Alimentação, desterritorialização e as Plantas Tradicionais do Povo Tuxá

Os Tuxá têm um longo histórico de contato com a sociedade inclusiva. Denominavam-se e ainda são denominados de caboclos pelos regionais. 

O povo indígena Tuxá tem como origem os povos autóctones que habitaram imemorialmente os trechos encachoeirados do sub-médio São Francisco, onde hoje se encontram as divisas dos Estados da Bahia e Pernambuco.
Os relatos dos primeiros contatos de grupos indígenas destas regiões com a coroa portuguesa datam ainda do século XVI. No entanto, foi a partir da segunda metade do século XVII, com a atuação das missões religiosas, que passamos a encontrar maior número de relatos históricos sobre a presença indígena nos chamados Sertões de Rodelas.

Vivendo entre a sede municipal de Rodelas e a Ilha da Viúva (principal espaço de produção), os Tuxá se tornaram indivíduos altamente qualificados, tendo em vista o contexto regional. 

Da nascente à foz, o Rio São Francisco atravessa um contínuo território tradicional ocupado há mais de 9 mil anos atrás. Hoje nos seus mais de 2.800 km de extensão estão distribuídos 32 Povos Indígenas, em 38 territórios: Kaxagó, Kariri-Xocó, Tingui-Botó, Akonã, Karapotó, Xocó, Katokin, Koiupanká, Karuazu, Kalankó, Pankararu, Fulni-ô, Xucuru-Kariri, Pankaiuká, Tuxá, Pipipã, Kambiwá, Kapinawá, Xukuru, Pankará, Tupan, Truká, Pankararé, Kantaruré, Atikum, Tumbalalá, Pankaru, Kiriri, Xacriabá, Kaxixó e Pataxó. A população estimada é de cerca de 70 mil indígenas.

Desfrutavam dos serviços disponíveis numa pequena cidade sanfranciscana e suas crianças tiveram acesso à escola. Alfabetizados passaram a “exportar” professores, técnicos agrícolas e chefes de postos da Fundação Nacional do Índio (Funai) para aldeias de outras comunidades indígenas. 

São reconhecidos pelos demais indígenas como os responsáveis pelos primeiros “levantamentos de aldeia” no estado da Bahia e pela “instrução” de vários Povos indígenas do Nordeste na busca por direitos, reconhecimento étnico e pela retomada da “tradição”. 

A presença dos Tuxá no Vale do São Francisco é comprovada desde o final do século XVII. Tudo indica que compunha a nação dos indígenas rodeleiros, aldeados pelos capuchinhos franceses na Missão de São João Batista de Rodelas, recebendo, pelos Alvarás Régios de 1700 e 1703, área correspondente a uma légua em quadra.

Este território, segundo estudiosos, corresponderia as 30 ilhas existentes no rio São Francisco, localizadas próximas à margem esquerda do referido rio, na altura do município baiano de Rodelas, das quais foram expropriados ao longo dos anos. 

Na atualidade, a experiência dos Tuxá é marcada por uma tríade perversa que tem descaracterizado as duas principais Aldeias nas quais vivem este Povo: a ociosidade, o sedentarismo e o faccionalismo.

Por um tempo, os Tuxá se autodenominavam e ainda assim são denominados pelos demais habitantes de Rodelas. era o nome dado pelos portugueses aos seus aliados indígenas que viviam nas proximidades da costa.

Posteriormente, o termo passou a designar os ‘‘mestiços de brancos e índios’’, independentemente do grupo étnico ou tronco linguístico ao qual pertenciam. 

Entre os Tuxá, o termo caboclo designa o índio que, “sob o impacto da interação sociocultural com a sociedade maior” (CABRAL E NASSER, 1988: 133), mantém algumas das práticas de seus antepassados, se reconhecendo e sendo reconhecido pelos demais membros da sociedade como “diferente”. Hoje se afirmam identitariamente com o nome de ÍNDIOS TUXÁ, NAÇÃO PROCÁ, DE ARCO FLECHA E MARACÁ, ou simplesmente POVO TUXÁ.

Os Tuxá são, originalmente, indígenas das canoas, ou sejam, viviam das águas do Velho Chico. Eram e ainda são bons pescadores e dominam, como ninguém, complexas técnicas de pesca: são sábios na ecologia das águas e de diversas espécies de peixes. Portanto, além da agricultura, os indígenas praticavam e ainda praticam a pesca, a caça e o artesanato.

A presença dos Tuxá no Vale do São Francisco é comprovada desde o final do século XVII. Tudo indica que compunha a nação dos indígenas dos rodeleiros, aldeados pelos capuchinhos franceses na Missão de São João Batista de Rodelas, recebendo, pelos Alvarás Régios de 1700 e 1703, área correspondente a uma légua em quadra. Esta área, segundo estudiosos, corresponderia as 30 ilhas existentes no rio São Francisco, localizadas próximas à margem esquerda do referido rio, na altura do município baiano de Rodelas.

Convém salientar que os diversos grupos indígenas que vivem no São Francisco mantêm entre si rede de relações de reciprocidade. Em geral, os Tumbalálá, Tuxá e Truká remetem sua ancestralidade a uma nação comum, denominada de Procá, daí repetirem, frequentemente, o bordão “somos todos parentes” (ANDRADE, 2002, p. 3). 

Esses indígenas foram marcados por duas importantes experiências: a expropriação e a resistência. E todos os grupos indígenas que habitavam o Baixo Médio São Francisco foram sempre muito aguerridos.

Os Tuxá é o segundo grupo indígena reconhecido pelo Estado brasileiro na Bahia e o terceiro no Nordeste. Esta comunidade tem uma importância muito grande para os outros povos indígenas do Nordeste, haja vista, ter sido a etnia que ocupou um papel destacado num processo que ficou conhecido como “levantar a aldeia”, onde mestres, lideranças e pajés Tuxá tiveram um papel estratégico na afirmação e no reconhecimento étnico, em meados do século passado, de outros povos indígenas do sertão nordestino como os Kiriri, Truká, Atikum, Pankará e Tumbalalá (SALOMÃO, 2007). Eles gabam-se de terem ensinado, também, aos Kiriri de Mirandela, município de Banzaê (Bahia), a prática do toré, fato confirmado por inúmeros pesquisadores.

PRÁTICAS RITUAIS E FESTAS 

O Universo simbólico do povo Tuxá é, essencialmente, constituído pelo culto aos encantados/mestres, santos, caboclos e gentios. Essa dimensão simbólica está intimamente relacionada às águas do São Francisco, particularmente as cachoeiras, morada dos encantados e de outras forças espirituais que fazem parte da cosmovisão dos Tuxá. 


A maioria das ilustrações de Yacunã Tuxá retrata mulheres indígenas. “Gosto de pensar que são livres, fortes, guerreiras e que fogem aos moldes da colonização”, diz. A figura acima representa, para ela, a resistência. “Carregando o filho nos braços, ela luta, defende a existência e o futuro de um povo”, afirma. Yacunã encontrou na arte um instrumento para se aproximar da aldeia desde que se mudou para a capital baiana para estudar, há um ano e meio.

Essas cachoeiras, assim como as ilhas, lugares sagrados para os indígenas, foram destruídas pelas barragens. Em relação ao simbolismo e aos rituais dos Tuxá, sobressaem-se o toré, A MESA OU O PARTICULAR. 

O primeiro é uma das práticas rituais utilizada por todos os indígenas do Nordeste e tem se colocado como importante meio de afirmação diacrítica. Ele corresponde a uma espécie de folguedo, “brincadeira de índio”, que tem função lúdica e de interação social (ANDRADE, 2002, p. 221). Em geral, é “brincado” ou “dançado” nos momentos de “levantamento”, em dias festivos, bem como de demonstração de força política, assumindo, muitas vezes, caráter pluriétnico e multicultural – na expressão de Rodrigo Grunewald (2005).

Trata-se de uma manifestação celebrativa de caráter cultural e também religioso. Em muitas aldeias franciscanas o Toré é realizada como uma “dança circular”.

Os Tuxá, porém, realizam esse ritual a partir de duas filas paralelas. Assim, como o “particular”, os Tuxá, antes da Barragem, sempre praticavam o Toré, de 15 em 15 dias, alternadamente com o particular, sempre aos sábados. A partir do Toré, fortaleciam sua identidade enquanto Povo Indígena, celebravam, brincavam. Hoje, entretanto, em virtude do processo de desorganização provocado pela “chegada do estranho”, essa frequência não tem sido constante como antes.

Dinamam Tuxá, liderança que representa 78 povos do Sudeste e do Nordeste, garantiu que os índios são os guardiões de 82% da biodiversidade brasileira e que são vítimas da “política etnocida do governo brasileiro”.
“As consequências do desmonte da política ambiental indigenista que o governo está fazendo hoje vai repercutir por 20 anos, ou mais. E será toda a humanidade a pagar as consequências”, advertiu Tuxá.
Dinamam é Coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e Assessora Jurídica da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME).

Bacharel em Direito (2009) pela Universidade Vale do Rio Doce, Mestre em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília - UnB e Doutor em Direito pela mesma instituição, Conselheiro Nacional do Meio Ambiente (2015). Atualmente Dinamam é advogada, ativista social indígena com atuação em diversas áreas: juventude, meio ambiente e em questões de demarcação de terras indígenas.


A base da alimentação dos Tuxá era composta de raízes (batata doce e macaxeira) e complementada por frutas nativas (umbu, seriguela, fruto do araticum e quixaba), além de leite de cabra, provinha da caça praticada na região.


“Hoje, a única comida que a gente come saudável é peixe e pequenas hortas”, 
Ancelmo Libânio Tuxá, com essas mudanças, os produtos industrializados chegaram à aldeia.


Passados quase 30 anos da inauguração da barragem, Ancelmo e outras centenas de famílias que foram reassentadas nas proximidades da usina ainda lutam pelo direito à terra. Outra parte dos Tuxá preferiu migrar para uma região mais distante.

Assim como os Tuxá, muitos indígenas lutam pelo reconhecimento do seu território. 

A luta dos povos indígenas pela terra é marcada por muitos conflitos envolvendo fazendeiros e empresários do agronegócio, que se beneficiam com esses grandes empreendimentos. As barragens abastecem os perímetros irrigados cuja produção ocorre em grandes extensões de terra, com uso de venenos e aditivos químicos, causando forte degradação ambiental.


O Povo Indigena Tuxá de Rodelas faz uso de plantas consideradas sagradas em seus rituais de cura, como no Toré e na Mesa da Ciência Particular.
E assim, o conhecimento botânico desenvolvido pela sociedade indígena alia mitos, divindades, espíritos, cantos, danças e ritos, havendo perfeita interação entre o simbólico, o natural (botânico) e o cultural, onde o natural e sobrenatural fazem parte de uma única realidade.
Para compreendermos os conceitos de saúde e doenças em determinadas comunidades tradicionais, é de extrema importância a exploração de mitos e rituais, pois, estes elementos são tidos como codificações de conceitos-chave que transmitem conhecimento ecológico e princípios conservacionistas entre gerações, ou seja, são repositórios de conhecimentos práticos, e o modo de exploração do mundo vegetal, pelas comunidades indígenas, encontram-se diretamente expressos nos mitos e rituais dos grupos.
Desta forma, a medicina tradicional é fundamentada numa visão de coerência e interação do homem-cosmo-natureza, baseada numa visão mística ou mágico religiosa, ou seja, um ato de fé e equilíbrio do ser humano, natureza e cultura.
Para Mota (2007), não há separação entre mente e corpo e a doença é socialmente
construída por causa da desordem da dualidade mente-corpo, que é uma característica essencialmente humana.
Os povos indígenas têm um profundo conhecimento de sua flora medicinal, e dela retira variados remédios que emprega em diferentes formas.
As práticas curativas estão profundamente relacionadas com a maneira que o índio percebe a doenças e suas causas.
Neste contexto, este trabalho aborda a relação do Povo Indígena Tuxá de Rodelas - Bahia com a flora medicinal em conexão com seus ritos sagrados.
Na dinâmica da sociedade Tuxá as manifestações culturais e religiosas ainda permanecem viva, expressiva, situando-se no âmago do sistema de vida desse povo, assegurando, assim, a sua etnicidade. Encontrando-se os ritos e cerimoniais, as danças, os cânticos, a pajelança, o misticismo, mitologia, enfim, a sua cosmovisão (SAMPAIO-SILVA, 1997).
Segundo o autor, os ritos e cerimoniais seguem dois critérios: participação dos membros da comunidade e quanto ao significado intrínseco. membros da comunidade têm acesso, independente de sexo e idade, embora que em ocasiões especiais apenas o Pajé e seus iniciados participam do ritual.
Quanto ao ritual Particular, podem ser conceituados: a Mesa é um ritual evocativo, no qual o Pajé e o grupo cerimonial de iniciados entram em contato com o “Reino do Encantado”.
“A comunicação com os “encantados” ou “mestres encantados” se faz por meio de “incorporações ou enrramação” dos participantes do cerimonial que ingerem o vinho da jurema e fumam cachimbo de barro ou dos troncos da jurema.
A evocação dos “mestres encantados” pode ter variados objetivos, como por exemplo, saber se uma pessoa está doente, que doença a pessoa tem, solicitar receita para o tratamento da enfermidade, receber notícias de parentes, fazer promessas, entre outros.
Sendo que as promessas são as “obrigações” que devem ser prestadas aos encantados para atingir os objetivos esperados (SAMPAIO-SILVA, 1997).
É neste ambiente religioso que a espiritualidade e a religiosidade, somadas à crença nos poderes dos escolhidos, permitem aos seres humanos a comunicação com o sobrenatural.
E é nesta comunicação, em contato com as entidades invocadas (no caso, os encantados), que os índios vão buscar as soluções para os problemas que os afligem.

O USO DA JUREMA
Jurema é uma planta sagrada necessária às curas e a todas as atividades dos Povos Indígenas do São Francisco. Segundo Andrade Gomes (2009), a jurema ocupa um lugar bastante singular, pois, possui denotações múltiplas, que são associadas a um simbolismo complexo. Além do sentido botânico, a palavra Jurema designa, ainda, pelo menos, três outros significados a saber:


A jurema é utilizada no Sertão Nordestino desde os tempos imemoriais, existem poucas documentações a respeito da jurema durante o início da colonização do Nordeste, pois, seu uso, durante esse período era motivo de repressão.
E assim, na medida em que aumentava o processo de dominação na política e na economia,
aumentava também a pressão na cultura e na religiosidade.
Historicamente, a jurema representa um elemento ritualístico ligado à própria resistência dos povos indígenas.
Os rituais, tendo como centro a jurema, aparecem como forma de resistência indígena e popular, afirma o autor:
(Mimosa verrucosa Lin; Mimosa Mimos hostilis Benth..; Mimosa nigra Hub., Mimosa
Tenuiflora)
Preparado líquido à base de elementos do vegetal, de uso medicinal ou místico, externo e interno, como a bebida sagrada, "vinho da Jurema"; Cerimônia mágico-religiosa, liderada por pajés, xamãs, curandeiros, rezadeiras, pais-de-santo, mestras ou mestres juremeiros que preparam e bebem este "vinho" e/ou dão a beber a iniciados; Jurema sendo igualmente uma entidade espiritual, uma "cabocla", ou divindade evocada tanto por indígenas, como remanescentes, herdeiros diretos em cerimônias do Catimbó, de cultos afro-brasileiros e mais recentemente na Umbanda. (ANDRADE GOMES, 2009)
O vinho da jurema é preparado da casca e da entrecasca da jurema em infusão.
É bebido pelos adultos de ambos os sexos, por ocasião dos ritos secretos.
A ingestão do vinho da jurema e o fumo é condição para a vidência dos “encantados” e dos fatos distantes, passados ou futuros.
A ingestão do vinho da jurema ritualisticamente nos cerimoniais é um traço cultural observado na cultura indígena do Nordeste (LIMA,1946).
Segundo Albuquerque (1997), as plantas quando em rituais adquirem o papel de auxiliares, ou seja, elas configuram-se como seres complexos cujos papéis são de aspectos botânicos, farmacológicos e sociológicos, pois, estas são louvadas, cantadas, empregadas com o intuito de estreitar os laços com as entidades invocadas para propiciar curas e embasar conselhos.
Pode-se dizer que as plantas integram representações dos adeptos como meio de compreender a natureza das coisas e poder divisar o “invisível”.
O Povo Tuxá possui uma conexão de conhecimentos concebidos ao longo da história com seu ambiente. Resultado de uma interação de saberes adquiridos sobre plantas, animais, cerimônias e mitos. Refletindo diferentes experiências e atitudes sobre a diversidade biológica e o que dela pode ser obtido, a partir da utilização de recursos naturais disponíveis, que transcende para o sagrado


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