TRÊS PRATOS DA SEMANA SANTA NA CULINÁRIA DOS AGUDÁS, REVELAM E REFORÇAM LAÇOS PROFUNDOS ENTRE BAHIA E NIGÉRIA.
A culinária dos Agudás — descendentes de africanos escravizados que retornaram do Brasil à Nigéria no século XIX — é um elo vivo entre duas margens do Atlântico. Durante a Semana Santa, essa memória se expressa em sabores que cruzam tempo e território: pratos que nasceram da travessia e carregam em si o sincretismo entre fé católica, raízes iorubás e técnicas baianas.
O Frejón, o Pirão de Caranguejo e o Mungunzá não são apenas alimentos — são formas de resistir, celebrar e lembrar. Cada colherada conta uma história de ida, volta e permanência. Ao redor dessas receitas, comunidades se reúnem para honrar a fé, o silêncio da Paixão de Cristo e a doçura dos reencontros.
A "Páscoa do brasileiro" Popo Aguda refere-se à festa da Páscoa celebrada pelos agudás, descendentes de escravos afro-brasileiros libertados que migraram para a Nigéria.
Os agudás, que formavam uma comunidade unida em Popo Aguda, celebravam a Páscoa com saídas de caretas ou figuras mascaradas, a burrinha na Epifania e o Nosso Senhor do Bonfim, associado a Obatalá, durante o Natal.
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Origem dos Agudás:
Os agudás são descendentes de escravos libertados que, após a abolição da escravatura no Brasil, se estabeleceram na Nigéria.
Comunidade Unida:
A comunidade de Popo Aguda era conhecida pela sua forte ética de trabalho e pela união entre os seus membros.
Celebrações da Páscoa:
A Páscoa era celebrada com atividades tradicionais, como saídas de caretas, a burrinha na Epifania (Dia dos Reis Magos) e a celebração do Nosso Senhor do Bonfim, uma figura religiosa associada a Obatalá, durante o Natal.
No contexto de Salvador, BA:
A celebração da Páscoa pelos agudás em Popo Aguda é uma manifestação cultural interessante, que revela a influência da cultura afro-brasileira na Nigéria.
🍽️ Pratos Tradicionais da Semana Santa entre os Agudas
Segundo registros históricos, os Agudas mantêm uma culinária distinta, especialmente durante períodos festivos como a Semana Santa. Alguns dos pratos típicos incluem:
Entre Lagos e Salvador, cozinha-se a memmemóriaSemelhante ao nosso Feijão de Leite, o Frejón Agudá é um prato ancestral. Nasceu do encontro entre o Brasil e a Nigéria, temperado pela fé, pelo silêncio da Sexta-Feira Santa e pela doçura da resistência.
O que é o Frejón?
Feito à base de feijão-preto (cozido e peneirado) e leite de coco, o frejón ganha textura de mingau espesso ou pudim suave. Pode ser adoçado com açúcar, aromatizado com noz-moscada, canela ou cravo. Nas casas agudas de Popo Aguda, é servido com peixe seco ou caracóis apimentados, e, às vezes, com o farofado garri ijebu (feito de mandioca fermentada).
Frejones, consumidos na Nigéria e na África Ocidental, são pudins feitos de feijão preto cozido lentamente durante a noite em madeira ou carvão e depois misturados com leite de coco para formar um pudim espesso, doce e suave. Em alguns países, o prato é aromatizado com cacau.
Os feijões são cozidos até formar uma pasta espessa e lisa e misturados com leite de coco. Frejón é frequentemente servido com ensopado de peixe , caracol apimentado e garri ijebu .
Quando se come?
É um prato ritual da Sexta-Feira Santa, quando os corpos se recolhem e a carne é suspensa. O frejón honra o luto, a travessia, o silêncio do Cristo morto. Mas também celebra a ancestralidade, o retorno, o elo entre Salvador e Lagos.
No fundo das panelas agudas, o mar nunca foi esquecido.
O Pirão de Caranguejo é herança viva da Bahia em solo iorubá.
É sabor de enseada, de quintal, de festa e recolhimento.
É presença da costa nos rituais de corpo e alma.
O que é o Pirão de Caranguejo?
Um prato que reúne a carne do caranguejo, o caldo do casco e a espessura da farinha de mandioca, transformando tudo em um creme quente e untuoso.
Ganha cor com o óleo de dendê, perfume com folhas de louro e o tempero das casas que lembram Salvador, mesmo em Lagos.
Quando se serve?
É prato de partilha, de fim de tarde, de encontros familiares.
Na Semana Santa, acompanha o frejón, oferecendo um contraponto salgado e marinho.
Mas também aparece em festas e rituais, como prova da permanência do território mesmo quando a geografia muda.
Culinária Aguda: a diáspora no prato
No pirão, há memória do pilão.
Há mariscagem, quintal, panela de ferro, mão calejada.
É uma comida que cura, que conforta, que embala histórias de retorno e saudade.
No baque do tambor e no vapor da panela, o tempo se adoça.
O mungunzá é alimento de corpo e espírito.
É herança africana que viajou ao Brasil — e que depois voltou — carregando no milho branco os segredos da travessia.
O que é o Mungunzá?
Feito com milho branco cozido, leite de coco, açúcar e canela, o mungunzá é um prato doce que aquece as manhãs de festa e os silêncios da fé.
Na culinária Agudá, ele é símbolo da fartura e do afeto, servido em tigelas de partilha, especialmente durante os ciclos sagrados do ano, como a Semana Santa.
Quando se come?
O mungunzá é presença certa nos rituais de recolhimento e nas celebrações de família.
É servido em cafés comunitários, nas alvoradas de Sexta-feira Santa, ou como encerramento doce após o frejón e o pirão.
Culinária Aguda: doce resistência
O mungunzá fala com suavidade.
É doçura ancestral em tempos duros.
Grão a grão, constrói pontes entre Bahia e Nigéria, entre lembrança e futuro, entre fome e dignidade.
📸 Registros Visuais Folha de São Paulo
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