Comida Baiana de matriz africana em extinção.

A poucos dias vimos o Carlo Petrini, fundador do Slow Food, fazendo um chamamento sobre a importância de mantermos a base da nossa soberania alimentar, fazia ele um apelo: você se lembra de alguma comida que sua vó fazia e hoje ninguém mais faz?
Por incapacidade ou incompreensão das instituições, dos governos, enfim da nossa cultura, somos abertamente manipulados a consumir alimentos que não dizem respeito aos nossos costumes.
É importante conhecer as matrizes que formaram o nosso gosto, pois elas são um reflexo de como nós alimentamos.
Só deste modo, realmente teremos uma cozinha com características próprias e suas singularidades, em harmonia com nossa natureza.


"Essa negra alta, disposta, falando claro e corretamente, o beiço inferior avançando em ponta, era bem o expoente da raça negra do Brasil, síntese feliz da soma de conhecimentos da velha Maria Bada e da agilidade intelectual de Martiniano do Bonfim." 
Edson Carneiro escreveu, dias após a morte da ialorixá Aninha, em 3 de janeiro de 1938, um emocionado artigo sob o título "Dona Aninha", publicado no Estado da Bahia de 25 de janeiro. O artigo foi republicado em Ladinos e crioulos, em 1964, na seção do livro "A face dos amigos", como'"Aninha". E o fato de ser o primeiro da série evidencia, com o destaque editorial, a importância que lhe dava Carneiro e a admiração que tinha pela ialorixá a quem, respeitosamente, chamava de "Dona Aninha". 


Edson Carneiro fotografado por Ruth Landes
Edson Carneiro, por ocasião da realização do Segundo Congresso Afro-brasileiro, idealizado e organizado por ele no ano de 1937, conseguiu encomendar de Mãe Aninha do Afonjá uma lista de pratos africanos praticados em seu terreiro. 
O exemplo do Primeiro Congresso Afro-brasileiro que ocorrera anos antes no Recife – tendo como figura ilustre Gilberto Freyre – e que também contou com relatos de comidas relacionadas ao culto aos orixás provavelmente inspirou Carneiro. 

Pratos da Cozinha da Bahia, pouco conhecidos.
Efó ou Ewe Malu: 
Prato oferecido a Nanã – divindade das águas que representa a memória ancestral de nosso povo – sendo a mãe de todos os outros orixás, segundo Paloma, um dos pratos prediletos de Jorge Amado.

Latipá: 
Prato preparado com folhas de Mostarda Amori Preparado com folhas de Bertalha, cozido na folha de bananeira 
Abarém: 
Este prato foi descrito por Manuel Querino em seu A Cozinha da Bahia, uma especie de acaçá, que serve de guarnição do Caruru, além de poder ser batido servido como refresco. 
Também citado pela folclorista Hildegardes Viana, que condicionava seu preparo ao milho branco sem açúcar e ao milho vermelho com açúcar. 
Andarê ou Andê: 
Prato ritual de cerimonias do Candomblé, o Andê, é feito com Feijão fradinho, e Flor de Milho. 
Arroz Sunicava:
Muito pouco conhecido mas relembra as bolas de farinha da cozinha Angolana, preparadas partir de arroz cozido e temperado com cebola, peixe ou carne e tomates refogadas e fritos no azeite de dendê. 
Podem ser feitos doces também, adicionando coco ralado e fritas em Óleo de Coco. 
Sunicava de Iemanjá: 
Este prato faz parte das comidas sacrificiais do Candomblé, descritas pela Ialorixá Olga Francisca Régis, Olga de Alaketo como: arroz cozido e refogado com cebola, camarão seco fritos no azeite de dendê. 
Euêbe de língua de vaca: 
Também segundo a Ialorixá Olga Francisca Régis, Olga de Alaketo, o Euêbe, pouco se encontra nas mesas baianas. 
Feito a partir da (PANC) Língua de Vaca também conhecida como Beldroega-grande, Major-gomes, bênção-de-deus, bredo, bredo-major-gomes, bunda-mole, carne-gorda, caruru, erva-gorda, (Talinum paniculatum), coloca-se para aferventar sem água, no próprio “suor” da carne. 
Depois acrescenta-se azeite, sal, camarão e cebola. 
E faz um caruru bem sequinho, no azeite.

Quitandê:
O Quitandê infelizmente pouco costuma frequentar nossas mesas, mas é delicioso e atual, remete exatamente ao cultivo da cozinha de produtos locais e onde sua excelência o feijão é o ponto forte. 
A obra de Jorge Amado, faz alusão ao Quitandê nas mesas de Tereza Batista e O Sumiço da Santa. 
 Quitandê Ingredientes: 
500 gm de Feijão Fradinho 
1 xícara de chá de Camarão Seco 
1 cebola pequena 
3 dentes de alho 
1/2 xícara de folhas de coentro 
1 xícara de chá de amendoim 
3/4 de xícara de chá de Azeite Dendê 
1 colher de chá de Gengibre fresco 
Sal á gosto 
Preparo: 
Coloque o feijão fradinho de molho, até o dia seguinte Preaqueça o forno a 160 graus Espalhe os camarões secos numa assadeira grande leve ao forno por 30 minutos 
Cozinhe o feijão em água e sal até ficar macio e com pouco caldo. Numa frigideira funda aqueça azeite-de-dendê, junte a cebola picada e refogue levemente. 
Despeje o refogado na panela do feijão e acrescente o amendoim, a castanha e o gengibre. 
Mexa vigorosamente com uma colher de pau. 
Acrescente os camarões secos, as pimentas, misture bem e deixe ferver um pouquinho só. Sirva acompanhado com farinha de mandioca.

Fontes:
O candomblé da Bahia na década de 1930, Vivaldo da Costa Lima
O texto resgata a atuação de duas personalidades eminentes do candomblé da Bahia, na década de 1930: o babalaô Martiniano Eliseu do Bonfim e a ialorixá Eugênia Ana dos Santos, a famosa Aninha Tanto Martiniano como Aninha contribuíram para o grande êxito do Segundo Congresso Afro-Brasileiro, realizado em Salvador, em janeiro de 1937.


ARÁAYÉ A JE NBO: Um Estudo sobre a Comensalidade em um Terreiro Keto da Bahia.Rafael Camaratta Santos

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