ROMÃ, MITO E SEXUALIDADE
A romã aparece nos textos bíblicos, está associada às paixões e à fecundidade.
A romã é um dos frutos mais antigos cultivados pela humanidade, e talvez por isso tenha se impregnado tão profundamente nos mitos e nas simbologias que atravessam diferentes culturas. O nome vem do latim medieval e, traduzido diretamente, significa "maçã com sementes". Pode ser encontrado mencionado em diversos documentos históricos, incluindo a Torá, o Alcorão e os registros mesopotâmicos.
Sua casca firme, que oculta um interior rubro, úmido e repleto de sementes, evoca desde sempre a anatomia feminina e os mistérios da fertilidade, do sangue e do desejo. Mais do que alimento, a romã é oferenda, oráculo e metáfora.
As romãs eram muito valorizadas no antigo Egito, com os faraós exigindo que houvesse um suprimento da fruta em suas residências. Ela era tão apreciada que era pintada em paredes e tumbas para simbolizar a vida após a morte.
Os gregos a consideravam como símbolo do amor e da fecundidade. A árvore da romã foi consagrada à deusa Afrodite, pois se acreditava em seus poderes afrodisíacos.
Gregos, romanos e persas, compartilhavam da concepção de que a romã era a ponte entre a mortalidade e a imortalidade.
No século XVI, Cortez conquistou os astecas e plantou romãzeiras no México. O plantio continuou em direção ao norte, prosperando na Califórnia e no Texas, mas fracassando nas regiões do norte, onde as temperaturas eram muito baixas.
Embora continuassem populares no mundo todo, foi por volta do ano 2000 que as romãs começaram a ressurgir na cultura ocidental, à medida que a alimentação saudável começou a tomar conta de um mundo cheio de conservantes e opções de refeições superdimensionadas.
A romã é um dos frutos mais antigos cultivados pela humanidade, e talvez por isso tenha se impregnado tão profundamente nos mitos e nas simbologias que atravessam diferentes culturas. Sua casca firme, que oculta um interior rubro, úmido e repleto de sementes, evoca desde sempre a anatomia feminina e os mistérios da fertilidade, do sangue e do desejo. Mais do que alimento, a romã é oferenda, oráculo e metáfora.
Na mitologia grega, sua presença é central no mito de Perséfone, filha de Deméter, deusa das colheitas. Raptada por Hades e levada ao submundo, Perséfone resiste até que, em um momento de rendição — ou talvez de curiosidade —, prova algumas sementes de romã. Esse gesto aparentemente simples sela seu destino: por ter comido o fruto dos mortos, ela é condenada a retornar ciclicamente ao mundo subterrâneo. É esse ciclo que funda o ritmo das estações — outono e inverno durante sua ausência, primavera e verão quando retorna. A romã, aqui, é passagem: entre mundos, entre estados do ser, entre inocência e iniciação.
Mas sua carga simbólica vai além da morte e do renascimento. Na Antiguidade, a romã era associada a deusas como Afrodite, Ísis e Inanna — figuras que representam a sexualidade em sua potência criadora, misteriosa e transgressora. No templo de Afrodite, em Chipre, romãs eram usadas como símbolos do amor e do erotismo. O fruto, com seu sumo que lembra o sangue menstrual e sua multiplicidade de sementes, fala de fecundidade, mas também do prazer — não aquele domesticado pela moral cristã, mas o prazer selvagem, fértil, que liga o corpo ao cosmo.
Em tradições judaicas, a romã aparece como símbolo da abundância e da lei: segundo a lenda, teria 613 sementes — o mesmo número de mandamentos da Torá. Já em rituais afro-brasileiros, a romã pode ser usada como oferenda a orixás ligados à fertilidade e ao feminino, como Oxum, reforçando seu caráter de fruto encantado, capaz de abrir portais entre o visível e o invisível.
A romã, assim, pulsa entre o sagrado e o erótico. Seu ato de ser comida não é apenas alimentar: é transformação. É pelo gosto da romã que Perséfone atravessa a infância e se torna rainha do submundo. É com a romã que se celebra o ventre que sangra, que dá vida, que goza e que morre para renascer. Por isso, esse fruto continua a fascinar — não apenas como metáfora, mas como matéria viva de mitos que seguem fermentando nos corpos e nas narrativas.
El Cocinero Loko
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