“NÃO PRECISA DESTRUIR A NATUREZA PARA PRODUZIR ALIMENTOS" ENFATIZA PROFESSOR DE AGROECOLOGIA SOBRE USO DE AGROTÓXICOS.

Emergência climática aponta para agroecologia como única solução para a produção de alimentos

By Victor Guimaraes

Giovani Sella, Rodrigo Matana e Gustavo Beckert

Sob um sol forte das 10h da manhã, cerca de 20 voluntários colhem feijão orgânico no assentamento do Contestado, localizado na Lapa, Paraná. Essa produção será servida em sete cozinhas comunitárias de Curitiba e região metropolitana.

A poucas dezenas de metros, outras 50 pessoas escutam com atenção a fala de Fernando Rinaldi, que aponta para 500 mudas de árvores de cinco espécies diferentes. Daqui a alguns anos, ele explica, essas árvores, prestes a serem plantadas pelos voluntários, irão compor uma barreira natural entre uma plantação de batata orgânica e a rodovia que passa ali perto.


Rinaldi é professor da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), que há cerca de 20 anos forma militantes, educadores e produtores agroecológicos da América Latina e do Caribe. “A gente olha para a produção de comida saudável, e não para a produção de commodities”, afirma.


A ELAA faz frente à monocultura e à agricultura empresarial, que produz em larga escala e mira na exportação. Na agroecologia, todo e qualquer cultivo é produzido livre de agrotóxicos, pesticidas ou adubação química. O trabalho na Lapa é um exemplo de como a produção de alimentos não precisa acontecer às custas da saúde humana ou a partir da destruição do meio ambiente.


OS AGENTES QUÍMICOS


Fernando Rinaldi separa de maneira clara a plantação de alimentos da produção de commodities. O professor e agricultor relembra que o modelo de produção atual do agro é baseado na chamada “Revolução Verde”.


A partir das décadas de 70 e 80, lavouras com maior produtividade e mais resistentes às diversidades, agentes químicos, agrotóxicos e genética transgênica tiveram uma guinada de desenvolvimento, que gerou problemas ligados à qualidade do alimento e ao desequilíbrio ambiental. 

A relação da planta com o solo, clima e fauna é tênue e delicada e as mudanças climáticas das últimas décadas só dificultaram ainda mais a produção consistente de alimentos.

Com uma visão de que o alimento é apenas um negócio, soluções não orgânicas, como os agrotóxicos, são necessárias para superar as mudanças climáticas. Porém, esse modus operandi, por sua vez, corrobora com a desestabilização do clima, que forma uma espiral alimentícia de destruição.

Agricultores lutam pela maior qualidade de alimentos em lavouras, sem o uso de agrotóxicos. Foto: reprodução.

Giovani Sella, Rodrigo Matana e Gustavo Beckert

Sob um sol forte das 10h da manhã, cerca de 20 voluntários colhem feijão orgânico no assentamento do Contestado, localizado na Lapa, Paraná. Essa produção será servida em sete cozinhas comunitárias de Curitiba e região metropolitana.

A poucas dezenas de metros, outras 50 pessoas escutam com atenção a fala de Fernando Rinaldi, que aponta para 500 mudas de árvores de cinco espécies diferentes. Daqui a alguns anos, ele explica, essas árvores, prestes a serem plantadas pelos voluntários, irão compor uma barreira natural entre uma plantação de batata orgânica e a rodovia que passa ali perto.

Rinaldi é professor da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), que há cerca de 20 anos forma militantes, educadores e produtores agroecológicos da América Latina e do Caribe. “A gente olha para a produção de comida saudável, e não para a produção de commodities”, afirma.

A ELAA faz frente à monocultura e à agricultura empresarial, que produz em larga escala e mira na exportação. Na agroecologia, todo e qualquer cultivo é produzido livre de agrotóxicos, pesticidas ou adubação química. O trabalho na Lapa é um exemplo de como a produção de alimentos não precisa acontecer às custas da saúde humana ou a partir da destruição do meio ambiente.

OS AGENTES QUÍMICOS

Fernando Rinaldi separa de maneira clara a plantação de alimentos da produção de commodities. O professor e agricultor relembra que o modelo de produção atual do agro é baseado na chamada “Revolução Verde”.

A partir das décadas de 70 e 80,  lavouras com maior produtividade e mais resistentes às diversidades, agentes químicos, agrotóxicos e genética transgênica tiveram uma guinada de desenvolvimento, que gerou problemas ligados à qualidade do alimento e ao desequilíbrio ambiental. 

A relação da planta com o solo, clima e fauna é tênue e delicada e as mudanças climáticas das últimas décadas só dificultaram ainda mais a produção consistente de alimentos.

Com uma visão de que o alimento é apenas um negócio, soluções não orgânicas, como os agrotóxicos, são necessárias para superar as mudanças climáticas. Porém, esse modus operandi, por sua vez, corrobora com a desestabilização do clima, que forma uma espiral alimentícia de destruição.

Se a produção agrícola for somada à atividade pecuária, o agronegócio representa o segundo maior emissor de gases de efeito estufa no Brasil. Junto com as emissões causadas pelo desmatamento e outros impactos no uso da terra, que em grande parte ocorrem para a criação de novas pastagens para o gado, a agropecuária corresponderia a 75% das emissões de todo o país.

Os fertilizantes nitrogenados, amplamente utilizados na produção de commodities, além de representar a maior parte das emissões da agricultura, impactam o ambiente de forma direta. De acordo com o Centre for Ecology & Hydrology, no Reino Unido, 80% do nitrogênio aplicado nas lavouras é desperdiçado e perdido para o meio ambiente, escoando para os leitos dos rios, infiltrando-se no solo e dissipando-se na atmosfera.

“Trabalhando com os ingredientes que retornam ao solo e mantém equilíbrio, você tem autonomia e autossuficiência”, afirma Luiz Gonçalves, da diretoria da Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia (Aopa). 

No cultivo agroecológico, técnicas como compostagem orgânica ou adubação verde garantem um solo fértil, descompactado e protegido contra a erosão. Ao contrário da fertilização sintética, esse tipo de prática ajuda a fixar nitrogênio do ar no solo, através das plantas que compõem a cobertura vegetal, como vica, tremoço, mucuna e guandu. “Você não contamina nem o solo, nem a água, e mantém a biodiversidade”, afirma o diretor.

COMBATE À FOME

No auge da pandemia de Covid-19, o acesso já precário das populações mais vulneráveis à alimentação saudável piorou ainda mais. O Marmitas da Terra nasce em 2020, no auge da crise sanitária, mirando nesse problema. A equipe de voluntários recebia doações dos assentamentos, montava as marmitas e distribuía à população em situação de insegurança alimentar. “Começou com o pessoal passando fome”, diz Fernando, que integra a iniciativa.

Com o tempo, a missão do projeto se transformou. A equipe formada durante a pandemia cresceu e passou a trabalhar, para além da distribuição, na produção agroecológica, “pôr a mão na terra”. 

Boa parte das pessoas voluntárias não é assentada, mas vem da cidade para ajudar no trabalho. A “virada de chave”, diz Fernando, foi unir o trabalho na terra à formação na agroecologia. “Fazer essa relação é importante, do campo com a cidade.”

“Para além deles vivenciarem só a produção das marmitas, eles vieram vivenciar toda essa produção, o ciclo desde o cuidado com a terra”. Os mutirões, como o de plantio da barreira para a proteção das batatas orgânicas, acontecem de quinze em quinze dias, aos sábados. A cada encontro, novas pessoas se apresentam para o trabalho.

QUALIDADE DA ALIMENTAÇÃO (consequência)

Nos mutirões de plantio promovidos nos assentamentos do Contestado, na Lapa, a produção não é voltada para as commodities ou produção em larga escala. A prioridade é a colheita de alimento saudável e livre do uso de agrotóxicos.

O sonho de Jovana era uma terra verde, florida, quem sabe até atravessada por um riacho ou cachoeira. Em 2013, no entanto, quando os lotes do assentamento foram sorteados, ela se deparou com um cenário distante da primeira expectativa: um terreno com apenas três árvores e sem nenhuma água.

Hoje, o que era terra vazia deu lugar a uma agrofloresta cheia de vida. Jaracatiá, uvaia, gabiroba, acerola e goiaba compõem o pomar, fora o café para geração de renda e as estufas de tomate orgânico, certificadas através do programa Paraná Mais Orgânico.

A produção agroecológica exclui o uso de pesticidas e outros químicos agressivos ao meio ambiente. “Na agroecologia, a gente aprende a conviver com toda a biodiversidade daquele território”, explica. Ao mesmo tempo, a cobertura vegetal das árvores protege o solo, forma matéria orgânica e nutre o terreno onde serão cultivadas as próximas culturas.

No assentamento Contestado, o plantio de árvores nativas é aliado ao cultivo dos alimentos que abastecem cozinhas comunitárias da região. “Essa é uma forma de a gente mostrar que não precisa destruir a natureza para produzir comida”, afirma Fernando Rinaldi. 

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