A psicanálise do açúcar
O açúcar cristal, ou açúcar de usina, mostra a mais instável das brancuras: quem do Recife sabe direito o quanto, e o pouco desse quanto, que ela dura.
Sabe o mínimo do pouco que o cristal se estabiliza cristal sobre o açúcar, por cima do fundo antigo, de mascavo, do mascavo barrento que se incuba; e sabe que tudo pode romper o mínimo em que o cristal é capaz de censura: pois o tal fundo mascavo logo aflora quer inverno ou verão mele o açúcar.
Se os bangüês que-ainda purgam ainda o açúcar bruto com barro, de mistura; a usina já não o purga: da infância, não só depois de adulto, ela o educa; em enfermarias, com vácuos e turbinas, em mãos de metal de gente indústria, a usina o leva a sublimar em cristal o pardo do xarope: não o purga, cura.
Mas como a cana se cria ainda hoje, em mãos de barro de gente agricultura, o barrento da pré-infância logo aflora quer inverno ou verão mele o açúcar.
João Cabral de Melo Neto,Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p. 356.
João Cabral e Vinicius de Moraes em Paris, anos 70.
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