Quem tem medo de Dorothea Lange?


Dorothea Lange foi uma fotógrafa americana conhecida por seu compromisso social e seu talento para capturar a essência da condição humana por meio de suas fotografias. Seu trabalho icônico continua a influenciar e inspirar gerações de fotógrafos e artistas contemporâneos.

"Eu sou um americano". O que esta frase poderia significar em 1942 – ou o que poderia significar hoje – é talvez um mistério ainda por resolver.
Dorothea Lange (Hoboken, Nova Jersey; 26 de maio de 1895 - São Francisco, Califórnia; 11 de outubro de 1965) foi uma influente fotojornalista documental americana, mais conhecida por seu trabalho sobre a "Grande Depressão" para a Farm Security Administration. 
As fotografias humanísticas de Lange sobre as terríveis consequências da Grande Depressão fizeram dela uma das jornalistas mais proeminentes do fotojornalismo mundial.

Um americano era o guardião dos trabalhadores afro-americanos nas plantações do Sul e eram precisamente aos afro- americanos que a memória colectiva confere o seu olhar de admiração, reconhecendo neles as origens do blues, primeiro, do bop , de jazz, então, inequivocamente América.
Na década de 1930, a América era uma terra habitada por irlandeses e italianos e por vários europeus que tinham fugido do continente décadas antes para correr em caravanas maltratadas e lutar para conquistar a terra onde construiriam a sua futura casa. 


A América era, portanto, um deserto inóspito, onde o europeu que chegava repentinamente não tinha ideia de como viver, nem de como sobreviver. 
E eram as metrópoles, a América, a nova riqueza surpreendente destruída em 1929 com a Grande Depressão. 
Quem sabe se referir-se à América nem sempre conduz a uma grave mutilação de sentido, sacrificando sempre na imaginação partes fundamentais de um organismo jovem e desordenado, complexo e esquivo. 
O norte do sul, o leste do oeste, a América é também uma cruz – ou um plano cartesiano – de contradições e diferenças, isto talvez seja claro para todos, um conjunto multifocal de símbolos e possibilidades narrativas, de verdades não definitivas, refutável de um Estado para outro numa corrida labiríntica pela identidade.  

Dorothea Lange (1895 – 1965) foi uma americana de Nova Jersey, neta de imigrantes alemães, estudou fotografia em Nova York e ao lado do fotógrafo Arnold Genthe. 
A Farm Security Administration foi fundada pelo Presidente Roosevelt em 1937 para documentar as condições dos agricultores forçados a migrar após a devastação que ocorreu no Sul devido às tempestades de areia (Dust Bowl) e às condições climáticas que secaram milhões de quilómetros quadrados de solo. 
Lange deu os primeiros passos na fotografia em um estúdio que atendia às classes mais abastadas de São Francisco, Califórnia, costa oeste do país. Sua abordagem mudou radicalmente no início da década de 1930, quando passou a se interessar pelo registro das ruas e se deparou com as consequências devastadoras da Grande Depressão, período que se seguiu ao crash da bolsa de Nova York, ocorrido em 24 de outubro de 1929.

Uma das imagens mais marcantes desse período, realizada em 1932, mostra a fila do pão em White Angel, São Francisco. Tomada de um ângulo ligeiramente elevado, sintetiza sua força em um homem no primeiro plano, que olha desolado para algum lugar perdido. Sem retirar a dignidade do personagem, Lange conseguiu expressar a aspereza de suas condições: a fome e o desemprego.

Em 1935, Lange se separou do primeiro marido, o pintor Maynard Dixon, com quem teve dois filhos, e casou com o economista Paul Schuster Taylor. Essa mudança na vida privada também se refletiu na transição da fotografia de estúdio para a fotografia documental e teve desdobramentos em sua obra.

A lendária FSA
A partir de 1935, Dorothea Lange passou a trabalhar para a Resettlement Administration, agência criada pelo presidente Franklyn Delano Roosevelt para ajudar a reverter os efeitos da Grande Depressão na zona rural, apoiando pequenos proprietários de terra a retomar suas atividades. Em 1937, a agência mudou seu nome para Farm Security Administration (FSA), e passaria para a história como um dos maiores fomentadores da fotografia documental.

A fotografia foi amplamente utilizada pela FSA para registrar a realidade, criar diagnósticos e orientar ações. Roy Stryker (1893-1975) dirigiu a seção de fotografia da FSA de 1935 a 1942 e orientou o trabalho de documentação realizado por fotógrafos como Dorothea Lange, Walker Evans, Russell Lee, Jack Delano e Gordon Parks. A agência acumulou um acervo de cerca de 270 mil imagens, algumas delas se tornaram icônicas.

A mais famosa e reproduzida dentre elas é a que ficou conhecida como Mãe Migrante, realizada por Lange em 1936. A fotógrafa conta que a cena de uma mulher faminta com seus dois filhos pequenos atraiu seu olhar imediatamente. No movimento de aproximação, fez cinco fotogramas, conseguindo o enquadramento ideal no último clique. Florence Owens Thompson, de 32 anos, traz no rosto as marcas da miséria, e seus dois filhos se escondem envergonhados nos ombros dela.

A força desse retrato fez com que a imagem corresse o mundo, tornando-se em uma das fotografias mais reproduzidas da história.

Direitos humanos
Após sua atuação na FSA, Dorothea Lange seguiu documentando temas sensíveis relacionados aos direitos humanos nos Estados Unidos. Em 1942, ela registrou campos de internação compulsória de famílias de origem japonesa na costa oeste dos EUA. Tais campos foram criados depois do ataque japonês a Pearl Harbor, que marcou a entrada do país na Segunda Guerra Mundial. Todas as famílias foram indiscriminadamente declaradas suspeitas de colaboração com o Japão e internadas, sem que houvesse qualquer tipo de julgamento. As fotos de Lange expressam essa condição.

De 1955 a 1957, Lange trabalhou em um ensaio fotográfico para a revista Life sobre a vida de um defensor público na busca de obter justiça para pessoas carentes, a maioria delas negras. O ensaio não chegou a ser publicado, mas as imagens foram utilizadas para ilustrar o livro Minimizing Racism in Jury Trials, publicado em 1969 com o intuito de mitigar o racismo no sistema judiciário americano.

Além de veicular suas imagens em jornais e revistas, Lange teve ligações muito próximas ao Departamento de Fotografia do MoMA desde sua criação. Ela trabalhou intensamente em conjunto com o chefe do departamento, John Szarkowski, ao longo do ano 1965, para preparar a primeira grande exposição retrospectiva no museu de Nova York. Infelizmente, ela morreu em outubro de 1965, antes de ver a exposição, que seria aberta em janeiro de 1966.

Principais trabalhos

•"Migrant Mother" (1936): Esta fotografia icônica captura uma mãe migrante, Florence Thompson, cercada por seus filhos, expressando o sofrimento e a angústia da Grande Depressão. Ela se tornou um símbolo desse período difícil e teve um importante impacto social e político.

•"White Angel Breadline" (1933): Esta fotografia destaca a pobreza e o impacto da crise econômica. Retrata homens esperando por comida em uma fila, simbolizando a luta dos sem-teto para suprir suas necessidades básicas.

•"Ditched, Stalled, and Stranded" (1935): Esta série de fotografias documenta as consequências da seca e do Dust Bowl na zona rural da América. Mostra fazendeiros arruinados e suas terras desoladas, revelando a devastação dessas crises nas comunidades.

•"Japanese American Internment" (1942): Contratado pelo governo para documentar os campos de internamento forçado de descendentes de japoneses durante a Segunda Guerra Mundial, Lange capturou imagens impressionantes da vida nesses campos, expondo as injustiças e violações dos direitos humanos.

•"Migratory Cotton Picker, Eloy, Arizona" (1940): Esta fotografia retrata um migrante colhedor de algodão em um acampamento no Arizona. Ele lança luz sobre as difíceis condições de trabalho e a precariedade da vida dos trabalhadores agrícolas migrantes.

•"An American Exodus" (1939): Esta série de fotografias documenta a jornada de famílias migrantes em busca de emprego nos Estados Unidos. As imagens ilustram os desafios e sacrifícios que essas famílias enfrentaram em busca de uma vida melhor.

•"Children at Weill public school, San Francisco" (1939): Esta fotografia mostra crianças em uma escola pública em San Francisco. Ele destaca as desigualdades sociais e econômicas que afetaram os jovens durante a Grande Depressão.


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