Entre Europa e Brasil, entre sabores, cores e letras, Bate&Leva com Eveline de Abreu.
Com um pé no norte de Portugal, outro na Bahia, o Bate&Leva, de hoje, é com Eveline de Abreu. Nossa entrevistada fala da escrita, como sendo o seu ofício sem ossos, e das escapadas até à cozinha, quando a saudade de casa bate forte.
Ter morado a cinco passos da bela Avignon, na Provence (sul da França) e, desde 2017, em Guimarães, onde nasceu Portugal, certamente explica o gosto apurado e seu cuidado com a alimentação.
E, graças às
facilidades das novas tecnologias, ela dá aulas para capacitação em produção
textual a alunos espalhados nos quatro cantos, para o que desenvolveu uma metodologia
de ensino sem trauma ou sofrimento. Redatora de profissão, Eveline é
especialista em avaliação de conteúdo, tanto para as necessidades de
comunicação do mundo virtual como as do mundo em carne e osso.
Alicio Charoth- Provocação:
vatapá ou caviar?
EVELINE DE
ABREU- Vatapá, vatapá e vatapá. Disparado!
AC- Se pudesse sentar à mesa com Eveline de Abreu, o que lhe perguntaria?
EA- O que ela
quer comer (risos).
AC- Cite algumas peculiaridades do seu trabalho.
EA- Escrevo,
antes de viver de escrever. E desenvolvi uma metodologia voltada para o
aprendizado da escrita sem trauma, nem sofrimento. Tem funcionado. Reeditei, em
versão virtual, o curso Texto&Contexto
| Incubadora de Escritores, que atende a todo tipo de interesse e
necessidade, porque escrever é um ato único e sólido, que se presta à qualquer
circunstância.
AC- Que te faz brilhar os olhos com seu trabalho?
EA- Vou dar um
exemplo: imagine você que tenho uma aluna na Irlanda, a paraense Vera Duncan,
escrevendo o romance familiar, a maestra e doutoranda teuto-brasileira Andrea
Huguenin, sobre a musicologia feminista, e a artista plástica baiana Cecília
Menezes. Nossas aulas me transportam para as suas história, para um mundo
que não me pertence. Os olhos também brilham ao ver os alunos que já alçaram
voo lembrarem-se ainda de mim. É a sensação mais próxima da eternidade que
conheço.
AC- Outro dia, li uma matéria falando dos restaurantes no Brasil, que fazem
comida de outros países, como a França, e escrevem os títulos de pratos no seu
cardápio de forma errada. Que conselho você daria para estes empresários?
EA- Que é mais
fácil, barato e imediato eu fazer a revisão (risos).
AC- Acha que o mercado cresceu e as pessoas estão mais conscientes do que
seja uma boa alimentação?
EA- Penso que
você esteja falando de alimentação saudável. A informação circula mais. E, com
ela, verdades e lendas. Por este lado, é muito legal. Por outro, e por trás, há
tudo o que nos querem fazer acreditar como bom, porque é interesse de uma
sociedade supermedicalizada, com seus laboratórios farmacêuticos aliados à
indústria dietética e à da beleza.
AC-Sempre falo na minha página,
Sossego da Flora (https://sossegodaflora.blogspot.com/), da importância de dar
nome aos pratos que as pessoas criam, o que acaba sendo uma referência cultural
e social. Que acha?
EA- Ainda bem
que você traz para este âmbito o que eu penso para todo o resto: nomear é digno
e bonito. Os nomes arrastam para a história as coisas feitas pelos seres,
engendrando, assim, as referências culturais e sociais. Vamos, sim, batizar os
pratos!
EA- Se é um
caso de cuidado com a saúde pública, que se intervenha com medidas saneadoras e
não demolidoras do patrimônio. Onde já se viu! Os modos de cozinhar ou
preservar os alimentos também servem para pensar. Está aí o Claude
Lévi-Strauss que não me deixa mentir em O Cru e o Cozido, um livro bom de
prestar atenção!
EA- Não posso
falar pelo todo. Na Provence, incluindo a Côte d'Azur, os poucos
restaurantes brasileiros, ao contrário dos asiáticos e magrebinos, serviam uma
má comida, o que dá lugar a pensar que são apenas negócios malfeitos e sem
alma. Por outro lado, há muitos produtos do Brasil. Eu, quando quero e preciso,
faço e como em casa, dividindo a mesa, porque tenho orgulho de apresentar a
nossa culinária. E, pelo estômago, ainda mato a saudade do Brasil.
EA- Eu compro,
consumo e dou o exemplo (risos).
Às vezes, faço pequenas preleções à mesa a respeito do assunto.
AC- As preferências alimentares são uma das principais bases da identidade
cultural. Como vê este momento, onde muitos dos nossos famosos chefs
valorizam e prestigiam pratos e produtos locais?
EA- Vejo com alegria. A independência do Brasil é um grito dado aos poucos. Não é tarefa rápida desvencilhar-se da mentalidade secular e pesada do colonialismo. O que os anos 20 foram ou pretenderam ser para as artes é o que tem acontecido em nossos dias com a culinária, que deixa de se encastelar nos cânones de outras culturas e se reconhece igualmente deliciosa na mandioca, no leite de coco e no dendê.
EA- A
culinária é cara a toda e qualquer cultura. Eis uma regra da qual não conheço
exceção. Particularmente, no caso do Brasil, falemos em culinárias, por sua
gigantesca extensão territorial. Ela tem valor de patrimônio, portanto, de atrativo turístico,
tanto quanto a arquitetura urbana, monumentos, arte sacra. Razão de sobra para
ser cuidada, conservada, preservada.
AC- Vivendo num país, onde a culinária tradicional é tão reconhecida e movimenta o setor do turismo, e sendo uma das nossas matrizes gastronômicas, o que podemos aprender com a experiência portuguesa para a preservação destes saberes?
EA- Objeto
de estudo e pesquisa, a culinária traduz modos e costumes. O ponto nevrálgico é
o que cada país faz com a sua. Portugal se orgulha da própria história e,
portanto, preserva, irrepreensivelmente, os signos do próprio passado – o que
inclui a culinária. No dia que o Brasil compreender que o contemporâneo pode
conviver harmoniosamente com o passado e que é bonito preservá-lo, certamente
vai haver consequências felizes sobre a preservação da nossa culinária,
herdeira da portuguesa, com certeza.
AC- Como a difusão dos saberes, técnicas e fazeres tradicionais, podem ajudar a preservar o nosso patrimônio culinário?
EA- Com
educação doméstica, com educação formal e, sobretudo, por meio de campanhas maciças.
Você se lembra da forte campanha para o uso do cinto de segurança? É desse
jeitinho aí: até nos convercermos de como é bonito o que temos e o que somos.
EA- Para provar que as letras também passeiam pela cozinha, pincei este fragmento de Cozinhando no Exílio – de ler e comer, projeto de um livro que ainda vou botar pra andar, assim que soprar bom vento.
“PATO GENTE-FINA, uma receita que bem poderia ser com galinha, peru ou coelho.
Unte o recipiente e, nele, deite uma camada do purê outra do pato desfiado e
mais uma do purê. Espalhe queijo gruyère moído cobrindo toda a
superfície. Leve ao forno, só para derreter, só até dourar. Atenção para
não deixar o queijo esturricar.
O Pato Gente-Fina é autossuficiente. Mas eu sou brasileira e gosto de
contrastes, de complementos. Por isso, fiz brócolis al dente no vapor,
regado de azeite de oliva e alho cru picadinho, para acompanhar este prato.
AC- E para falar com você sobre
seus cursos?
AC- E para falar com você sobre seus cursos?
EA- Pelo WhatsApp (+33) 695 308 016 e pelo e-mail, textoecontexto.tec@gmail.com.
AC- Beijo e obrigado pelo
carinho, Eveline!
EA- Beijo e obrigada, também,
Alicio. O carinho por você é das antigas!
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