Pães com selo de qualidade alemã e mãos brasileira.
Depois de uma temporada em Colônia, onde trabalhou em uma padaria, paulistano volta para Brasília e põe todo o seu aprendizado na produção de pães artesanais.
Nascido na Zona Leste de São Paulo, Fábio conseguiu, aos 24 anos, uma bolsa do Prouni para cursar a faculdade de história em Porto Alegre. Na capital gaúcha, conheceu a mulher, uma alemã que trabalhava numa organização não governamental (ONG), e teve o primeiro filho. Com o sonhado diploma universitário em mãos, mudou-se para o Uruguai para fazer mestrado. Por lá, ficou três anos e teve o segundo filho.
Em 2014, a esposa de Fábio recebeu uma proposta de trabalho em Brasília. Mas as coisas não foram muito bem para o paulistano em terras candangas. Como não conseguiu emprego na área profissional, fez bicos como DJ. “Eu não estava feliz”, admite. Dois anos depois, porém, apareceu a chance de a família sair do Brasil, novamente por conta da mulher.
“Surgiu uma oportunidade de emprego em Colônia, cidade natal dela. Como as crianças não tinham convívio com os avós, achamos que a mudança seria boa.
Mas, depois de quase dois anos pedalando pelas ruas de Colônia, Fábio estava cansado. E, como o nível de alemão dele tinha melhorado bastante, achou que era hora de galgar outra ocupação. “Minha esposa me perguntou: por que você não aprende a fazer pão? Uma das coisas que o alemão mais sente falta quando sai do país é de comer pão.”
De cara, Fábio não achou uma boa ideia, pois teria que mudar radicalmente os seus hábitos de sono. “Padeiro trabalha madrugada adentro, e eu não queria isso.” Mas, depois de pensar na proposta com carinho, candidatou-se a uma vaga de estagiário em uma padaria que ficava em seu bairro e tinha um certo prestígio. Na primeira semana, ele odiou o trabalho, já que ficou mais fazendo limpeza do que pão. Na segunda, começou a colocar mão na massa e já não achou tão ruim. Na terceira, com o relógio biológico regulado, encantou-se pela profissão.
Para ser padeiro na Alemanha, é preciso se submeter a uma prova. Fábio tinha duas opções: fazer um curso técnico, com aulas semanais, ou trabalhar por quatro anos na padaria e, depois, ser avaliado e obter o diploma. Escolheu a segunda alternativa. “Eu estava apaixonado por fazer pão. Em casa, testava receitas. Estava determinado a pegar pesado no aprendizado”, conta.
Na mesma época, surgiu uma oportunidade de emprego como professor de crianças de 6 a 11 anos. “Acabei me dividindo: trabalhava meio período na padaria e meio período na escola.” E assim foi por um ano e sete meses.
Brotkultura
Em fevereiro do ano passado, um pouco antes de a pandemia explodir, a mulher e os filhos de Fábio voltaram para Brasília.
O paulistano, porém, não retornou de imediato. Queria ter mais um tempo de aprendizado. A ideia era passar, pelo menos, mais um ano lá — a cada quatro meses ou ele vinha para o Brasil ou a família ia para Colônia. Mas, com o agravamento da crise sanitária, o arranjo ficou impossível.
Fábio antecipou o retorno a Brasília para julho do ano passado, com a ideia de reproduzir tudo o que tinha aprendido na Alemanha. “Muito se fala da panificação francesa ou italiana, mas a alemã é a que tem a maior variedade de pães: são mais de 3.200 tipos.”
Em um primeiro momento, Fábio contou com a ajuda do CSA Madre Terra, que leva alimentos orgânicos, sustentabilidade e corresponsabilidade aos clientes, para comercializar seus pães. Em pouco tempo, com o boca a boca, criou a própria clientela — parte dela formada por alemães. “A minha mulher tinha razão. Quando os alemães que moram aqui souberam que eu fazia pães com as técnicas de lá, logo apareceram.”
Fábio destaca que uma das características da panificação alemã é ser mais nutritiva. “Usamos muitos grãos, além de farinha integral e de centeio”, detalha. O levain (fermento natural) é à base de farinha de centeio, que tem menos glúten e confere uma cor mais escura aos pães. O centeio usado pelo padeiro vem do Sul do país, que, por ter uma forte colonização alemã, conta com produtos de melhor qualidade.
Entre os carros-chefe da Brotkultura está o bretzel, um dos mais típicos pães alemão. “Ele leva sal grosso em cima. Testei usar os daqui, mas não deu certo, porque derretia. Passei a importar da Alemanha”, exemplifica todo o cuidado que tem no preparo.
Tanta dedicação rendeu a Fábio o prêmio Preto Empreendedor, fornecido pela Central Única das Favelas (CUFA), representando Brasília.
A premiação escolheu os empreendimentos negros mais impactantes da sociedade em 2020.
Hoje, Fábio já conta com dois fornos, um ajudante e fornece os seus produtos duas vezes por semana, às terças e aos sábados. O cardápio é divulgado na conta da Brotkultura no Instagram, e os pedidos podem ser feitos com, no máximo, 24 horas de antecedência.
“Mas, principalmente no sábado, os pedidos costumam se esgotar antes das 24 horas”, alerta. Nem por isso, o padeiro pensa em ampliar a demanda. “O meu pão é artesanal e não quero perder a qualidade em nome de quantidade”, justifica. Os produtos dele também podem ser degustados no Antonieta Café.
Em julho, Fábio pretende passar mais uma temporada em Colônia. Quer voltar à padaria onde aprendeu tudo o que sabe e aperfeiçoar os ensinamentos. Com certeza, voltará cheio de novidades. Os amantes do pão agradecem!
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