flores. Tinham as mulheres que puxavam os cânticos. Mas o que mais me interessava além das rezas e cânticos, eram as comidas. Independente da situação econômica da família, os quitutes gostosos eram garantidos. 

Arroz doce de beber, mugunzá,  esses eram garantidos,  mingau de carimã, bolo de ovos, de carimã, de aipim, de tapioca.

Sequilhos, bolachinhas de goma. Pamonha de carimã. Em algumas casas tinha o sanduiche com um pãozinho redondo, recheado com um patê de sardinha. 

Um verdadeiro ritual prévio acontecia nas casas das famílias que rezavam Santo Antônio, o ritual da cozinha,  era tão sério e importante quanto a reza, afinal todos queriam ser bons anfitriões, as cozinheiras queriam mostrar seus dons, para que todos saíssem falando de como elas eram “caprichosas”.

Mesmo que nas treze noite de rezas, todas as casas servissem arroz doce e mugunzá, cada cozinheira queria preparar o melhor, o mais cheiroso e gostoso. Muito coco seco para quebrar, descascar, ralar, espremer nos paninhos limpos, tirar o leite grosso, tirar o leite médio, tirar o leite fino.

Fazer chá de erva doce, cravo, canela para temperar os mingaus. Providenciar água de rosas, da boa, para caprichar no arroz doce. Açúcar baunilhado para os sequilhos perfumarem. 

Ralar coco de costas para o bolo de coco ficar macio e úmido. Lavar carimã, colocar no saco para escorrer. Escolher a melhor farinha de tapioca do Mercado dos Arcos para o bolo ficar bom. 

Encomendar os pãezinhos na Padaria Estrela. O aipim, a goma e a carimã/puba, eram encomendadas com antecedência para chegar fresquinhas da roça. Era uma trabalheira.

Aipim, coco, tudo ralado no ralo mesmo, os leites de coco eram tirados no paninho, os bolos batidos à mão nas porcelanas com batedor de arame.

Na maioria das casas, tudo ainda era feito no fogão de carvão, inclusive alguns bolos eram assados nele.  

O importante é que cada família tinha algo gostoso a oferecer aos participantes da reza, quem tinha mais oferecia mais, fazia mesa farta, quem tinha menos, oferecia um arroz doce ou mungunzá e tava de bom tamanho,  ninguém reclamava porque era delicioso, quentinho, que dava um conforto ao corpo e ao coração.

Lembranças boas, era tudo tão gostoso, não é saudosimo não,  tudo era feito em outro ritmo, outro tempo, outra consciência, o resultado era uma comida inesquecível, com garantia que iria ficar na memória de todos que a provassem.

Se vocês observarem, nas comidas que cito acima, não tem comida de milho, porque esses ainda não tinham sido colhidos, estariam no ponto de colheita para as festas de São João e São Pedro. 

Mas voltando para os dias mais recentes, em 2020 realizei uma live falando sobre as comidas “de Antônio”, onde aproveitamos para falar sobre o “Santo Antonio Andarilho”,  que foi criado por Dona Denise do grupo Ganhadeiras de Itapuã, fruto de uma promessa que ela fez ao Santo e caso o pedido fosse atendido ela rezaria todos os anos a Trezena, que são as 13 noites que antecedem o dia de Santo Antônio.

Pedido atendido ela passou a fazer as rezas de Santo, mas com o tempo e o grande número de pessoas que compareciam, o Santo Antonio passou a ser andarilho, cada noite em uma casa, onde aquela família fica responsável pela organização, além dos comes e bebes.

E assim, com os seus devotos mantendo a tradição, Santo Antonio permanece forte e festeiro. Hoje com a correria da vida atual,  a maioria das pessoas encomendam as comidas em padarias ou com doceiras, mas o que importa é sentimento de festejar “Antonio” o Santo da Alegria, Esperança, Paciência.

VIVA SANTO ANTÔNIO! QUE O BOM ANTÔNIO ENCHA NOSSOS CORAÇÕES DE ALEGRIAS!

Bolo de Tapioca da Casa Dona Rosinha.



Ingredientes:

Açúcar Demerara – 02 xícaras

Farinha de Tapioca – 03 xícaras

Manteiga – 03 colheres de sopa

Ovo Caipira – 04 unidades

Leite de Coco natural – 300 ml

Coco ralado –  1/2 xícara

Fermento em pó – 01 colher de sobremesa

Sal Marinho – 1/2 colher de chá

Modo de Preparo:

Na batedeira coloque o açúcar, manteiga, sal e ovos, bata bem até ficar um creme homogêneo. Acrescente a farinha de tapioca, coco ralado e leite de coco, bata até incorporar todos os ingredientes. Acrescente o fermento, misture bem, sem bater.  

Unte uma forma para bolo com buraco no meio, com manteiga e povilhe com farinha de tapioca, coloque a massa do bolo. Leve para assar em forno pré aquecido a 180°.

Dicas:

  • Quando a Farinha de Tapioca é muito dura, deixo a massa descancar depois de batida durante uns 10 minutos, depos desse tempo acrescento o fermento, misturo bem, coloco na forma e levo para assar.

  • Caso queira pode assar em duas formas redondas de 20 cm, rechear e cobrir com doce de leite, decorar com ameixas e coco ralado tostado.

Para o chef Alício Charoth, com quem compartilho minhas lembranças das Trezenas de Santo Antônio com muito amor e carinho.

Chef Rosa Gonçalves, Casa Dona Rosinha

13/04/2021,  Itapuã, Salvador – Bahia


Comentários

Postagens mais visitadas