Um novo livro de receitas feito por indígenas para indígenas

 Por Priya Krishna

Prato de barrinhas de abóbora, receita da chef indígena Kristina Stanley, em Appleton, Wisconsin, em 1º de outubro de 2021. (Sara Stathas/The New York Times)© Distributed by The New York Times Licensing GroupPrato de barrinhas de abóbora, receita da chef indígena Kristina Stanley, em Appleton, Wisconsin, em 1º de outubro de 2021. (Sara Stathas/The New York Times)A chiltepin é uma pimenta minúscula e extremamente picante que é a avó genética de quase todas as variedades de pimentas cultivadas nos Estados Unidos. É um emblema vivo de como os ingredientes indígenas formaram a base da cultura alimentar americana. Mas a história da chiltepin – e dos povos indígenas no sudoeste dos EUA que a cultivam – não está bem documentada na mídia alimentar tradicional.O novo livro de receitas "A Gathering Basket" (Uma cesta para juntar, em tradução livre), tem como objetivo contar as histórias por trás de alimentos indígenas como a chiltepin. Vários livros de receitas já foram publicados sobre as práticas alimentares indígenas, mas esse – feito pela organização de chefs indígenas I-Collective – se destaca por ter sido escrito por indígenas para sua comunidade.
"Há uma peça faltando no quebra-cabeça quando se trata de culinária indígena", disse M. Karlos Baca, autor principal de "A Gathering Basket". "A narrativa mais difundida é que vagávamos pela terra, mal nutridos", quando na realidade os indígenas têm séculos de tradição alimentar rica e inovadora.
"A Gathering Basket" não é um livro de receitas tradicional. É feito de edições digitais de receitas, ensaios e vídeos, com seu lançamento coincidindo com o início de cada ciclo lunar. Uma discussão virtual está programada para acompanhar cada edição. Além disso, uma publicação impressa está planejada para o fim do próximo ano."Conseguir criar essa plataforma multimídia nos possibilita um crescimento constante. É um documento vivo que pode se expandir e crescer, assim como nossos hábitos alimentares e nossas receitas", comentou Baca, de 45 anos, que é diné e nuchu e mora em Mancos, no Colorado. Uma plataforma virtual também pode atingir mais pessoas do que um livro de receitas impresso.A assinatura vai custar US$ 30 para cinco edições, com bolsas de estudo para financiar o acesso de indígenas que não conseguem pagar. "O controle sobre a própria narrativa é muito importante, e isso é mais difícil de fazer quando outras partes interessadas de fora da comunidade estão envolvidas", acrescentou Baca.A abordagem "para nós, por nós" foi particularmente importante para Kristina Stanley, de 38 anos, gerente de projeto do livro, que é anishinaabe, membro da Red Cliff Band of Lake Superior, chef confeiteira e empresária em Appleton, no Wisconsin: "Quando falamos especialmente de receitas culturais ou tradicionais específicas, há tantos fatores que são infundidos na produção – desde o que está sendo produzido localmente até as cerimônias associadas a certos alimentos – que certos conhecimentos não se destinam a outras comunidades ou comunidades externas."A primeira questão gira em torno de uma receita de picolé – mas na verdade se trata dos ingredientes. Em uma série de ensaios, Baca discute a história da chiltepin; como alguns usam o termo em inglês "squawberry" para se referir à planta conhecida como sumagre de três folhas, fazendo uso de um termo depreciativo para os povos indígenas; e por que a mandioca é um produto essencial não apenas para a alimentação, mas para fazer sabão, linha e calçados.Há um vídeo no qual os indígenas se referem ao sumagre de três folhas nos idiomas hopi, diné, ute e apache.Edições futuras vão destacar a Guerra Walleye, conflito que começou no fim do século XX, quando os povos indígenas tiveram de lutar para manter seus direitos de pesca definidos em um tratado e para a reconquista de algumas variedades de alimentos indígenas, como a abóbora Taos Pueblo.Quentin Glabus, de 41 anos, chefe de produção de vídeo, e membro da Frog Lake Cree First Nation, disse que esperava que o livro "A Gathering Basket" inspirasse outros povos indígenas a codificar suas tradições para que as gerações futuras pudessem participar delas. "Muito do conhecimento foi ensinado por meio de contação de histórias e prática. Não foi escrito ou documentado."O I-Collective pode em breve ter uma plataforma maior para ajudar com essa codificação. Uma meta de longo prazo para a organização é estabelecer um selo editorial para livros de receitas indígenas. A esperança, por meio de tudo isso, é "mudar essa narrativa de que os povos nativos foram destinatários de serviços, para uma em que sejam vistos como detentores de conhecimento empoderados", observou Stanley.c. 2021 The New York Times Company

Comentários

Postagens mais visitadas