Patrimônio imaterial de Palmeira, pão no bafo resgata heranças culturais de imigrantes

Costelinha suína fresca e defumada, repolho ou chucrute e pãozinho fermentado que cozinha no vapor da carne. Essa é a combinação necessária para o pão no bafo, receita centenária que virou símbolo de Palmeira, nos Campos Gerais do Paraná.

Uma das principais responsáveis por tornar o prato o primeiro patrimônio cultural imaterial do município foi a chef Rosane Radecki, que administra junto com a mãe administra um restaurante na cidade.


Ela conta que em 2015 foi convidada a participar do projeto Gastronomia Paraná, iniciativa do governo estadual que busca fortalecer e divulgar o trabalho de chefs paranaenses e a comida regional.

Ao ser desafiada a preparar um prato significativo para a cidade, ela se lembrou da receita que fez parte da sua infância e era consumida na casa de uma amiga descendente de russos-alemães. “Foi um sucesso”, relembra.

Na sequência vieram mais eventos nos quais a chef sempre trazia a iguaria. Determinada a exaltá-lo cada vez mais, ela manteve contato com gestores municipais para ajudar o prato a ganhar mais destaque. Deu certo: ainda em 2015 veio o reconhecimento como patrimônio imaterial de Palmeira.

Receita traduz mistura étnica

O pão no bafo é um exemplo de como a alimentação ajuda a contar histórias.

“Comida não é só sabor e nutrientes, ela conta histórias e ajuda a contar quem somos e de onde viemos, e é isso que o pão no bafo faz para a gente, ele conta a história da trajetória e do deslocamento desses imigrantes”, defende o historiador Felipe Pedroso.

Conforme o especialista em cultura alimentar, os imigrantes, nesse caso, são os russos-alemães, ou alemães do Volga, que se estabeleceram em Palmeira por volta de 1878.

O historiador cita que, muito provavelmente, o prato surgiu na Alemanha, mas com o deslocamento dos alemães para a Rússia, a receita ganhou novas camadas.

“Junta-se o chucrute alemão ao pão no vapor, que se relaciona ao conhecimento dos russos com a produção de trigo, e mais a carne suína, principal fonte de proteína animal nessa região, e tem-se um prato com a identidade característica desses grupos, justamente porque carrega traços culturais das regiões pelas quais o prato passou”, detalha.

Atrativo turístico

Hoje, além do Restaurante Girassol, administrado pela chef Rosane Radecki, outros oito restaurantes servem a iguaria na cidade, segundo a prefeitura.

“Já sirvo o prato há bastante tempo, e ele sai bastante todos os dias, muita gente vem de fora da cidade e do estado para experimentar, também ofereço a versão congelada para finalizar a preparação em casa”, complementa.

O historiador destaca que a chef teve um papel importantíssimo na recuperação da receita.

"Foi fundamental, porque acabou difundindo o prato para paladares muito diferentes daquela cultura, a iguaria passou a ser consumida por outras etnias, caiu no gosto popular”, defende Felipe.

Mais do que uma valorização da ancestralidade e uma forma de recuperar as diferentes identidades étnicas de uma região, o pão no bafo também beneficia o turismo local.

“Uma maneira espetacular de trazer a história de outras pessoas para o presente é através do alimento. Isso agrega muito ao turismo, valoriza a cidade”, finaliza o historiador.

Além de Palmeira

Agora, o próximo passo é levar a iguaria centenária ainda mais adiante. A chef adianta que estão no início do trabalho para pedir o reconhecimento da Indicação Geográfica do prato pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

"Ainda estamos bem no começo, precisa formar uma associação para desenvolvê-lo, mas até dezembro é para o pedido de IG já estar protocolado junto aos órgãos responsáveis. Vamos poder chamar o prato de 'pão no bafo de Palmeira’, vai dar ainda mais notoriedade à receita”, diz a chef.

G1

Comentários

Postagens mais visitadas