Pequeno Dicionario da Cozinha Baiana

Verbete-Q Quitandê
Uma das características mais marcantes da culinária da Bahia é a sua originalidade, traduzindo modos e costumes do jeito
baiano de ser: descontraído, leve, finalmente sem frescura.

Na Bahia Quitanda era um local onde se fazem negócios; pequeno mercado, praça, uma  adaptação ao português do quimbundo (língua de Angola) kitanda, «feira», termo que por sua vez evoluiu dekitânda, «estrado de bordão entrelaçado que servia de colchão».   
Antônio Geraldo da Cunha, no Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, confirma que quitanda tem origem no quimbundo ki´tana,  ficando por explicar como é que se deu a evolução semântica de «estrado» para «feira», mas talvez possamos pensar que os produtos da feira eram expostos no estrado a que o termo kitânda alude, o que corresponde a uma transposição semântica por causa da contiguidade de duas realidades, o estrado e o espaço da feira.

As “Kitandas” se tornaram “quitandas”quando as práticas das vendas em tabuleiros atravessaram o Atlântico a bordo dos navios negreiros e alcançaram o Brasil. Aqui, além de designar a venda em tabuleiros, o termo “quitanda” passou a ser utilizado para denominar os pequenos mercados. .Quitandeiras ou negras de tabuleiro foram as denominações que as comerciantes ambulantes de gêneros alimentícios receberam no país. Sobre a influência africana no comércio ambulante que se desenvolveu no Brasil Colonial,  “Para a região da África Central Ocidental as quitandeiras são exemplo de como atuava essa rede comercial de gêneros de primeira necessidade, registrando-se, também, como as migrações transatlânticas trouxeram para as cidades coloniais brasileiras essas comerciantes. 
As feiras e mercados são dados constantes nos relatos dos primeiros europeus que tiveram contatos com as terras africanas na região da África Central Ocidental. Um cronista que viveu no século XVII, em Luanda, diz que chamam de quitanda as feiras onde se vende de tudo. (...) Este mesmo cronista – Cardonega testemunhou a presença de muitas feiras pelo sertão africano quando da dramática travessia dos portugueses, neste litoral, tiveram que fazer ao fugirem dos holandeses. 
Um século depois, Silva Correa define quitanda como mercado de fazendas, quinquilharias, fubás, fruta, verdura, peixe, óleo de dendê, ginguba (pimenta). 


O Quitandê  infelizmente pouco costuma frequentar nossas mesas, mas é delicioso e atual, remete exatamente ao cultivo da cozinha de produtos locais e onde sua excelência o feijão é o ponto forte.
A obra de Jorge Amado, faz alusão ao Quitandê nas mesas de Tereza Batista e O Sumiço da Santa.

Batuque nas cozinhas de João da Baiana.
João Machado Guedes (Rio de Janeiro RJ 1887 - idem 1974). Compositor e pandeirista. Neto de ex-escravos, filho de Félix José Guedes e Perciliana Maria Constança, é o caçula de 11
irmãos. 
Seus avós mantêm tradicional quitanda de artigos afro-brasileiros e sua mãe, Tia Perciliana (ou Prisciliana), também quituteira, forma com Ciata e Amélia as conhecidas Tias Baianas que habitam os bairros cariocas da Cidade Nova e Saúde. Deriva desse fato seu apelido "João da Baiana".
A situação familiar e comunitária facilita a participação desde cedo nas rodas de candomblé, de samba e de outras tradições culturais afro-brasileiras. Nesses encontros aprende a tocar pandeiro − que se torna seu principal instrumento − e outros instrumentos de percussão. Inicia a vida de instrumentista nos blocos e ranchos carnavalescos, mas é com o grupo de jovens que frequentam a casa das Tias Baianas − como Pixinguinha e Donga − que começa a trajetória artística. Tem seu pandeiro (considerado um instrumento de marginal, na época) apreendido pela polícia, porém, o político Pinheiro Machado, seu admirador, faz uma dedicatória num de seus pandeiros e isso lhe dá salvo-conduto. Após trabalhar no circo e atuar como pandeirista em conjuntos, é convidado por Pixinguinha para compor o grupo Oito Batutas, em 1922, mas recusa a oferta com temor de perder o emprego fixo no cais do porto.

No fim da década de 1920, inicia carreira de percussionista em várias emissoras de rádio cariocas, tocando pandeiro e o prato-e-faca, típico do samba de roda do Recôncavo Baiano. Começa a vida de compositor nessa década, com Pelo Amor da Mulata, de 1923, gravada por Patrício Teixeira em 1930, que também lança Beijo de Moça e Casado na Orgia, em 1933, e Mulher Cruel, em 1924. Sua produção é bem limitada e as canções mais conhecidas são Cabide de Molambo, 1928, e Batuque na Cozinha, 1968. Nos anos 1930 faz parte dos conjuntos Guarda Velha e Diabos do Céu, e na década seguinte participa da gravação da coleção Native Brazilian Music, com o maestro Leopold Stokowski, organizada por Heitor Villa-Lobos. Na década de 1950, é convidado por Almirante a formar, com Pixinguinha e Donga, o conjunto Velha Guarda.

Ele é um dos primeiros a gravar os então chamados pontos de macumba à frente do grupo João da Baiana e Seu Terreiro. Paralelamente à vida artística, trabalha desde criança como aprendiz na Marinha e no Exército, e depois desenvolve carreira no cais do porto, onde se aposenta como fiscal. Casa-se e tem dois filhos, que falecem ainda na infância. Em 1972, esquecido pelo grande público, passa a viver na Casa do Artista, onde morre, dois anos depois.



Quitanda dos Eres
Sete dias após a festa do nome de santo, se fazia a “quitanda dos êres”. Este ritual era feito com muitos doces, frutas, comidas de santo, farofas, bolinhos dos mais variados e o tradicional atori (vara de madeira) para castigar os que tentassem roubar suas comidas sem pagar. 
Antes de começar as mães pequenas davam duas voltas no quarteirão, onde está localizado o barracão, mostrando as encruzilhadas para os yawos, quando eles chegavam ficavam abaixados para bater o makó (palmas) para Exu em
agradecimento por terem proporcionado a paz, a tranqüilidade, desde sua entrada no barracão até a a saída do inkisse. Davam três voltas sobre esta lentamente, jogando o corpo para um lado e para o outro como se tivessem em transe, depois voltavam para o barracão, onde estava tudo pronto a espera deles para começar a quitanda. 
Os yawos ao chegarem da rua eram recolhidos ao ronkó para trocarem suas vestes e serem virados nos santos e depois nos êres. Saiam do ronkó com todos seus pertences, davam uma volta no barracão e voltavam para o ronkó para depois saírem com seus tabuleiros de comidas, dançando sob a direção da mãe pequena, com os cânticos apropriados para o ritual. Na frente vinha uma ou duas yatabaxé com as dicissas (esteiras) e os atoris. Após terem dançado e cantado, os tabuleiros eram postos em cima das dicissas em um canto do barracão onde os êres sentados tomavam conta de seu tabuleiro. 
Cada êre com seu atori, era a hora então de dar início a vendas das bugigangas e comidas. Enquanto os êres negociavam suas mercadorias os outros yawos e o runtó da casa dançava e cantava. Nesta festa muitos compravam, outros roubavam e muitos levavam pancadas, mas tudo em harmonia. Por fim, tudo vendido e roubado, pelo povo presente, inclusive os tabuleiros e dinheiro, a mãe pequena perguntava aos êres tinham autorização para venderem aquelas mercadorias, se tinham nota fiscal, etc. Enquanto isso alguém da casa dizia que eles eram clandestinos, que estavam fora da lei e ia chamar a polícia. Os êres tentavam fugir, mas davam de encontros com policiais, daí então iam embora dando lugar ao inkisse que ficavam espalhados no barracão. E assim são recolhidos a um canto esperando que o runtó dissesse aos ogãs para cantarem o xirê para eles, depois do xirê de cada inkisse presente encerrava-se a festa. E sendo assim mais um capítulo na vida dos novos yawos e com ele o progresso do inkisse, bem como a elevação na hierarquia espiritual. 
Deixo vocês com a receita de uma querida amiga Maria Sepúlveda, cozinheira de mão cheia, transcrita do Livro A comida baiana de Jorge Amado, da Paloma Amado.

Serve 8 pessoas
Ingredientes:
500 gm de Feijão Fradinho
1 xícara de chá de Camarão Seco
1 cebola pequena
3 dentes de alho
1/2 xícara de folhas de coentro
1 xícara de chá de amendoim
3/4 de xícara de chá de Azeite Dendé
1 colher de chá de Gengibre fresco
Sal á gosto
Preparo:
Coloque o feijão fradinho de molho, até o dia seguinte
Preaqueça o forno a 160 graus
Espalhe os camarões secos numa assadeira grande leve ao forno por 30 minutos
Cozinhe o feijão em água e sal até ficar macio e com pouco caldo.
Numa frigideira funda aqueça azeite-de-dendê, junte a cebola picada e refogue levemente.
Despeje o refogado na panela do feijão e acrescente o amendoim, a castanha e o gengibre.
Mexa vigorosamente com uma colher de pau.
Acrescente os camarões secos, as pimentas, misture bem e deixe ferver um pouquinho só.
Sirva acompanhado com farinha de mandioca.

Prato de origem africana que integra o patrimônio gastronômico do recôncavo baiano. 

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