“O doce nosso de cada dia” III Seminário da Tradição Doceira.

 Por Diones Forlan -12 de julho de 2024

  

Foi realizado, no dia 6, no Centro Cultural de Eventos Valdino Krause, o III Seminário de Tradição Doceira, que integra a Semana do Patrimô­nio Imaterial Doceiro de Morro Re­dondo (Lei nº 2.337/21), com o tema “O doce nosso de cada dia”. A orga­nização é da Prefeitura, Câmara de Vereadores, Grupo de Trabalho da Salvaguarda e Emater/RS. O semi­nário também fez parte da progra­mação integrante do Congresso In­ternacional de Patrimônio Cultural e Sustentabilidade (CIPCS), que ocor­reu no Campus I da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), entre os dias 3 e 6, organizado pelo Gru­po Fábrica de Memórias da Univer­sidade Federal de Pelotas (UFPel) e da UCPel.



Na sequência, Pedro Vieira, di­retor de Turismo, da Secretaria Mu­nicipal de Desenvolvimento Rural e Turismo, relatou que a ideia da pri­meira festa do Roteiro Morro de Amores, que surgiu há oito anos, era dar destaque aos empreendimen­tos locais. A primeira festa foi um su­cesso e a cada ano se pensou em ampliar as atrações. Vieira comen­tou ainda que a criação da Festa do Doce Colonial foi inspirada na Fena­doce. “Em diálogo, na época, com o antropólogo Daniel Vaz Lima, mo­rador do município, surgiu a possi­bilidade de fazer algo que contasse o que tem por trás desta história do doce no tacho”. Na ocasião, houve o registro no Livro dos Saberes pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) do saber fazer doceiro. O diretor destacou que, os poucos, está ocorrendo o resgate histórico e a realização do Seminário é uma forma de salva­guardar a tradição doceira.


Representando a Embrapa, Sérgio Bender lembrou que me­xer o tacho reportou ao seu tem­po de infância e declarou que a en­tidade estará sempre junto para apoiar a causa.


O chefe do Escritório Municipal da Emater/RS, Evaldo Voss, disse que é bom ver que, com a chega­da de várias pessoas no município com o fomento do turismo, acaba trazendo outras perspectivas. Ci­tou que a Emater tem apoiado as agroindústrias, que estão partici­pando de vários eventos em outros municípios e até outros Estados. Comentou ainda que foi lançado recentemente o Plano Safra, que é uma oportunidade para o setor, e que estão sempre prontos para colaborar.


Representando o CIPS, a profes­sora Francisca Michelon disse que “a cidade de Morro Redondo tem um aroma importante, tudo aqui cheira muito bem e tem um colorido. Nem as mudanças climáticas tiram a cor e aroma desta cidade do doce. Es­tamos muito felizes de fazer parte dessa atividade”.


Ao final da abertura, a exten­sionista rural da Emater municipal, Adriane Lobo, integrante do Grupo de Trabalho de Salvaguarda da Tra­dição Doceira, expressou que atra­vés do Instituto de Ciências Huma­nas de Pelotas, foi disponibilizado para o seminário os dois livros de pesquisa produzidos sobre os do­ces finos e os doces coloniais. Sa­lientou que o seminário também serve como resgate das etnias que fazem parte da tradição doceira.


Em seguida, foi convidado para fazer parte do painel o presidente da Associação Quilombola do Qui­lombo Vó Ernestina, Silvio Barboza. Ele contou como era o trabalho na sua infância com o doce e apresen­tou várias diferenças do jeito pro­duzido antigamente para o atual. Nos dias de hoje, por exemplo, o figo, que na época era seco, hoje é chamado de cristalizado; o pêssego que se secava para fazer com arroz; da laranja que era ralada e colocada dentro de um saco na água corren­te do arroio por cinco dias. Apontou outros produtos feitos, como a mar­melada, passa de pêssego, doces de abóbora, batata doce e de cenoura. “Tudo feito a mão com muita dificul­dade. Era uma fonte de renda para família de 15 irmãos”. Ao final, agra­deceu por poder compartilhar a re­lação do passado com hoje sobre o Doce Nosso de Cada Dia.


Representando os Doces Vô Jordão, a agricultora Cíntia Costa Alves, expressou a história da famí­lia desde 1965 e que já está na quar­ta geração detentora da produção de doce. “O plano inicial, com a li­beração da Vigilância Sanitária, que deverá ocorrer nos próximos dias, será participar de diversos eventos, produzir em grande escala para le­var o doce e a história da família para o mundo”. Sobre as dificulda­des para quem sonha em legalizar um empreendimento deste fim, Cíntia aponta para o recurso finan­ceiro. “O processo de regularizar vale muito a pena. O investimento dependerá do tamanho da estrutu­ra, do espaço que for necessário. A gente tem que amar o que faz para manter esta tradição viva. Senti­mos gratidão por tudo que foi fei­to”, celebrou.


A presidente da Associação Amigos da Cultura e do Conselho Municipal de Cultura, Patrícia da Silva Hackbart, destacou que o encontro oportuniza falar da importância da tradição doceira para o município. Sobre memórias, patrimônio e museu, Patrícia lançou uma provocação: “Tem doce no Museu de Morro Redondo?” A partir da pergunta, afirmou que os objetos expostos no museu servem tanto para ativar as memórias quanto para contar a história. “Este patrimônio cultural, o saber fazer doceiro, foi registrado para que seja garantida a sua proteção. Ele importa para a memória e identidade das pessoas que viveram, vivem e construíram este lugar muito antes deste registro. Ele só continuará existindo se esta mesma comunidade quiser e a forma de continuá-lo é realizando a sua prática (cultura) e, também o seu resguardo”, concluiu Patrícia.


Na sequência, a historiadora Amanda Mensch Eltz trouxe o tema das Hortas Urbanas para o Seminário, discorrendo sobre os aspectos da legislação, a importância social e para a segurança alimentar, as possibilidades de usos de espaços públicos para a ação e a relação desse tema com a Tradição Doceira, já que em muitos municípios, em especial os pequenos como Morro Redondo, é possível ver as pessoas colhendo seus produtos e transformando-os em alimento posteriormente.


Após, foi dada continuidade à Roda de Conversa “O doce nosso de cada dia”, na qual surgiram diversos temas que abrangem a cultura no que tange a produção, transformação, consumo e comércio dos doces provenientes da produção própria de frutas e legumes, a forma de colher a fruta, proporcionando segurança alimentar para a família, memórias de colheitas, preparos de doces e, especialmente, o uso dos utensílios, como o tacho e as colheres de madeira, que têm restrições na legislação sanitária e sempre geram um debate a respeito do impasse entre a tradição e o que é permitido por lei.


Após, a coordenação do evento, em nome do GT da Salvaguarda da Tradição Doceira, agradeceu a presença e a contribuição de todos e anunciou que será elaborada a Carta do III Seminário da Tradição Doceira e divulgada a todos. “Consideramos que o evento foi um sucesso, pois, além de termos a presença dos doceiros, que é o que muito nos importa, ainda tivemos a presença de um grupo de alunos e professores da UFPel, o que qualificou ainda mais essa atividade. Queremos a cada ano envolver mais a comunidade, pois é para dar voz aos seus saberes que o seminário é realizado. Agora, já começaremos a pensar na construção do IV Seminário”, declarou Adriane.


Esteve presente também o secretário de Educação, Cultura e Desporto, Anderson Guths (Teko), representantes dos poderes Executivo e Legislativo, dentre outros.



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