Comitiva de indígenas Fulni-ô apresenta modos de vida, culinária e cultivo na USP
Partindo de Águas Belas, no agreste pernambucano, grupo indígena participa de uma série de atividades na Cidade Universitária, mostrando a diversidade e a cultura dos povos originários
Representantes indígenas do povo Fulni-ô participam de uma série de atividades na USP neste mês de abril. Únicos no Nordeste brasileiro a preservar sua língua materna, a yaathê, os Fulni-ô chegam à USP para apresentar a cosmovisão, a diversidade, a cultura e o modo de vida dos povos originários. Os encontros, organizados pelo Grupo de Estudos em Saúde Planetária do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, propõem desconstruir pensamentos estereotipados sobre os indígenas brasileiros.
“Precisamos aprender muito com eles. Coisas diferentes em relação a nós: seu modo de vida, a pressa, os alimentos, a relação com a natureza. No fundo, tem tudo a ver com sustentabilidade”, diz Antonio Mauro Saraiva, coordenador do Grupo de Estudos em Saúde Planetária e professor titular da Escola Politécnica da USP. O professor diz estar mais interessado em ouvir do que falar. “Saber como é a vida deles, a região, sua relação com os não indígenas e os problemas decorrentes disso.”
Segundo o coordenador do Saúde Planetária, há um especial interesse em aprender sobre sua agricultura, uso de ervas medicinais na saúde e a integração de sua cultura e espiritualidade no dia a dia.
A primeira atividade será uma roda de conversa que acontece nesta quarta-feira, 19, na sala Alfredo Bosi do IEA da USP, com transmissão ao vivo pelo canal @SaudePlanetaria no YouTube. No mesmo dia, às 15 horas, no Instituto de Psicologia (IP) da USP, farão uma confraternização com representantes do povo Guarani, na Rede de Atenção à Pessoa Indígena. Já no dia 20, o grupo realiza uma oficina com plantio de mudas na horta do projeto USP Sustentabilidade e no dia 21, uma oficina de alimentação em parceria com a Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, no mesmo local.
O USP Sustentabilidade é um espaço aberto de convivência e práticas sustentáveis localizado no Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp). Para participar, não é necessário se inscrever. O acesso para a comunidade USP é feito mediante apresentação da carteirinha USP. Para o público externo acessar, é necessário enviar e-mail para uspsustentabilidade@usp.br
Integrantes do grupo USP Sustentabilidade, funcionários do Cepeusp e da Prefeitura do Campus acompanham a visita da comitiva Fulni-ô na USP - Foto: Mauro Saraiva
Presente e passado
A comitiva partiu de Águas Belas, no agreste pernambucano, no último dia 12, em direção à USP, pela primeira vez. Tawan Fulni-ô, um dos cinco indígenas da comitiva, conta que existem 13 etnias em Pernambuco atualmente, com cerca de 5 mil pessoas. “A nossa vida lá, com a ascensão de uma ministra indígena e um coordenador de saúde indígena, tem nos dado mais oportunidade de organização. Antigamente, o acesso à educação, saúde e universidade, nossos direitos de cidadãos, era mais difícil”, diz Tawan. Seu nome nativo é Thxleka (lê-se “Tchê-lêcá”).
Mesmo assim, Tawan explica que ainda existe um preconceito antigo causado pela falta de conhecimento sobre a importância e a resistência dos povos indígenas no Brasil. “O indígena da atualidade resiste a todo tipo de massacres e ataques. E segue vivendo em sociedade como qualquer outra pessoa, porém sem deixar sua essência, sua cultura e espiritualidade. É sobre isso que vamos conversar”, afirma.
Além das oficinas e palestra, o grupo deve expor artesanatos feitos por toda a sua comunidade, uma de suas principais fontes de renda. “Costumo dizer que o artesanato é a caça do século 21. É a forma que eles têm de levar recursos para suas aldeias”, explica André Silveira, auxiliar de aulas no Cepeusp e quem articulou a vinda dos Fulni-ô para a USP.
Silveira se intitula “indigenista de coração” e conheceu o grupo em 2018 por meio de uma rede de amigos, em Santos. Ele destaca a importância desta incursão cultural, já que o Sudeste está mais habituado a “ouvir falar” dos povos da Amazônia e dos guaranis. “[Os Fulni-ô] mantêm vivas suas tradições, essa ancestralidade. Mesmo estando no Nordeste, conseguiram resistir ao processo de colonização”, explica Silveira.
Os Fulni-ô desenvolvem o projeto cultural Indígenas na Escola – Uma abordagem sobre os povos indígenas do Brasil, e são reconhecidos como um dos únicos povos do Nordeste a terem mantido seu idioma materno e suas tradições, passadas de geração a geração, há séculos. Em 2022, a antiga Fundação Nacional do Índio (Funai) revelou que Garrincha, um dos mais eminentes jogadores do futebol brasileiro, era descendente direto do povo Fulni-ô.
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