Moqueado, Muquém, Moqueca Significados e Significantes

Se fossemos estabelece uma análise evolutiva aprofundada dessa trajetória, poderíamos afirmar que a cultura africana, foi responsável por "libertar" do julgo colonizador português, pelo menos nosso paladar, de suas comidas sosas.

Além disso, outro logro foi revelar algo escondido, guardado, mocozado, secretamente pelos indígenas, transformando em algo festivo e luminoso.

O poder dogmático da Companhia das Índias, em seus processos de catequese, fizeram um verdadeiro "Moquém" sobre corpos indígenas, impondo subserviência, e sua cultura envergonhada aos povos da terra.

Os caetés que habitavam o litoral do Nordeste fizeram história com seu costume alimentar. 

Conta-se que, em 16 de junho de 1556, eles souberam do naufrágio de uma embarcação portuguesa em mares brasileiros e ficaram na praia aguardando os pratos de seu jantar.

O banquete estava servido, 90 tripulantes e o primeiro bispo do Brasil, dom Pedro Fernandes de Sardinha, foram capturados e devorados, até onde sabemos, só sobrou a lata que serve de monumento.

Hans Staden, por pouco, salvou-se de arder e virar Carne do Sol no trempe Tupinambá. 

Seres brutos e dezumanizados como historicamente foram tratados os povos indígenas, e a lição foi aprendida, quem realmente eram os brutais assassinos?

Tanto o Muquém quanto a Moqueca são conquistas civilizarorias de nossa gente.

Uma carta do padre Luís de Grã, datada de 1554, é provavelmente o primeiro documento a se referir ao moquém ('carne assada ou seca em uma grelha de varas, uma técnica de preparação indígena) e à carne moqueada.

O padre Fernão de Cardim escreveu, em 1584: "Eles nos deram a cear de sua pobreza peixinhos de moquém, isto é, assados, batatas, cará, mangará e outras frutas da terra...". 

Já o padre Monteiro, em carta escrita quase um século depois, em 1610, foi ainda mais longe, dando livre curso ao seu entusiasmo pela dieta indígena: "A carne de moquém, garante, se vai assando com tal têmpera, que leva vantagem a toda invenção do assado, na limpeza, na ternura e sabor".

De toda forma, existe uma tendência, do século XVIII em diante, em ligar essas moqueadas às carnes de peixe. "Moquém" era, simplesmente, o assado envolto em folha e feito sobre a brasa ou sob a brasa. "Moquém", em língua tupi, significa algo como "secador" para tostar a carne, algo similar à "Mantinha" Angolana.

Estamos falando de um processo longo, onde foram sendo incorporados outros elementos, como o coco, o dendê, umedecendo a preparação, tornando acessível ao coletivo, e deixando a folha de lado, usando como suporte as frigideiras de barro.

Umedecer é tudo de bom 😀

Leia também: Verbete-M Moqueca de Folha.

A relação entre indígenas e negros chegados foi fundamental na transmissão de saberes sobre as plantas locais, por parte dos africanos, que tinham o conhecimento do uso da cerâmica, e da confecção de utensílios.

Segundo testemunho do naturalista alemão do século XVII George Marcgrave, os índios, envolviam, com folhas de árvores ou ervas, e cobriam com cinza quente os peixes que iriam comer.

Essa maneira branda e lenta, de assar ou cozer a carne em seu próprio suco se manteve, e hoje a gastronomia descolonizada, chama de Sous Vide.

Esclarecimentos:

Contém fina ironia 😀

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