*Feira Tupinambás de Abrantes*

Igualdade de Direito e Combate à Descriminação por meio da Gerencia de Povos e Comunidades tradicionais, realizará a primeira *Feira Tupinambás de Abrantes* de Camaçari que será realizada no dia 19 e 20, de abril das 09hs às 15hs ao lado da Igreja Matriz de Vila de Abrantes, com o tema: *Saúde e Educação é Igualdade Social!* O evento irá abordar temas voltados para a valorização na educação e saúde dos povos indígenas, e terá uma agenda de exposição e vendas de artesanato indígenas assim como o Cras na comunidade, feira de saúde Indígena, apresentações culturais, palestras, oficinas, roda de conversas e etc. 

O público alvo será a comunidade Indígena Tupinambá de Abrantes, escolas públicas e privadas e  turistas.


Desde 2008, quando a lei 11.645 foi sancionada, o estudo da história e cultura dos povos indígenas se tornou obrigatório nas escolas de Ensino Fundamental e Médio. Quatorze anos depois, ainda há dificuldade para o tema estar, de fato, inserido no trabalho realizado nas salas de aula de todo o Brasil.

Cláudio Gomes da Victória, diretor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e líder do grupo de pesquisa Formação do Educador no Contexto Amazônico, afirma que houve alguns avanços desde que a lei foi sancionada, mas que o ensino da história e cultura indígenas ainda é defasado. 

“Houve um avanço por conta dessa obrigatoriedade de inserir o tema no currículo. É possível enxergar, inclusive nos livros didáticos, alguma coisa nesse sentido. Mas percebemos ainda um espaço muito tímido, geralmente apenas em projetos ou em datas específicas”, comenta o pesquisador, lembrando que muitas vezes esse assunto é abordado apenas no Dia do Índio. 

Nesses poucos momentos em que o tema chega até a sala de aula, ele ainda vem carregado de estereótipos, sobretudo retratando um índio do passado. “O processo de construção da história desses povos sempre teve um viés colonizador, que não era o viés de quem viveu as experiências do cotidiano. Há uma visão elitizada, europeia e colonizadora”, analisa. 

Para Raimundo Cruz da Silva, indígena do povo Kambeba, mestrando em Educação e diretor da Escola Municipal Indígena Kanata T-ykua, na Aldeia Três Unidos, em Manaus (AM), um dos grandes desafios das escolas não indígenas é dar valor ao conhecimento produzido pelos povos indígenas da mesma forma que estes valorizam o conhecimento não indígena. 

Na escola Kanata, que tem turmas de Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, os alunos indígenas aprendem tanto os conhecimentos tradicionais do povo Kambeba quanto os saberes produzidos pelos não indígenas, o que Raimundo considera muito importante, avaliando que esta deveria ser uma via de mão-dupla. 

Ele conta que quando saiu da aldeia para estudar, ele teve muita dificuldade. “Eu conhecia apenas o mundo da vivência na minha aldeia, mas não conhecia o mundo lá fora. Por não conhecer e pelas pessoas não conhecerem o indígena, eu sofri muita descriminação e preconceito. Se esses dois conhecimentos [indígena e não indígena] se juntarem, aí sim vamos ter uma educação muito melhor e intercultural”. 

Sem estereótipos

Conheça 4 formas de não retratar os povos indígenas para seus alunos 

1. O índio do passado

Um dos grandes estereótipos quando o assunto são os povos indígenas é retratá-los como sujeitos parados no tempo, estudando apenas as populações dos séculos XVI e XVII. “Ser indígena hoje significa fazer uso de outros elementos culturais que não faziam parte da cultura deles, mas que hoje fazem”, diz Cláudio. Raimundo lembra que é importante os estudantes saberem que os indígenas atualmente não vivem isolados e, em geral, não utilizam as vestes de penas que as escolas costumam associar a eles. 

2. Índios são todos iguais

De acordo com o último Censo, de 2010, existem 305 etnias e 274 línguas indígenas no Brasil. Isso mostra a diversidade dos povos indígenas. Retratá-los como todos iguais, portanto, é um erro que diminui sua história e cultura.

3. Festa vazia

Muitas vezes, as escolas abordam a temática indígena apenas no Dia do Índio, realizando festas nas quais os alunos se vestem com cocares e saias de penas. Esse estereótipo reduz a cultura indígena e faz com que o tema seja abordado de forma rasa e vazia. Se elementos forem utilizados, como a pintura corporal, é necessário que as atividades venham acompanhadas de reflexões sobre o tema, sem se apropriar da cultura indígena.

4. Preguiçoso ou guerreiro

Geralmente, os indígenas são retratados como povos preguiçosos ou como sujeitos extremamente guerreiros. Mais uma vez, isso acaba criando um imaginário deturpado da real história e cultura indígenas.

Descoberta da ascendência indígena

Foi tentando fugir desses estereótipos que Flávia Roberta Alves Costa, professora de Arte dos Anos Finais do Fundamental na Escola Municipal Divino Espírito Santo, em Recife (PE), realizou o projeto Inspirações Indígenas em 2017. Ela foi uma das vencedoras do Prêmio Educador Nota 10 daquele ano. Flávia conta que quase não tinha conhecimento sobre a cultura dos povos indígenas quando o currículo municipal passou a trazer arte indígena para ser trabalhada durante todo um bimestre. 

Ela então estudou bastante sobre o tema e desenvolveu uma pesquisa com os alunos para descobrir quais deles tinham ascendência indígena. O objetivo era levar para a sala de aula a cultura dos povos locais, já que há diversas etnias indígenas no estado. “Existe um desconhecimento por parte dos próprios pernambucanos de que temos essa grande população indígena e essa diversidade no nosso estado”. 

Durante o projeto, muitos alunos que não sabiam que descendem de povos indígenas acabaram descobrindo essa relação – inclusive a própria Flávia. “Eles ficaram muito surpresos, porque uma grande quantidade de estudantes se descobriram descendentes indígenas e nunca tinham conversado em família sobre isso. Essa conversa veio à tona por conta do projeto. Eles começaram a contar as histórias que os pais e avós relataram e foi um momento de partilha muito rico”, lembra a professora. 

Flávia abordou com os alunos as diversas etnias indígenas e buscou quebrar estereótipos construídos socialmente. “Nós falamos muito sobre o índio na contemporaneidade, reforçando que ele não está localizado no passado. Os povos indígenas de Pernambuco usam celular e roupas como nós, mas participam dos seus ritos e têm suas roupas tradicionais nos momentos de festividade”, comenta a professora, que também convidou um grupo de indígenas para conversar com os estudantes. 

Em  Arte, o projeto permitiu que os alunos aprendessem técnicas como a tecelagem  e praticassem o desenho de observação de alguns objetos indígenas. Além disso, os estudantes fizeram também pintura corporal. “Eu tive muito cuidado para não imitar os indígenas. Estudamos algumas técnicas para fazermos a nossa produção artística inspirada na arte indígena, e não arte indígena. Porque quem faz arte indígena são os povos indígenas. Para eles tem um significado e para a gente tem outro”, explica. 

A professora afirma que o projeto foi essencial para quebrar preconceitos dos alunos, já que muitas famílias sentiam  vergonha ou medo de relembrarem suas histórias. “Eu tinha um aluno indígena e tentava conversar com ele sobre o tema, mas ele se negava, tinha muita vergonha de falar. Depois de todo o projeto, ele se sentiu super à vontade e pediu para contar sua história para os colegas. O momento mais bonito do projeto foi esse: ele ser indígena e se sentir respeitado e admirado na escola”. 

Depois do projeto, Flávia não deixou de abordar a temática indígena em suas aulas. A professora acredita que o tema deve aparecer sempre: se o assunto é fotografia, ela traz um fotógrafo indígena; se é pintura, um pintor indígena. “Por que eu tenho que separar a arte da arte indígena? Venho pensando muito sobre isso e reformulando minhas aulas”.



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