Nestlé pagará produtores de cacau africanos para manter crianças nas escolas
No final de janeiro, a multinacional suíça Nestlé anunciou o lançamento de seu “programa de aceleração de renda”, que contemplará 10.000 famílias no país da África Ocidental. A decisão foi tomada após um projeto-piloto, realizado em 2020 com 1.000 produtores de cacau, ter alcançado resultados positivos.
Os agricultores podem ganhar dinheiro extra se seguirem um conjunto de diretrizes estabelecidas pela Nestlé, disse a empresa durante uma reunião online. Entre estas diretrizes está o dever de evitar o trabalho infantil, matriculando todas as crianças entre seis e 16 anos na escola e aumentando a produtividade de suas fazendas de cacau através da aplicação de técnicas como a poda. Atividades ambientais como o plantio de árvores de sombra também qualificam o agricultor para o recebimento do incentivo. Além disso, as metas incluem a redução da dependência do cacau e da flutuação de seu preço global através da diversificação das fontes de renda.
Ao implementar tais práticas, as famílias produtoras de cacau podem ganhar um pagamento extra de até CHF 500 por ano durante os dois primeiros anos do programa. Posteriormente, o pagamento cairá para CHF 250 ao ano. O objetivo de oferecer um pagamento inicial mais alto é incentivar a participação no programa. Os pagamentos serão divididos entre agricultor e cônjuge e o dinheiro será enviado via transferência. A Nestlé espera estender o programa de pagamento direto para Gana em 2024 e, futuramente, para todos os seus 160.000 produtores de cacau até 2030.
Os consumidores de chocolate também poderão participar, já que a Nestlé planeja introduzir uma nova gama de produtos fabricados com cacau cultivado por participantes do programa. A primeira leva será uma seleção de produtos Kit Kat que deverá chegar às prateleiras dos supermercados do mundo em 2023.
A necessidade de mais colaboração
O CEO da Nestlé, Mark Schneider, declarou que o objetivo era enfrentar simultaneamente os problemas do trabalho infantil, da desigualdade de gênero e da desigualdade de renda. “Sabemos que, para uma família de agricultores de cacau, o caminho para uma renda mínima será longo e sinuoso”, disse Schneider durante a chamada.
O primeiro-ministro da Costa do Marfim, Patrick Achi, que também participou da reunião online, disse que os produtores de cacau de seu país tinham direito a uma vida decente e digna.
“Em 40 anos, o preço do cacau caiu pela metade. Neste contexto, a situação dos agricultores se tornou um grande problema”, disse ele.
Achi disse que o projeto da Nestlé ajudará a Costa do Marfim a se preparar para as leis sobre fornecimento responsável e desmatamento que estão sendo promulgadas no Ocidente, tais como o Green Deal da União Europeia. Ele pediu mais colaboração entre empresas privadas e departamentos governamentais, que muitas vezes trabalham separadamente e em diferentes partes do país, mas lidam com as mesmas questões.
“Sem sinergia, o impacto fica reduzido. Devemos evitar a repetição, aprender com projetos-piloto e compartilhar nossas experiências para termos um melhor impacto”, disse Achi.
Realidades difíceis
A Costa do Marfim é responsável por cerca de 45% da produção mundial de cacau, que gera uma receita de exportação de US$ 3,5 bilhões (CHF 3,2 bilhões) por ano. Mas os produtores de cacau do país ganham apenas US$ 0,78 por dia, um terço do que a organização Fair Trade International considera como um salário digno – US$ 2,51 por dia.
Em 2019, a Costa do Marfim (junto com Gana) decidiu cobrar US$ 400 a mais por tonelada de cacau exportada para lugares como a Suíça, com base no chamado Diferencial de Renda Mínima (LID, em inglês), que visa aumentar a participação dos produtores nos lucros e protegê-los da volatilidade dos preços. No entanto, a queda da demanda devido à pandemia de Covid-19 forçou o conselho do cacau a oferecer descontos que neutralizaram o LID.
“O LID teve resultados mistos”, afirmou o primeiro-ministro Achi.
O trabalho infantil também tem se mostrado difícil de erradicar na África Ocidental. Um relatório de 2020, encomendado pelo Departamento do Trabalho dos EUA, mostrou que 1,56 milhão de crianças ainda executavam atividades de trabalho infantil relacionadas ao cacau na Costa do Marfim e em Gana.
Adaptação: Clarice Dominguez
(Edição: Fernando Hirschy)
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