Chefe de cozinha faz comida brasileira kosher em Israel e cria feijoada com bacon de ganso
Um chefe de cozinha de São Paulo está se destacando em Israel por adaptar a culinária brasileira à Kashrut, nome da alimentação especial que obedece às regras da lei judaica. Wyllie Dachtelberg, 56 anos, conquista clientes brasileiros e israelenses que querem saborear pratos brasileiros em Tel Aviv sem renunciar aos preceitos religiosos.
porDaniela Kresch, correspondente da RFI em Israel
Seus clientes são parte dos 15 mil brasileiros que vivem em Israel, mas há cada vez mais israelenses que provam de seus quitutes e se apaixonam pelos pratos brasileiros.
Em Israel, 70% dos habitantes afirmam seguir as regras da Kashrut. O alimento que segue essas normas é chamado de kosher ou casher, dependendo da pronúncia em íidishe ou hebraico.
Entre as várias diretrizes, uma das mais conhecidas é a proibição de misturar carnes e queijos nos mesmos pratos. E, no que tange às carnes, é proibido comer porco ou coelho, entre outras, sendo que o tratamento da carne de vaca requer a retirada total do sangue do corte.
Em meio às dúvidas sobre começar do zero em outro país, ele foi trabalhar como cozinheiro. A barreira da língua causou alguns problemas, no entanto. Wyllie chegou ao país com hebraico fluente, mas não com um vocabulário profissional no ramo da culinária. Certa vez, colocou bruschettas recém assadas no freezer ao invés de no armário quente, que preserva o calor. Isso porque, em hebraico, os dois utensílios têm nomes parecidos.
Aos poucos, começou a receber pedidos de quitutes nacionais e decidiu abrir uma microempresa em casa.
“Me pediram para fazer feijoada. A forma como eles faziam feijoada aqui era pegar algumas carnes defumadas que tem no mercado e fazer a feijoada. E isso me deu um estalo e eu disse: não, não, não, não”, conta o paulista. “Então eu fiz bacon de peito de ganso, eu fiz linguiça calabresa de peru, eu fiz linguiça de frango, eu fiz paio de peru e fiz a feijoada. Bom, o pessoal enlouqueceu”.
Formado pela Escola Paulista de Gastronomia Senac, uma das principais e mais importantes do Brasil, Dachtelberg se especializou em panificação e confeitaria. Ele também é mestre em charcutaria, isto é, na confecção de linguiças, defumados e outros tipos de frios. Fora tudo isso, Wyllie é especialista em culinária japonesa e americana.
Em Israel, além do desafio de adaptar a gastronomia brasileira à Kashrut, ele também se depara com outro obstáculo: a falta de ingredientes comuns no Brasil. A feijoada é um exemplo. Um dos acompanhamentos tradicionais é a couve, mas, como em Israel não há essa verdura, ele utiliza uma espécie de “prima direta” da couve: o mangold.
O mesmo acontece com moquecas, que precisam de um óleo que não é vendido em Israel: “Para fazer moqueca baiana, você precisa do óleo de dendê que não vende aqui. Mas, na verdade, o dendê vem da palma e aqui tem óleo de palma, que é a mesma árvore, a mesma coisa, só que é da Tailândia. Então, você faz o mesmo sabor porque é o mesmo óleo. No Brasil é um pouco mais líquido, aqui é um pouco mais pastoso. Então você vai para cá, vai para lá”.
Atualmente, Wyllie cozinha para eventos como o “Casa Brasil”, que celebrou o bicentenário da Independência do Brasil no Porto de Tel Aviv, em setembro de 2022. E também prepara refeições para clientes particulares, tanto para jantares quanto para refeições do dia a dia, além de produzir e vender produtos como frios, linguiças e costelas. Tudo com comida totalmente kosher, claro.
O mestre-cuca brasileiro encara tudo sozinho, desde a compra dos ingredientes até a entrega aos clientes. Não é fácil, mas ele planeja, em breve, expandir seu negócio, certo de que a culinária brasileira tem futuro em Israel, principalmente se for oficialmente reconhecida como kosher.
Para isso, precisará receber um documento, ou teudat em hebraico, que oficialize o selo de Kashrut: “Eu ainda cozinho em casa. A empresa que abri me permite cozinhar em casa e vender para pessoa física. Agora eu vou atrás de alugar um local para poder montar minha empresa e vender para empresas. E, neste estágio, eu vou poder ganhar a teudat kashrut”.
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