Comida caseira resgata tradições e é capaz de contar histórias, diz cozinheira e socióloga da Unicamp

Ato de comer carrega em si um sentimento de pertencimento e compartilhamento, afirma Talitha Ferreira. Para moradoras da região, receitas tradicionais mantêm vivas trajetórias familiares.

O que pode dizer um prato de comida? Para a cozinheira e mestra em sociologia da cultura pela Universidade de Campinas (SP) Talitha Ferreira, o que colocamos à mesa é capaz de manter tradições vivas e contar histórias, sejam elas nacionais, regionais ou de núcleos familiares.


Para socióloga  da Unicamp, ato de comer pode ser analisado por um viés cultural e social

"É nas cozinhas domésticas, rurais e urbanas, onde ainda estão representados e assentados os diferentes gostos e comidas que podemos chamar de 'nacionais', 'regionais' e assim por diante. [...] A comida caseira é um traço de identidade comum à humanidade, de modo geral", explica a socióloga.

Para Ferreira, a comida também pode ser observada por um viés social e cultural. "O comer já traz, em si, algo de pertencimento e de compartilhamento. Esse compartilhamento pode ocorrer com referência aos integrantes de uma casa ou de uma família, aos integrantes de uma etnia ou povo, ou mesmo aos moradores de um país inteiro", afirma.

Amor à mesa

Bisneta de um casal imigrante da Alemanha, a psicóloga Iris de Miranda vê na comida uma oportunidade de manter viva a memória da família. A avó, Tulle Smith, deixou como legado aos netos a receita alemã que herdou dos pais e que, por consequência, se tornou "marca registrada" nas datas comemorativas.

Grießklößchensuppe (ou Klösse, como é chamada pela família), que em tradução livre significa "sopa de bolinhos de semolina", é considerada simples e chamada de "sopa de camponês" na Europa. "Com uma base de legumes para fazer o caldo, ela tem bolinhos de semolina, que é o que dá o nome da sopa", explica a psicóloga.

"Minha avó preparava o caldo da sopa no dia anterior, trazia numa 'panelona' de São Paulo para Campinas e deixava para fazer os bolinhos aqui, na hora", lembra. Após a morte da avó, Iris e a irmã tentaram reproduzir o prato.

"Tentávamos fazer em casa, sozinhas, mas sempre dava errado e os bolinhos desmanchavam. Não ficava o mesmo gosto [...] Hoje em dia estamos até que razoáveis. Acho que era um jeito de manter essa tradição e manter ela junto, manter a presença dela no Natal que sempre foi central", afirma.

Memória afetiva

Já para a aposentada Rosa Maria Giorgino Duarte, de Limeira (SP), a tradicional receita de doce de abóbora, que foi ensinada pela mãe e está na família há 50 anos, é uma forma de lembrar da rotina na fazenda quando criança.

"A gente tinha sempre que estar por perto pra mexer [o doce], porque era uma panela grande e não era como eu, que faço 2 kg [de doce]. Lá era uma abóbora inteira, que pesa 10 kg. Ia para a 'nona', para a tia, e assim vai", recorda a aposentada.

A receita passada de mãe para filha é a primeira mostrada no quadro "Sabor de Casa", que estreia no EPTV 1 desta quarta-feira (10) e traz receitas caseiras e histórias de cozinheiros das regiões de Campinas e Piracicaba.


Receita do doce de abóbora da Dona Rosa foi passada de mãe para filha — Foto: Alexandre de Jesus/EPTV




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