A cozinha e o fogo “ O grande sinal de conquista da cultura”.

Os seres humanos são os únicos animais que cozinham sua comida, uma inovação que mudou o curso de nossa evolução e a trajetória do planeta. 

Mas como nós domamos os primeiros fogões de cozinha e os colocamos em uma caixa - e o que os subsequentes avanços na tecnologia de aquecimento podem nos dizer sobre culinárias e cultura?

Durante a maior parte da história humana, a fogueira era a única maneira de cozinhar uma refeição. 

As pessoas começaram a cozinhar dessa maneira há quase dois milhões de anos, de acordo com o antropólogo Richard Wrangham, autor de Catching Fire.

A história da cozinha, e também de sua arquitetura, é praticamente a história da evolução do fogo e do fogão.

Já a história dos utensílios são reflexos das dificuldades nutricionais, gostos e necessidades que cada civilização teve ao longo do tempo.

De acordo com os estudos arqueológicos, há evidências de que os recursos naturais que os homens primitivos tinham à mão determinaram a cultura culinária das civilizações.

Por exemplo: povos que viviam próximos ao mar utilizavam conchas e cascos de tartaruga como cumbucas primitivas, o que delineou suas preferências alimentares. 

Os asiáticos, tão bem providos de certos tipos vegetais, utilizavam copos feitos de bambu; da mesma forma, os americanos pré-Colombo tinham diversas tigelas feitas de pedra.

Um dos aspectos mais interessantes da história dos utensílios de cozinha é a prova de que existe um “darwinismo gastronômico”, nas palavras da pesquisadora Bee Wilson. 

A especialista, em seu livro Consider The Fork, observou que na cozinha a tecnologia só sobrevive quando é útil, ou seja, o que é prático nunca sai de cena. 

Exemplos: a colher de pau e a própria panela. Estes sobreviventes foram capazes de moldar costumes tanto à mesa quanto no uso do fogão.

No entanto, é possível dizer que a história dos utensílios de cozinha tiveram maior desenvolvimento em três momentos da humanidade:

*A descoberta do fogo, graças ao qual foi possível fundir metais e produzir utensílios mais precisos, pois até então a pedra era o principal material culinário;

*A descoberta da cerâmica, que possibilitou moldar panelas e recipientes mais resistentes ao calor;

*E a primeira Revolução Industrial, que popularizou utensílios metálicos e facilitou a disseminação de hábitos de mesa da nobreza europeia.

O caso da cerâmica é ainda mais interessante

Por ser menos porosa, com este material o homem conseguiu fazer panelas rudimentares e pela primeira vez utilizar a água no preparo dos alimentos, que, até então, era basicamente cereais moídos e carnes assadas. 

Só para ver o quanto isso impactou na história dos costumes culinários do mundo, pense que foi graças aos primeiros ensopados que o homem conseguiu separar a gordura, utilizada a partir de então para refogar, guisar e fritar carnes e vegetais.

Os utensílios ao longo das eras

Na Idade Média era comum cozinhar com fogo aberto, e os utensílios eram feitos de barro, ferro ou bronze; na época já existiam as panelas, frigideiras e caldeiras, além de facas, colheres, espetos e tesouras.

No Renascimento surgiram as balanças, garfos e grelhas.

No século XVII, com a Revolução Industrial, pela primeira vez houve uma melhora significativa dos materiais e utensílios de cozinha.

Nesta era, utensílios de maior qualidade puderam ser produzidos e vendidos por menores preços, o que ajudou a difundir certos costumes pela Europa afora; exemplo: o uso do garfo para comer macarronada.

Além disso, graças à melhoria dos meios de transporte, os alimentos perecíveis puderam cruzar maiores territórios.

Foi quando o consumo de pescados se intensificou, e novos pratos e modos de preparo foram inventados pelos chefs da época. Acompanhando o surgimento de novos pratos, vieram novos utensílios de corte e preservação.

A partir da Revolução Industrial, as mudanças de costumes e surgimento de novos utensílios seguiram uma cadência exponencial. No século XIX novos materiais figuraram nas cozinhas e mesas: cobre, novos usos do ferro, panelas de alumínio, cerâmicas de maior qualidade.

Uma curiosidade: acultura francesa era muito valorizada na Europa e suas colônias, e por isso os utensílios, costumes e pratos de sua cozinha foram copiados mundo afora.

Em relação aos utensílios de cozinha, o século XX foi a era do plástico e seus derivados.

Com a descoberta do material (que se deu, na verdade, em 1850, mas só mais tarde foi popularizado), utensílios pesados foram pouco a pouco sendo substituídos.

Depois dos anos 1950, os lares foram invadidos por novos e inovadores produtos, impulsionados pela industrialização e da força propagandeada do “sonho americano”.

Sobreviventes e aposentados

Os utensílios que mais sobreviveram ao tempo são os que vêm à mente toda vez que pensamos em cozinha: garfo, faca, colher e panela.

Esta surgiu em 10.000 a.C. na América do Sul e representou uma revolução nutricional à humanidade: se antes os povos utilizavam conchas, cascos de tartaruga e até mesmo estômago de animais para preparar os alimentos, foi graças à panela rudimentar que o homem percebeu que podia usar a água para cozinhar, esquentar e amolecer o consumo de alimentos até então não duros demais para serem consumidos.

A faca, de origem Etíope, surgiu antes mesmo do fogo. Era multiuso, pois além de servir de arma, cortava em pedaços os alimentos que os dentes não podiam triturar.

Curiosidade: algumas das leis da etiqueta à mesa surgiram na França para evitar que acidentes acontecessem no manejo da faca nos banquetes da aristocracia.

A colher surgiu provavelmente três séculos antes da era cristã. Antes dela eram utilizados galhos e conchas para se alimentar de líquidos e substâncias pastosas.

O garfo seria o caçula deste time de sobreviventes, pois apareceu apenas no século XI, já na Europa.

Havia muito preconceito quanto ao seu uso, já que seu formato é análogo ao tridente do diabo, e a Idade Média levava mais a sério os símbolos religiosos. 

A superstição caiu abaixo quando os italianos passaram a utilizar o garfo para a macarronada, e o costume foi logo associado à nobreza: costumava-se comer macarrão com a mão, o que, após a popularização do garfo, ficou associado às classes baixas.

Nós anais da história culinária também há utensílios aposentados, sejam por motivos de obsolescência ou mesmo fracasso.

Por exemplo: em 1940, um australiano criou o spork (spoon + fork), uma mistura de colher e garfo, a pesar da boa intenção, na prática o utensílio não cumpria nenhuma das duas funções, e não resistiu ao desuso.

O batedor de ovos manual, que surgiu no fim do século XIX nos Estados Unidos e foi popularizado para produzir bolos, claras em neve e outras misturas, teve vida de mais ou menos cem anos, pois em 1917 surgiu a batedeira elétrica.

No entanto, o mercado prova que o batedor manual pode voltar à vida, em especial aos amantes nostálgicos da cozinha.

Por fim, o Pilão.

O utensílio surgiu há 20 mil anos na África com fins de triturar cereais e ervas, o que foi a causa da sensível melhoria nutricional e medicinal das tribos. Nas cozinhas de hoje ele não costuma ser utilizado, a não ser para fazer molho pesto ou servir de decoração, já que os processadores de alimentos cumprem a função em tempo muito inferior.


Comentários

  1. Artigo interessante. Mas também é muito aproximado. Duvido que você tenha uma visão precisa da história das panelas. Por exemplo, você diz que o garfo-colher foi inventado por um australiano em 1940. Eu sei que esse utensílio existe entre os cabilas há séculos. Um museu na Suíça tem uma cópia. O cuscuz entre os cabilas nunca é comido com os dedos.
    Além disso, você diz que a massa é de origem italiana, exceto que se trata de monopolizar a herança dos norte-africanos. As massas e os garfos vêm do norte da África, berço da civilização humana.

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