Indígenas de Manaus tentam manter culinária tradicional no meio urbano

Muitas etnias utilizam a sabedoria tradicional para armazenar alimentos.

Inseridos no meio urbano, grupos indígenas do Amazonas tentam manter a culinária tradicional, que tem como base peixe e farinha de mandioca.

A pesquisadora Luiza Garnelo explica que a culinária indígena no Amazonas é composta de carboidratos (mandioca), proteínas (peixes e caça), frutas e pimentas. "A base comum na região é a mandioca. A maneira de preparar é que muda", ressaltou a antronpóloga, que há 28 anos também exerce profissão de medicina na Região do Alto Rio Negro.

No livro 'Comidas Tradicionais Indígenas do Alto Rio Negro', Luiza Garnelo resgata receitas preparadas por mulheres do Alto Rio Negro. "O prato mais comum lá é a quinhapira, que é o cozido de peixe com pimenta. A pimenta é um elemento importante, seja do ponto de vista simbólico, que tem repercussão importante na organização da sociedade, cosmologia. 

Ela é um elemento que exprime isso de certa forma. Em termos nutricionais, ela é uma fonte de vitamina de elevada importância para a população", descreve.

Os indígenas costumam saborear a quinhapira com farinha ou beiju - derivado da mandioca que tem formato de pizza e é desidratado no sol. Para cortar o efeito do caldo pimentoso, à mesa, há sempre uma vasilha com chibé - farinha mais água fria. Dependendo da época do ano, também são consumidos vinhos de frutas, como umari, açaí, buriti, bacaba e patauá.

A presidente das Associações das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro (AMARN) afirma que a quinhapira é servida aos visitantes como forma de dá boas-vindas. "Quando a pessoa chega, a gente primeiro cumprimenta, depois oferece quinhapira. Toda a nossa região é assim", ressaltou Deolinda Prado.

Segundo Maria Nazaré Carvalho, da etnia Dessana, a preparação de quinhapira é mantida pelas mulheres das aldeias em Manaus. "É muito importante, porque é o nosso costume, nosso alimento", disse.

A partir da quinhapira é possível preparar outro prato: a mujeca. A receita leva água, goma de mandioca e peixe de quinhapira desfiado.

No Alto Rio Negro, as frutas também servem para enriquecer o mingal. "O que eles chamam de mingal é feito com farinha e água que vai ao fogo até dissolver. Originalmente, o mingal é sem açúcar. Leva, no máximo, uma pitada de sal", explica a pesquisadora.

Técnicas de armazenamento
Alguns grupos indígenas utilizam técnicas próprias para o armazenamento de alimentos. "Quem vive no mundo da geladeira, não tem noção do que é o mundo sem ela, que é bem presente na Amazônia como um todo. Muitas áreas não têm luz elétrica, têm problema de acesso. Além do mais, tem o custo: se você tem uma geladeira, você tem que ter alguma fonte de energia, seja o gás, elétrica, gerador", destaca Luiza Garnelo.

No Alto Rio Negro, uma das principais formas de conservação é o moqueado (defumado). A técnica consiste em retirar o bucho do animal antes de colocá-lo em cima de um estrado feito de varetas. Abaixo do estrado é feita uma fogueira. Com a fumaça, os animais são desidratados aos poucos. Após esse processo, o moqueado é colocado em cima do fogão de barro, o que ajuda a manter a desidratação por uma ou duas semanas.

São grupos que têm uma noção muito racional do aproveitamento de alimentos"
Luiza Garnelo, pesquisadora

Para armazenar alimentos, os Waimiri-atroari fazem o que os pesquisadores chamam de 'pão de índio', alimento que pode durar anos. "É possível você preparar uma massa com base na mandioca ou pupunha, vedar em folha de bananeira e enterrar. Esse produto é desidratado, e anos depois, pode ser retirado da terra, e ser utilizado", disse.

"São grupos que têm uma noção muito racional do aproveitamento dos alimentos. As dietas são variadas e equilibradas em termo de carboidrato, vitamina, proteína.

O consumo de gorduras é pequeno", avalia a pesquisadora Luiza Garnelo.

Receitas
Os pratos indígenas inspiram proprietários de restaurantes da capital. Conforme o empresário Mário Valle, o maior desafio é selecionar receitas com ingredientes de fácil localização. "A gente pesquisa em livros e também conversa com pesquisadores e com pessoas antigas.. 

Outra especialidade do restaurante é Bolinho de Capitão, feito com a carne da cabeça do Tambaqui. "A carne da cabeça é misturada com pedaços de tambaqui assado com arroz e farinha. O bolinho foi premiado no final de 2013 como o Melhor Petisco de Manaus", destacou Valle, que é proprietário do Tambaqui de Banda.

Em Manaus a trabalho, o suíço Andi Gantenbein disse que aprova a culinária regional. "É bem interessante. Eu recomendaria esse restaurante, especialmente porque eles usam produtos locais. É bem delicioso", disse.

Fonte: G1




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