A Culinária em "O Continente", de Erico Veríssimo
Não tenho o dom de cozinhar: “Só entro na cozinha para saber por que a comida está demorando”~Érico Veríssimo
Resolvi reler a trilogia de Erico Veríssimo, O Tempo e o Vento, que conta a saga da formação do Rio Grande do Sul, desde 1745.
Releio agora com um apetite de quem quer saborear cada pedacinho do romance, ver cada detalhe da História do Brasil que pouco se ensinava antes e que agora, pelo menos do Sudeste para cima, é desconhecida e ignorada pelas escolas.
Veríssimo narra as guerras ocorridas no Sul do País para se manterem as fronteiras e também as guerras civis, entre os legalistas (maragatos) e os farroupilhas (apelido dado aos que lutavam contra o governo da época, uma alusão aos sem camisa da Revolução Francesa e seus ideais iluministas). Narra a saga dos Terra e das mulheres Terra, com seu expoente Ana Terra.
E em meio a tantos sentimentos despertados pelo "Continente", vou me deparando com os costumes daquelas gentes, de caráter rústico, carnívoro, reto e direto, aparecendo vez ou outra a sua culinária regional.
Na época de Ana Terra, de Bibiana e de Maria Valéria, as limitações locais impunham aos colonos descendentes de paulistas (descendentes de portugueses) dietas restritas a carne de charque, farinha de mandioca, abóbora, carne de caça, feijão preto. No decorrer do romance, com a influencia dos primeiros colonos alemães, começa a diversidade dos pratos e em vários capítulos são citados doces e bolos (cucas).
Há divergencia entre os costumes dos "açorianos"(litorâneos) e dos "continentais"(interioranos e de fronteira), inclusive na culinária. O romance também deixa clara a diferença da mesa do colono, do mais pobre e do mais abastado.
Porém, o ponto de encontro de todos os gaúchos é o mesmo: o churrasco e o mate.
O clima do Sul influencia a agricultura e consequentemente os produtos e os preparos. Doces de pêssego, de marmelo, rapaduras, com leite, são constantemente mencionados.
Aqui, para que vocês também sejam mordidos pelo bichinho da curiosidade e venham a procurar ler (ou reler) esta importantíssima Obra de nossa Literatura, algumas referencias culinárias do "chef Erico Veríssimo":
Arroz de carreteiro feito com charque (carne de sol)
Arroz pastoso rosado (risoto)
Churrasco com farinha de mandioca
Guisado com abóbora
Guisado com batatas assadas
Fervido
Carne da caça
Carne de mulita
Galinha assada com batatas
Feijão preto
Feijoada com toucinho, linguiça e charque
Matambre ("mata a hambre", mata a fome)
Churrasco de costela
Canja de galinha
Sopas
Sopa de mocotó
Morcilha, linguiça, salsichas
Abóbora assada, batata doce assada, mongango
Mandioca frita
Mondongo com farinha
Mongango com leite
Batata doce com leite
Queijo
Quindim
Figada, pessegada, marmelada
Pessegada com queijo
Rapadura com queijo
Bolo de coalhada
Cucas
Apfelstrudell
Rosca de polvilho
Canjica com leite
Marmelo assado
Milho verde cozido ou assado
Temperos diversos: canela, cravo, noz moscada, cebola
Melancia, bergamota, pêssego
Chimarrão (o "amargo")
Café
Refrescos (limonadas, sucos de frutas)
Licores (principalmente de pêssego)
Cachaça, cachaça com mel e limão
Vinho da colonia
Chás para os diversos males (de flor de laranjeira, de erva de touro, de mastruço, de agrião)
"Entraram duas escravas com bandejas cheias de pratos. Bibiana os foi colocando um por um em cima da mesa. Havia uma travessa cheia de arroz pastoso, levemente rosado e muito luzidio; uma terrina de feijão preto; um prato de galinha assada com batatas; outro de guisadinho com abóbora e finalmente uma travessa de churrasco com farofa. Winter olhava admirado para aquilo tudo. Era simplesmente assustadora a quantidade de pratos que havia nas refeições das gentes remediadas ou ricas da Província. Nunca menos de seis, e às vezes até dez. Não raro numa refeição serviam-se quatro ou cinco variedades de carne, e nenhuma verdura. Por fim, como um pós-escrito a uma longa carta, Natália trouxe uma travessa com mandioca frita."
(O Continente II, "A Teiniaguá, pg 411).
Fonte Cyblog da Cybele
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