Série Pesquisadores Vivaldo da Costa Lima

Vivaldo da Costa Lima nasceu em Feira de Santana, em 1925, foi antropólogo e também obá (ministro) de Xangô do Axé Opô Afonjá, terreiro que a partir dos anos de 1930 tornou-se o principal centro difusor da cultura religiosa nagô e fez convergir ao seu redor artistas e intelectuais como Jorge Amado, Carybé, Dorival Caymmi, Pierre Verger e Edison Carneiro, além do renomado sacerdote Martiniano Eliseu do Bonfim, que ajudou na instituição desse corpo de ministros.

O professor Vivaldo era um grande especialista em questões relacionadas à gastronomia afro-brasileira, dono de uma biblioteca sobre cozinha com origens africanas, dedicou-se estudar e a falar sobre a gastronomia do seu estado, especialmente sobre as comidas de santo. 

Foi um dos mais ativos intelectuais na divulgação da cultura culinária e popular da Bahia, um dos seus últimos trabalhos foi um livro escrito a partir de conversas com a ialorixá Olga de Alaketu de quem foi compadre e amigo.


Aos 19 anos, se formou em odontologia e em seguida se especializou em cirurgia da boca, em São Paulo. 

Ao retornar para a Bahia, passou a se interessar pelas ciências sociais, dedicando-se, especialmente, à cultura afro-brasileira. 

Criou, ao lado de George Agostinho da Silva, o Centro de Estudos Afro-Orientais (Ceao/UFBA), fundado em 1959 e foi o primeiro antropólogo baiano a viajar para a África, onde fez pesquisas de 1960 a 1963.

Em 1966, ingressou como professor substituto de Thales de Azevedo, na cadeira de Antropologia, na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia. 

Intelectual que vivia as mudanças no cenário baiano, naquela década, VCL convivia com artistas, personalidades e intelectuais, tendo recepcionado, por exemplo, Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir quando o casal francês visitou a Bahia. Levou os escritores para uma visita ao terreiro do Opô Afonjá.

Vivaldo da Costa Lima, Mãe Senhora, Jean Paul Sartre, Jorge Amado e Cristina Tavares

Foi o primeiro diretor do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia – IPAC (fundado em 1967). Estava no cargo quando coordenou o processo de restauração do Pelourinho. “Jovens que até os anos 80 nunca tinham ido ao Centro Histórico lotavam os bares do Pelourinho. Isso deu ao baiano uma nova autoimagem”, anotou em artigo o cantor e compositor Caetano Veloso.

Em 2005, aos fazer 80 anos, recebeu o título de Professor Emérito da Universidade Federal da Bahia, a Medalha Roquette Pinto da Associação Brasileira de Antropologia – ABA – e proferiu conferência sobre a trajetória da alimentação na Bahia e o acarajé. 

É respeitado como um estudioso pioneiro da formação do povo brasileiro.

Conhecedor da cultura baiana, o antropólogo Vivaldo da Costa Lima morreu em 22 de setembro de 2010, ciente de que sua obra seria perenizada. Ainda em vida, ele fez as últimas notas do livro inédito A Comida de Santo Numa Casa de Queto da Bahia, cuja autoria atribuiu à Olga Francisca Régis (Olga de Alaqueto). 


MESTRE DIDI, PIERRE VERGER E VIVALDO DA COSTA LIMA em foto do Arquivo analógico de A Tarde, cuja digitalização foi produzida por Cleidiana Ramos para seu blog MUNDO AFRO

O estudioso também já havia conferido as versões editadas de A Anatomia do Acarajé e Outros Escritos e de Lessé Orixá – Nos Pés do Santo, ambos da coletânea Ephemera. Esses livros estão sendo entregues às livrarias pela editora Corrupio, que antes já havia disponibilizado para o público a terceira edição de A Família de Santo nos Candomblés Jejes-nagos da Bahia: Um Estudo de Relações Intragrupais, um clássico do autor.

Quatro meses após a morte do Professor Emérito da Universidade Federal da Bahia e Obá de Xangô do Ilê Axé Opô Afonjá, as quatro publicações são apresentadas ao público em forma de coleção de textos de Vivaldo da Costa Lima.A realização do projeto editorial conta com o apoio financeiro do Fundo de Cultura, Secretaria de Cultura do Estado da Bahia. Desde o ano de 2005 que a editora Arlete Soares havia convencido Vivaldo a publicar os seus trabalhos, como um marco que comemoraria os 30 anos de fundação da Corrupio. 

A proposta foi viabilizada graças aos esforços de Rina Angulo para obtenção de recursos e seu gerenciamento.          

A Corrupio já havia feito, do autor, A Família de Santo nos Candomblés Jejes-nagos da Bahia: um estudo de relações intragrupais (segunda edição, de 2003) e ainda Cosme e Damião: o culto dos santos gêmeos no Brasil e na África (2005). “O convívio nos fez aprender muito sobre o antropólogo”, diz Arlete, diretora da Corrupio.

De Nina a Amado

No seu trabalho, Vivaldo da Costa Lima faz referência a nomes como Edison Carneiro, Nina Rodrigues, Manuel Querino, Câmara Cascudo. “São autores que criaram uma obra importante sem ter os recursos dos autores de hoje que dispõem de acesso a uma vasta literatura sobre os temas que trataram de modo profundo, abrangente e corajoso”, raciocina Cida Nóbrega, justificando a citação dos escritores. Jorge Amado é uma constante também, talvez pela a ligação com a cultura de sua terra, que conhecia profundamente, incluindo o candomblé, de onde tirou inspiração, argumenta a editora.

 Um dos pioneiros do Centro de Estudos Afro Orientais (CEAO), ali Vivaldo se dedicou a estudos sobre a Linguagem do candomblé, de 1967 a 1969. Em 1971/1972, desenvolveu pesquisa para elaboração de sua tese – A família de santo–, para a qual entrevistou os principais líderes de 23 terreiros dos mais significativos e de várias nações encontradas em Salvador. Agora a Corrupio traz à tona a inédita pesquisa sobre a cozinha sacrificial do terreiro do Alaqueto, com D. Olga Francisca Régis, então mãe de santo da casa (1965).

O antropólogo Peter Fry, na quarta capa do Família de Santo, da Corrupio, afirma que a “clareza de exposição e a erudição do autor dão ainda ao texto um valor maior. É um depoimento engajado de um pesquisador de mão cheia, um membro de longa linhagem de grandes intelectuais baianos, para quem o Candomblé é muito mais que um simples objeto de estudos ou curiosidades étnicas”.

Vivaldo nutria admiração e amizade por muitos líderes dos candomblés da Bahia: Mãe Aninha, Mãe Senhora – que conheceu bem –, Olga do Alaqueto, Mãe Stela, Mãe Menininha, Moacir de Ogum. Em alguns terreiros ele teve cargos, como Obá de Xangô do Axé Opô Afonjá, e respeitava as responsabilidades do cargo. 

“Ele estudava, admirava a cultura, as tradições, principalmente seus líderes e dava o retorno que dele se esperava”, considera Cida, que cuidou para que as quatro publicações chegassem às livrarias do país com a ortografia ajustada ao acordo ortográfico de unificação da língua portuguesa.

OBRAS DE VIVALDO DA COSTA LIMA

A Comida de Santo Numa Casa de Queto na Bahia – de Olga Francisca Régis, introdução e notas de Vivaldo da Costa Lima. Esse quarto volume traz a publicação de um trabalho de pesquisa realizado pelo autor ainda no ano de 1965, no terreiro do Alaqueto, em Salvador. 

tema é a comida sacrificial praticada naquele terreiro, analisada pelo autor nos aspectos significativos da simbologia, da mitologia e da tradição religiosa, da etno-história e etnolinguística. 
O livro traz um texto básico – que é a transcrição integral das entrevistas com a ialorixá Olga Francisca Régis, morta em 2005, sem correção nem edições. 

O antropólogo VCL assina as notas, em cujo conteúdo pretende esclarecer, informar e sugerir suas próprias interpretações, indicar fontes utilizadas para a compreensão do texto áureo. A originalidade dessa publicação reside no fato de o tema ser abordado de uma forma mais completa, com referência ao significado de certos ingredientes, ligados à mitologia e à liturgia do culto aos orixás, e sobre sua preparação. Os trabalhos existentes sobre o assunto se limitam a uma abordagem classificatória ou seguem o estilo “livros de culinária” com ingredientes, quantidades. Ilustrado com 12 fotografias em preto e branco. Autor: Olga Francisca Régis, introdução e notas de Vivaldo da Costa Lima/ Gênero: Etnografia/Etnoculinária / Editora:Corrupio 

Trechos:

“De Exu, me disse Olga: ‘Exu come de tudo. Come com os outros santos. Todos os santos que comem dão um quinhão a Exu’”

“O texto de Olga está aí, na sua rica expressividade, com suas variantes dialetais e seu estilo muito pessoal – falando dos orixás de sua casa como de seres com quem, sempre, desde menina, manteve uma interação cotidiana, no conhecê-los bem e no servi-los com dedicação e rigor”

 

* Coletânea Ephemera:

 1 - Lessé Orixá: Nos Pés do Santo. Reúne 19 textos sobre temas diversos dos estudos da cultura afro-baiana e brasileira, sempre numa abordagem antropológica, etno-histórica ou etnolinguística, em que o autor analisa conceitos, simbologia, mitos, ritos, costumes e tradições, tratando os temas nas suas manifestações no Brasil e nas nações africanas de onde foram trazidos e com o rigor e aprofundamento característico da obra de Vivaldo da Costa Lima. O simbolismo da direita e da esquerda no candomblé da Bahia, Os Obás de Xangô, Transe e possessão, Candomblé da Bahia na década de trinta, Candomblé no Centro Histórico e As festas no Centro Histórico são alguns dos temas tratados neste volume. Da coletânea Ephemera. Autor: Vivaldo da Costa Lima / Gênero:Antropologia/ Editora: Corrupio 


Trecho:

“É preciso proclamar a necessidade da morte, coisa que, como vimos, muitas culturas sempre souberam e acataram e que a ciência moderna terminou por encontrar. Na verdade, a morte, para o biologista, é o que torna diariamente possível a sobrevivência da espécie e assegura, com sua renovação, as chances de mutação” (de A Morte e o Morrer )

 

A Anatomia do Acarajé e Outros Escritos. Esse volume reúne os escritos do autor sobre culinária, alimentação, mais propriamente a cozinha baiana e seu enraizamento nos cultos dos orixás e voduns – a comida dos santos.  

Seria mais adequado falar de etnoculinária, resultado dos estudos a que se dedicou o autor nas últimas décadas – a culinária, a alimentação em seus aspectos socioantropológicos, socioeconômicos, etno-históricos, os simbolismos, os ritos e costumes, variantes regionais etc., acrescidos de uma exaustiva revisão bibliográfica sobre o assunto, entre autores nacionais e estrangeiros. 

A obra se constitui de 12 artigos escritos para cursos, palestras, participação em congressos nacionais e internacionais, publicação em revistas especializadas, aulas inaugurais etc. 

Da coletânea Ephemera. Autor: Vivaldo da Costa Lima /Gênero: Antropologia-Etnoculinária/ Editora: Corrupio 

Trecho:

“Estranhei aquela história de pimenta misturada com a massa ainda crua. Estava já me preparando para audaciosas análises estruturais sobre a pungência e a fritura, quando lá, em seguida, em nota ao texto, leio: ‘Se preferir, a pimenta pode ser frita separadamente no azeite para fazer o molho [...]’ . E a antropologia perdeu aí uma brilhante análise estrutural do nosso acarajé.” (de A anatomia do Acarajé)

 

A Família de Santo nos Candomblés Jejes-Nagos da Bahia: Um Estudo de Relações Intragrupais. Reedição da obra clássica do autor, que teve uma primeira publicação facsimilar pela própria UFBA, em 1977; uma segunda edição, com revisão completa do texto, notas e referências, saiu pela Corrupio em 2003 e já se encontrava esgotada. 

O livro trata da organização interna dos terreiros de candomblé, pautada no parentesco engendrado na iniciação ritual; a estratificação baseada no princípio da senioridade e hierarquia; formas de liderança e sucessão, as relações intragrupais, conflitos e tabus. 

A Família de Santo nos Candomblés Jejes-Nagos da Bahia: Um Estudo de Relações Intragrupais. Ilustrado com 18 fotografias em preto e branco. Autor: Vivaldo da Costa Lima / Gênero: Antropologia/ Editora: Corrupio 

Trecho:

“O rito de iniciação constitui o primeiro e decisivo momento da integração das pessoas no candomblé e estabelece uma relação permanente que é a própria essência da organização social do grupo. 

A iniciação, em suas várias formas, além dos aspectos psicológicos que envolve, por ser o meio pelo qual as pessoas se identificam com seus orixás, provê, ainda, o mecanismo de agregação no grupo em que se poderá, eventualmente, atingir uma completa participação nas hierarquias dirigentes”


Fonte: Editora Corrupio


 "[...] a alimentação tomada aí no sentido abrangente de todo um sistema que vai da produção ao consumo e envolve as formas de interação social, de expressão simbólica e de ritualização e que se acha hoje reavaliada, reconsiderada nos meios acadêmicos e científicos." (2010, p. 40) Vivaldo da Costa Lima

O acarajé e os estudos sobre a cozinha baiana

A partir de uma breve revisão bibliográfica sobre a cozinha baiana enquanto culinária afro-brasileira, discutimos neste texto como os estudos socioantropológicos sobre as chamadas “comidas de azeite” podem contribuir para a compreensão do contexto histórico que envolve o acarajé. Da mesma maneira, ressaltamos a importância do azeite-de-dendê na construção de uma identidade afro-baiana, sintetizada através desse bolinho.

Leia mais no Sigulink:

http://www2.uefs.br:8081/cer/wp-content/uploads/SANTOS_Vagner.pdf









Comentários

Postagens mais visitadas