REGISTROS DA CULINÁRIA BAIANA TRADICIONAL
O livro "A Cozinha Africana no Brasil", é uma obra marcante que explora as influências africanas na culinária brasileira.
O autor busca destacar como as práticas culturais, especialmente dos povos Bantu, moldaram a cozinha e os costumes alimentares no Brasil.
A obra integra o vasto trabalho de Cascudo, que se destacou como um dos maiores pesquisadores de folclore, etnografia e cultura popular no Brasil.
Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) foi um renomado escritor, antropólogo, folclorista e historiador brasileiro. Natural de Natal, Rio Grande do Norte, Cascudo dedicou sua vida ao estudo das manifestações culturais do Brasil, com foco especial no folclore, nas tradições orais e nos aspectos do cotidiano que moldam a identidade brasileira.
Embora fosse um acadêmico, Cascudo escreveu de maneira simples e envolvente, tornando suas obras acessíveis a um público amplo.
Seus estudos abrangem desde literatura oral, festas populares, religiosidade até alimentação, como se observa em A Cozinha Africana no Brasil
Seus trabalhos ganharam destaque não apenas no Brasil, mas também em outros países, sendo traduzidos para diversos idiomas, performando um reconhecimento internacional
Câmara Cascudo foi também professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde influenciou gerações de estudantes e pesquisadores. Ele publicou mais de 30 livros, sendo "Dicionário do Folclore Brasileiro" (1954) uma de suas obras mais conhecidas.
A Edição
A edição de "A Cozinha Africana no Brasil" reflete o momento histórico dos anos 1960, quando a antropologia e a história começavam a dar maior destaque às contribuições culturais africanas e indígenas na formação do Brasil. Nessa obra, Cascudo mapeia os caminhos das tradições alimentares trazidas pelos povos africanos escravizados e como elas foram transformadas no contexto brasileiro.
Visita à África
Embora o livro seja fruto de extensa pesquisa sobre as influências africanas no Brasil, Câmara Cascudo não visitou a África em suas investigações. Sua abordagem foi baseada em leituras, entrevistas e observações realizadas no Brasil, dialogando com a cultura afro-brasileira presente no cotidiano nacional.
Ele dedicou-se a compreender as origens africanas de pratos, rituais e costumes culinários que se mesclaram às tradições indígenas e europeias.
O fragmento do texto acima, faz referência à culinária bantu e suas influências na cultura alimentar, principalmente no Brasil, com destaque para a Bahia. Ele explora como a culinária africana foi preservada e adaptada nas Américas, especialmente em comunidades formadas por africanos escravizados. Também menciona a relação entre a religião, como o candomblé, e os alimentos rituais, que desempenham um papel fundamental nas tradições culturais e espirituais. Além disso, discute a organização social e as influências de diferentes regiões da África Ocidental, como Gana, Nigéria, e Daomé, na formação da culinária. Ele ressalta como essas tradições foram moldadas pela resistência cultural e pela necessidade de adaptação às novas condições de vida.
Elementos da Cultura Bantu e Afro-Brasileira
O livro aborda como a cultura dos povos Bantu — que compõem uma parte significativa das populações africanas trazidas como escravizadas para o Brasil — influenciou profundamente a culinária local. Alguns exemplos incluem:
•Uso do dendê e óleo de palma: Ingredientes essenciais na culinária afro-brasileira, como no vatapá e acarajé.
•Técnicas de preparo e cozimento: Como a defumação, o cozimento em panelas de barro e o uso de temperos fortes.
•Pratos típicos: O feijão, o angu, os cozidos e guisados remetem a tradições africanas que se adaptaram à disponibilidade de ingredientes locais no Brasil.
•Alimentos tradicionais:
O autor aborda os chamados "matos de comer" em A Cozinha Africana no Brasil.
Ele dedica especial atenção às plantas de usos tradicionais e a outros recursos vegetais utilizados tanto na culinária tradicional quanto na sobrevivência das populações mais pobres, muitas vezes de origem africana, indígena ou mestiça.
Os "matos de comer" são parte do conhecimento popular transmitido oralmente e referem-se a ervas, folhas e plantas silvestres comestíveis que eram usadas pelas populações africanas escravizadas e suas descendências. Essas práticas revelam uma estratégia de adaptação e resistência cultural, já que os escravizados frequentemente não tinham acesso aos alimentos de melhor qualidade e precisavam explorar os recursos disponíveis na natureza.
•Ritualidade e religiosidade: A comida tem papel central em cultos afro-brasileiros como o candomblé, com pratos específicos para orixás.
O impacto de A Cozinha Africana no Brasil é múltiplo:
•Reconhecimento da influência africana: A obra contribuiu para valorizar e dar visibilidade à herança africana na cultura brasileira, especialmente na culinária.
•Resgate histórico e cultural: Cascudo demonstra como elementos culturais africanos resistiram à diáspora forçada e se tornaram parte integral da identidade brasileira.
•Inspiração acadêmica e popular: Seu trabalho impulsionou pesquisas na área da história da alimentação e consolidou a importância da cultura afro-brasileira nos estudos culturais e históricos do Brasil.
•Valorização do patrimônio imaterial: A obra ajudou a legitimar a culinária afro-brasileira como um patrimônio cultural digno de reconhecimento e estudo.
Câmara Cascudo, como etnógrafo e folclorista, deixou um legado que amplia nossa compreensão sobre a interconexão entre culinária, história e identidade cultural, promovendo uma visão mais abrangente sobre o Brasil e suas raízes multiculturais.
Ele destaca como essa influência é mais perceptível e amplamente reconhecida na culinária baiana, que é descrita como afro-brasileira e bem documentada ao longo do tempo. Autores como Manuel Querino, Sodré Vianna, Darwin Brandão, Hildegardes Vianna e Artur Ramos contribuíram com estudos e publicações sobre o tema, ilustrando sua relevância histórica e cultural.
O texto também faz menção à cozinha do Pará, enfatizando sua variedade e sabor, mas lamentando a falta de pesquisas sobre ela em comparação à da Bahia. Além disso, ressalta que essa tradição culinária existe há séculos no Brasil, mas ganhou maior visibilidade nos últimos tempos.
Na parte final, há uma análise histórica mais ampla, vinculando a procedência de escravos sudaneses e bantos à Bahia e outras regiões, como Rio de Janeiro, Pernambuco, Minas Gerais e São Paulo, discutindo como essa diáspora africana influenciou as práticas alimentares. Menciona também o impacto de ciclos econômicos, como o do ouro, diamantes e café, na disseminação da cultura alimentar afro-brasileira.
O autor destaca que a culinária baiana manteve sua autenticidade e características próprias, mesmo com as adaptações e evoluções ocorridas em outras regiões. Esse aspecto reflete a riqueza cultural e a resistência da tradição afro-brasileira na preservação de sua identidade culinária.
○Nesta série, apresentarei títulos fundamentais que resgatam a riqueza da culinária baiana. Receitas que são registros históricos obtidos por meio de pesquisas em acervos, bibliotecas e antigos cadernos de receitas, que oferecem uma compreensão mais profunda da nossa cultura alimentar e explicam por que ela é considerada tão diversa e única.
Agradecimento especial à Mary Santana, e do acervo Valdeloir Rego da Biblioteca Central dos Barris.
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Uma preciosidade conhecermos a Culinária Baiana por intermédio desse resumido e denso texto. Quando criança ia passar as férias em Natal na casa de minha avó Laura e do meu avô Severino. E passava em frente da casa de Câmara Cascudo; meus avôs diziam ser a casa dele, e eu nem sabia quem era. Uma vez ele estava na porta da casa, e fui apresentado a ele. Mas só anos depois, com mais de 40 anos, é que fui entender quem era Câmara Cascudo, quando iniciei ler o livros dele.
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