QUEM TEM MEDO DE AGNES DANES?

Em 1982, ela criou Wheatfield – A Confrontation : uma obra ambiental icônica patrocinada pelo Public Art Fund que colocou dois acres (8.000 metros quadrados) de trigo dourado plantado e colhido à sombra das Torres Gêmeas de Nova York contra as hegemonias de cabeça de hidra do dinheiro, da política, do comércio global e da indiferença ecológica. Após mais de quatro décadas de agravamento das mudanças climáticas e da crescente desigualdade econômica — e da miséria humana que elas geram, como milhares de toneladas métricas de CO2 — seu trabalho parece mais presciente do que nunca hoje. 

A década de 1980 foi uma época estranha para se estar em Nova York. O punk estava florescendo, mas o crime também. Havia Basquiat e Keith Haring. A energia criativa era ininterrupta, mas tumultuada, e as condições de vida eram difíceis e áridas para muitos. Mas em 1982, a reação impulsiva de um artista a essa realidade foi de tirar o fôlego: diante do sombrio, dê a Manhattan um campo de trigo dourado e extenso. 

“Plantar e colher um campo de trigo em uma terra que vale US$ 4,5 bilhões criou um paradoxo poderoso”, explica Denes em seu site, “ O campo de trigo era um símbolo, um conceito universal; representava comida, energia, comércio, comércio mundial e economia. 

Referia-se à má gestão, desperdício, fome mundial e preocupações ecológicas. Chamava a atenção para nossas prioridades equivocadas.”

Agnes Denes é mais conhecida por sua obra, Wheatfield – A Confrontation (1982), onde ela planta um campo de trigo no meio de Manhattan. A foto da artista, segurando um bastão e atravessando sua obra, é hoje em dia considerada um dos ícones da história da arte contemporânea.

A obra foi plantada em 1º de maio de 1982. Denes, dois assistentes e voluntários rotativos mantiveram o campo por quatro meses. Denes e outros tomaram medidas para proteger a colheita, como pulverização para evitar o mofo depois que o trigo desenvolveu um fungo.

Eles colheram o trigo em 16 de agosto de 1982. 

A obra foi considerada a mais conhecida de Denes.

Porém, sua obra tem várias facetas, representadas de maneiras diversas e atípicas. 

A exposição Agnes Denes: Absolutes and Intermediates, apresenta mais de 150 obras, cobrindo cinquenta anos de sua carreira. Utilizando vários meios artísticos, Agnes Denes cria uma obra voltada para o público e ao mesmo tempo para a introspeção; uma obra criada para a humanidade, baseada em sua própria história e orientada para o seu próprio futuro.

Agnes Denes tem um apetite desmesurado pela pesquisa, que seja ela matemática, científica, histórica, arqueológica e tantos outros campos que abrigam o saber da humanidade. Nascida em Budapeste, em 1931, ela cresceu na Suécia e continuou sua educação e estudos nos Estados Unidos. O foco da obra de Denes pode ser qualificado como humanitário: são projetos de cidades futuristas ecorresponsáveis, projetos de plantações de árvores para transformar grandes metrópoles em santuários ambientais, textos e cápsulas do tempo, todas condensadas em fórmulas e soluções matemáticas resultando em formas arquitetônicas que lidam com as crises ambientais criadas pelo próprio homem. Agnes Denes tenta representar coisas abstratas como a lógica ou os tantos outros procedimentos de racionalização; como diria Paul Klee: “tornar o invisível, visível”.

Esse aspecto é encontrado em seus Philosophical drawings (1968), em outros termos: a tradução de um pensamento analítico em forma visual. Usando teorias e cálculos de Pascal, Porfírio, Alfred N. Whitehead ou Berthrand Russel, entre outros, a artista estabelece comentários visuais sobre a lógica que tomam a forma de uma pirâmide, símbolo fetiche da artista.

Entre 1973 e 1979, Agnes Denes realizou sua série Map projections que usa projeções isométricas, o método de representar objetos de três dimensões como rascunhos técnicos em duas dimensões, permitindo-lhe modificar o formato do planeta Terra e guardar ao mesmo tempo suas medidas originais e proporções. Dessa maneira, ela transforma a Terra em uma pirâmide, um cubo, um ovo, um limão e até em um cachorro-quente. Para a artista, essas obras servem como uma alegoria, provocando nossas ideias de fato e ficção estabelecidas em nossa realidade. Como preconiza a artista, os Map projections “são realidade esculturada, baseada em elementos conflitantes e interdependentes da arte e da existência, da ilusão e da realidade, da imaginação e do fato, do caos e da ordem".

Mas, afinal, como poderíamos qualificar o movimento no qual se encaixa Denes: performer? Não no sentido de hoje; ela consegue fugir de tais categorizações. Ela detesta o confinamento, ou qualquer restrição. Sobre o Landart, ela diz: “foi feito por artistas que precisavam de um espaço maior que o ateliê. Eles não tinham questões ou preocupações ambientas, sobre as quais eles não se interessam. A não ser, talvez, Robert Smithson.” Mas ela estava, de fato, envolvida nesse movimento pelo qual ela se interessou desde os anos 1960. Denes conta que se a obra dela foi um pouco marginalizada, comparada às dos outros artistas, é porque ela passava tempo demais pesquisando, sozinha, sem promover sua arte de maneira extensiva; “ou porque não podiam entendê-la, eu suponho.”

Como sugere Hans Ulbricht Obrist em uma entrevista com a artista em 2018, Denes e Da Vinci compartilham um método de trabalho similar. Porém, Denes sabe onde se posicionar: “Eu acho que é pelo nosso interesse comum pela ciência, e pela diversidade de seu trabalho, e a diversidade do meu. Isso volta ao fato que eu desejava reavaliar o conhecimento. Ele quis inventar a ciência.”

“Reavaliar o conhecimento” representando-o, tal é a filosofia de Agnes Denes. Sua arte se torna “filosofia visual”, principalmente quando ela usa o formato da pirâmide. Para a artista, a pirâmide é símbolo de temas ecológicos, sociais e culturais. Sua Pyramid series lida com questões e conceitos ambientais e filosóficos: desenhadas pela artista antes da era dos computadores, as pirâmides dessa série tomam forma graças a vários humanos (representados em pequeno formato) como em March of Genesis (1994). Eles se dispõem de tal forma para de criar uma pirâmide perfeita, levantando questões da gênese do homem na linha do tempo. De onde viemos, para onde iremos?


Para a artista, a pirâmide é símbolo de temas ecológicos, sociais e culturais.

A Pyramid series também propõe soluções para nossa espécie quando nosso planeta poluído ficará sem recursos naturais. Flying fish pyramid – a floating water habitat (1984), Egg pyramid (1984-2014) ou Half-bird – a flexible sace station (1984) são propostas para uma habitação constrita e autossuficiente, que se adapta ao clima e à natureza. Graças à ajuda e ao patrocínio do The Shed, Denes pôde realizar uma maquete de umas dessas estruturas: Teardrop – monument to beign Earthbound (1984), o projeto de uma estrutura monumental que flutua sobre uma base circular, como um monumento futurístico, brilhando do seu interior. Agnes Denes também pôde realizar outra obra, que até então permanecia no papel e em sua mente. Model for Probability Pyramid – Study of Crystal Pyramid (2019) é outra proposta para uma arquitetura futurista feita com cem mil blocos de vidro impressos em 3D. Também iluminada, ela concorre com os monumentos egípcios e serve como representação de nossa história e ciência.

Finalmente, Denes nos alerta sobre situação e a do nosso planeta. 

Os recursos naturais do mundo estão em perigo. A última obra da exposição, Pyramids of Conscience (2005), fala direto com o visitante; são quatro pirâmides com diferentes líquidos em seu interior: uma com água pura, outra com água contaminada, uma com óleo, e uma última completamente espelhada. O que estamos fazendo contra as contaminações de água? O que podemos fazer contra a exploração da fauna e da flora e desenvolver hábitos limpos que preservarão nosso planeta?


Com preocupações tão atuais, a obra de Agnes Denes é vista como prenunciadora. À frente de seu tempo, a obra arquitetônica e científica de Denes poderá provavelmente aliviar a futura condição da raça humana.

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