RECONHECIMENTO INTERNACIONAL DOS SISTEMAS ALIMENTARES TRADICIONAIS NO BRASIL
Desde 2020, a Dra. Eve Nimmo, curadora das coleções de Arqueologia e Etnografia Bryan/Gruhn no Departamento de Antropologia, tem trabalhado com agricultores tradicionais e agroecológicos do Paraná, Brasil, para obter reconhecimento como um Sistema de Patrimônio Agrícola de Importância Global (GIAHS).
O programa GIAHS , administrado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), reconhece sistemas agrícolas ao redor do mundo que desempenham um papel essencial na preservação da agrobiodiversidade, na segurança e soberania alimentar, e na manutenção do conhecimento e da cultura tradicionais.
De 17 a 20 de março de 2025, o Dr. Nimmo liderou uma visita in loco com uma representante do Grupo Consultivo Científico da FAO, Dra. Norma Ruz Varas, que veio aprender sobre os sistemas tradicionais e agroecológicos de erva-mate, foco da candidatura. Esta é a etapa final da avaliação da FAO sobre a proposta de erva-mate cultivada à sombra (GIAHS). A delegação visitou propriedades nos municípios de Rebouças, Inácio Martins, Irati, São João do Triunfo e São Mateus do Sul, no sul do Paraná, e incluiu líderes comunitários, comunidades tradicionais de Faxinal, povos indígenas, sindicatos de agricultores familiares, pesquisadores e agricultores, além de representantes dos governos federal, estadual e municipal.
A visita
A visita de quatro dias foi organizada pela Dra. Nimmo e seus colegas da CEDErva, uma ONG local, para destacar os muitos impactos e benefícios importantes dos sistemas tradicionais de cultivo de erva-mate à sombra no Centro-Sul do Paraná. A visita incluiu cooperativas, diversas propriedades rurais familiares, comunidades indígenas e tradicionais e organizações de pesquisa.
No dia 17 de março, o grupo visitou a Cooperativa Mista para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar de Rebouças (COMDAFAR), onde conheceu a logística e a comercialização de produtos da agricultura familiar agroecológica, especialmente para os programas estaduais e municipais de alimentação escolar. No dia 18, a Terra Indígena Rio d'Areia, no município de Inácio Martins, recebeu a equipe com uma roda de chimarrão e apresentação de danças tradicionais realizadas pelos jovens da comunidade. Após o almoço na comunidade, a comitiva seguiu para o assentamento de reforma agrária Fazenda Velha, onde visitou a propriedade de Joscimar, que expõe atividades agroecológicas ligadas à erva-mate e outros produtos da Floresta com Araucária.
Após o almoço, a delegação seguiu para a comunidade tradicional Faxinal de Emboque, em São Mateus do Sul, onde foi recebida pela família Wenglarek. Durante a visita, os participantes aprenderam sobre o sistema tradicional Faxinal, um modo de vida e prática produtiva que refletem a história e a identidade da região. A família compartilhou não apenas uma demonstração do processo artesanal de colheita, que inclui um processo de secagem rápida em fogo aberto para preservar as folhas de erva-mate, separá-las em maços e levá-las ao moinho artesanal de folhas da propriedade, mas também relatou o desenvolvimento histórico do sistema Faxinal. O debate destacou a luta e a organização da comunidade para garantir o reconhecimento e a preservação desse modo de vida.
No dia 20, o grupo visitou a agroindústria 5 Estrelas, em São João do Triunfo, uma empresa familiar que mantém a tradição da produção de erva-mate há gerações. Durante o passeio pela propriedade, o proprietário, Sr. João Negir, conduziu os visitantes por uma floresta repleta de histórias e biodiversidade. Ele fez diversas pausas para compartilhar seu conhecimento sobre as espécies nativas, destacando, por exemplo, uma imbuia com mais de 600 anos. De volta à agroindústria, o grupo foi recebido com um delicioso bolo de erva-mate e um refrescante chá mate gelado, símbolos da hospitalidade local. A representante da FAO visitou então a unidade de processamento de erva-mate, onde pôde aprender sobre as etapas de produção e entender como a tradição se alia à tecnologia para manter a qualidade e a autenticidade do produto.
Após um almoço oferecido pelo prefeito de São João do Triunfo, Mário Cezar da Silva, o encontro foi encerrado no Barracão da Cidadania, marcando um momento de reflexão e diálogo sobre o papel central que a erva-mate desempenha na cultura, no desenvolvimento socioecológico e na economia da região.
Durante o encontro, foram abordadas questões-chave, como a necessidade de fortalecer a cadeia produtiva da erva-mate, o comprometimento das instituições presentes em fomentar o desenvolvimento sustentável dessa economia e as oportunidades estratégicas que surgiriam com a possível aprovação do reconhecimento do GIAHS para a erva-mate de sombra.
Como um reconhecimento do patrimônio agrícola e cultural, o GIAHS não só trará visibilidade e valorização à erva-mate de sombra, mas também abrirá novas perspectivas para produtores e comunidades locais, impulsionando a economia e preservando o conhecimento tradicional. O encontro reforçou a união e a colaboração entre os participantes, destacando a importância do trabalho coletivo e comunitário para garantir um futuro mais próspero e sustentável, conectado às raízes históricas e culturais da região.
O aplicativo GIAHS
Desde março de 2020, agricultores tradicionais e agroecológicos do Paraná e seus parceiros vêm trabalhando no pedido de qualificação dos Sistemas Tradicionais de Erva-Mate como GIAHS. O grupo trabalhou por mais de 18 meses, realizando reuniões regulares de forma remota devido à pandemia de COVID-19, o que resultou nos dois documentos submetidos à FAO: um extenso dossiê sobre todos os aspectos que caracterizam os sistemas e um plano de ação dinâmico para a conservação, que delineia as ações que serão realizadas nos próximos cinco anos.
Esta candidatura é liderada pelo Observatório dos Sistemas Tradicionais e Agroecológicos de Erva-Mate, lançado em 2019 — que reúne mais de 30 instituições, entre sindicatos de agricultores familiares, prefeituras, centros de pesquisa, universidades e organizações do terceiro setor — e foi coordenado pela Dra. Eve Nimmo e membros do CEDErva (Centro de Desenvolvimento e Educação da Erva-Mate Tradicional).
O reconhecimento do GIAHS vai além de um título simbólico. Representa um importante mecanismo de valorização de sistemas agrícolas que integram o uso sustentável dos recursos naturais e práticas tradicionais de manejo. Ao conceder esta qualificação, a FAO promove a preservação das culturas tradicionais, incentiva o desenvolvimento da agroecologia e melhora a qualidade de vida das famílias agricultoras, fortalecendo a identidade cultural e a agrobiodiversidade.
Mais informações podem ser encontradas em:



Comentários
Postar um comentário