Viva Astrid, Viva São João e a Cultura Brasileira! Gabriela Prioli e o mercado que se danem
A Cultura é um campo de disputa, não há como negar sua importância, seu poder social e político.
Como diria o pensador italiano Antonio Gramisci: "Tudo está na cultura, para transformar o humano, transforme sua cultura. Dou à cultura este significado: exercício do pensamento, aquisição de ideias gerais, hábito de relacionar causas e efeitos... "
A discussão entre Gabriela Prioli e Astrid Fontenelle sobre o São João aculturado resgatou uma necessidade tão urgente quanto ignorada: a preservação de nossas tradições.
Uma discussão da advogada Gabriela Prioli com a apresentadora Astrid Fontenelle na semana passada foi parar entre os assuntos mais comentados do Twitter. Entre mortos e feridos, a conversa sobre as festas juninas no Brasil terminou com a internet curiosamente desabando em críticas sobre Prioli, por sua defesa do mercado e da “modernização” dos eventos, provocando a sua aculturação.
A advogada foi pra cima da apresentadora, que se dizia indignada e frustrada com as festas modernas, onde não se ouve mais forró nem se come amendoim cozido. Prioli retrucou com uma justificativa lapidar do pensamento neoliberal: “Tanto a iniciativa privada quanto a iniciativa pública, quando vão fazer um investimento em uma festa, estão pensando em retorno”.
A frase traz de saída dois problemas sérios. O maior deles é que a iniciativa pública, lê-se o Estado, não pensa ou não deveria pensar, em retorno, ao menos financeiro. O papel do poder público é justamente o contrário, ou seja, o de fomentar a cultura, a identidade de seu povo, tentar manter financeiramente manifestações que a inciativa privada, por uma série de distorções, abandonou.
E o outro problema da frase de Prioli é justamente este. Não é de hoje que empresas modernas começam a rever conceitos devastadores de que o dinheiro pode tudo, sobretudo dilacerar e adulterar a produção cultural do país em que estão instaladas, normalmente de passagem.
O apelo de Astrid é tão simples quanto óbvio. O que restará das nossas festas populares após a invasão da cultura de massa? Um artista como Gusttavo Lima, sem entrar em nenhum juízo de valor, domina o mercado de shows durante o ano todo. Vários outros, mais ligados à tradição, cantores de forró, baião e outros gêneros que sempre compuseram a festa, estão praticamente relegados a ela e devem sucumbir porque o mercado assim o quer?
E, o que é pior ainda, o Brasil, um país de cultura tão rica e diversa, fica condenado a ouvir e dançar a obra de Gusttavo Lima de janeiro a janeiro? Ele e seus pares irão desfilar no Sambódromo também porque é mais vendável do que o samba? Sertanejos e sofrentes vão tomar de assalto o Boi de Parintins? O Galo da Madrugada no Recife e o circuito Barra-Ondina dos trios elétricos de Salvador?
É esse o inferno que nos resta, segundo o raciocínio de Gabriela Prioli e quem mais acreditar nele? A hegemonia cultural total de ponta a ponta? Vamos, enfim, deixar de ser o Brasil diverso e múltiplo, deixar de ter a música nativista do Rio Grande, a canção caipira de Pena Branca & Xavantinho e Renato Teixeira, a pantaneira de Almir Sater, o rock paulistano dos Titãs e Rita Lee, os experimentos de Arrigo Barnabé, a maravilhosa canção mineira de Milton Nascimento e o Clube da Esquina, a Bossa Nova, nossa maior expressão cultural em todo o planeta, só porque o mercado assim o quer? Por que ele investe e precisa de retorno?
Tomara que a Gabriela Prioli, com a tamanha bobagem que falou, consiga despertar o amor próprio do brasileiro por sua herança cultural, suas tradições mais ricas e soberanas. Que ela, com as suas besteiras e arrogâncias, tenha mexido no calo e consiga nos devolver com força e indignação o amor próprio e o sentido da nossa existência.
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