AS MULHERES WAYUÚ QUE DESAFIAM O DESERTO: NOSSA TERRA AGORA ESTÁ VIVA!
As comunidades indígenas da Guajira colombiana desenvolvem sistemas alimentares resilientes diante da seca e da fome que historicamente as atingem — e se adaptam às mudanças climáticas.
> “Nunca pensei ver isso. Nossa terra agora está viva!”, diz Eneiris Arpuchana, enquanto observa meia hectare de campos floridos sobre o solo desértico onde passou toda a sua vida. As plantações de mandioca, pepino, feijão guajiro, berinjela e outras frutas desenham uma paisagem de verdes vibrantes que antes só aparecia em seus sonhos. Até o ano passado, a comunidade Tutchonka do povo indígena Wayuú, à qual Arpuchana pertence, sofria com a escassez de alimentos característica das terras áridas do departamento de La Guajira, no extremo norte da Colômbia. “Tínhamos que esperar a temporada de chuvas para plantar”, relata a mãe de quatro filhos, lembrando das dificuldades de uma ranchería que não tinha acesso à água nem à produção estável de alimentos há apenas alguns meses.
> As coisas começaram a se transformar em fevereiro do ano passado, com a entrega de um poço de água que beneficiou cerca de 45 famílias da comunidade Tutchonka, que agora dispõem de uma infraestrutura capaz de fornecer até 45.000 litros de água por dia. Esse foi o início, na região, de um ambicioso plano executado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), aplicado em 12 países. O projeto SCALA busca fortalecer os sistemas alimentares de comunidades vulneráveis e enfrentar os desafios ambientais do planeta. “É um processo que faz parte do atendimento emergencial, mas também constitui ações antecipatórias e adaptativas diante das mudanças climáticas”, afirma o coordenador do projeto na FAO Colômbia, Jorge Gutiérrez, que destaca que as intervenções estão entrelaçadas com as práticas ancestrais das comunidades.
> “Esta horta é resultado do que a terra nos dá, mas também do que aprendemos com nossos ancestrais”, diz Arpuchana, agora agricultora comunitária. Com a segurança hídrica e um plano técnico de plantio, as mulheres da comunidade recuperaram conhecimentos ancestrais sobre manejo agrícola, sementes nativas e preservação do solo. “Antes não sabíamos plantar, agora até ensinamos outras mulheres de comunidades vizinhas”, comenta, com orgulho.
> O modelo implementado contempla capacitações, entrega de ferramentas e sementes, além de acompanhamento contínuo. Também foi criada uma rede de mulheres líderes para fortalecer a articulação e o empoderamento das Wayuú. Em paralelo à produção agrícola, surgiram iniciativas de segurança alimentar infantil, como hortas escolares, merendas nutritivas e oficinas de culinária tradicional com produtos locais.
> Segundo a FAO, a estratégia responde a um contexto particularmente grave: La Guajira é uma das regiões mais afetadas pela emergência climática na Colômbia. A desertificação, a escassez de água e os impactos da má gestão pública colocaram a população Wayuú em um estado de vulnerabilidade crítica, sobretudo mulheres e crianças. “Essa iniciativa nos dá esperança”, diz Arpuchana, que hoje lidera um grupo de mulheres agricultoras em Tutchonka.
> As autoridades tradicionais Wayuú, chamadas de pütchipü'ü, acompanharam o processo para garantir que fosse respeitada a autonomia e a cosmovisão do povo. “Nosso território é sagrado. Toda ação deve estar alinhada com nosso espírito e nossa história”, destaca o líder José Ramón Uriana, que vê no projeto uma possibilidade de reverter o abandono estatal com base na autodeterminação.
> Além de Tutchonka, outras comunidades na alta, média e baixa Guajira também foram beneficiadas. O projeto SCALA, que está em curso até o final de 2025, prevê ampliar o número de comunidades com acesso a água e capacitação agrícola resiliente. “Não é caridade, é justiça climática”, afirma Gutiérrez.
> Arpuchana agora sonha em criar uma escola agrícola tradicional para as crianças Wayuú: “Queremos que aprendam a amar e a cuidar da terra. Se ela está viva, nós também estamos.”
Fonte El País
https://elpais.com/america-colombia/2025-06-21/las-mujeres-wayuu-que-desafian-al-desierto-nuestra-tierra-ahora-esta-viva.html




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