“GRELOS: LEGUMINOSA QUE RESISTEM AO TEMPO"

Sempre me pergunto por que, em algumas culturas, certos alimentos conseguiram resistir ao tempo, enquanto em outras foram sendo esquecidos ou marginalizados. No Brasil, folhas como o bredo, a taioba, a beldroega ou a ora-pro-nóbis — tão presentes nos quintais e roçados das gerações passadas — foram, pouco a pouco, afastadas dos pratos do cotidiano, muitas vezes associadas à pobreza ou ao atraso.

Esse não foi o caso dos grelos na Galícia e em Portugal. Essa folha simples, nascida do nabo ou de algumas variedades de couve, permaneceu com dignidade e mestria nas mesas tradicionais. Mais do que ingrediente, os grelos seguem sendo símbolo de uma culinária afetiva, ritualística e profundamente ligada ao ciclo da terra.

É curioso observar como, em terras galegas, essa folha humilde sobreviveu não apenas pela necessidade, mas pela reverência. Presente em caldos, no arroz, ao lado do bacalhau ou do porco, os grelos têm lugar cativo na memória coletiva — algo que revela uma relação de respeito com os alimentos do campo, mesmo os mais simples.

O que faz com que uma cultura preserve certos sabores enquanto outras os silenciam? Talvez a resposta esteja na força dos vínculos comunitários, na oralidade viva, na relação com a terra e na capacidade de resistir aos processos de padronização e apagamento cultural.

Os grelos sobreviveram porque estão no centro de algo maior: uma cozinha de resistência, profundamente enraizada no território e na memória afetiva. Eles não eram apenas alimento: eram presença no prato de festas como o Entroido (Carnaval), tradição nos caldos que aqueciam as casas camponesas, companhia do bacalhau nas refeições de Domingo.

A sua história lembra a de folhas como o bredo, a ora-pro-nóbis ou a bertalha, presentes nos quintais e roçados do Brasil, especialmente em territórios quilombolas e comunidades rurais. Assim como os grelos, essas folhas muitas vezes foram vistas como “comida de pobre” e negligenciadas por uma culinária colonizada que elegeu o refinado como sinônimo de valor. Ainda assim, seguiram vivas, sustentadas pela oralidade e pelo saber ancestral.

Hoje, enquanto a culinária se volta novamente para o local, o ancestral, o sustentável — os grelos reaparecem com força. Em pratos autorais, em menus sazonais, mas também nas mesas de quem nunca os abandonou. Eles nos ensinam que o alimento não é só nutriente: é memória, vínculo com a terra e insistência de um modo de vida.

Os grelos, em Portugal, referem-se às folhas e flores de nabos ou couves, e são um acompanhamento popular na culinária portuguesa. Acredita-se que as suas origens estejam no leste da Europa e na Sibéria, onde foram cultivados há cerca de 4.000 anos. Ao longo dos séculos, a sua cultura estendeu-se por toda a Europa, tornando-se um alimento comum em várias regiões. 

Origens:

Os grelos, como alimento, têm raízes no leste da Europa e na Sibéria.

Há evidências de que o seu cultivo ocorreu há cerca de 4.000 anos.

A partir dessas origens, a sua cultura foi expandindo-se por toda a Europa. 

História:

Ao longo dos séculos, os grelos tornaram-se um alimento comum em diversas culturas e regiões europeias. 

Em Portugal, são especialmente apreciados como acompanhamento na culinária, especialmente as flores e folhas de nabos e couves. 

A sua presença na culinária portuguesa demonstra a sua longa história como um alimento importante. 

A sobrevivência dos grelos na culinária tradicional galega e portuguesa é uma história de resistência cultural, adaptação agrícola e vínculo afetivo com o território.

Culinaria de Raiz camponesa e resistência cultural:

Os grelos, brotos tenros da planta do nabo (ou de variedades específicas da couve), sempre fizeram parte da alimentação camponesa do norte de Portugal e da Galícia. Mesmo quando a urbanização e a modernização agrícola passaram a valorizar produtos mais comerciais, os grelos sobreviveram como símbolo de identidade rural. Eram e ainda são consumidos especialmente em épocas festivas como o Carnaval, reforçando seu valor ritual e afetivo.

Culinária de escassez com alto valor nutritivo:

Grelos são sazonais, baratos e extremamente nutritivos. Na lógica da subsistência, foram valorizados como alternativa ao consumo de carne, enriquecendo sopas, caldos e acompanhando o bacalhau — elemento central nas festas. Isso os manteve vivos nos quintais e roçados, mesmo quando não estavam presentes nos mercados.

Transmissão oral e valorização regional:

A culinária tradicional galega e portuguesa sempre teve um forte pilar oral — receitas passadas de mães para filhas, de avós para netos, sem necessariamente estarem em livros. Isso ajudou os grelos a permanecerem como um "sabor de casa". Nos últimos tempos, houve também um movimento de valorização dos produtos autóctones, especialmente nas regiões que promovem o turismo gastronômico. Grelos voltaram com força até nos restaurantes mais sofisticados.

Clima e território favorável:

A Galícia e o norte de Portugal têm condições ideais para o cultivo de grelos: clima úmido, solo fértil e tradição agrícola familiar. Isso fez com que a planta nunca deixasse de ser cultivada. Diferente de alimentos que exigem mais estrutura ou investimento, os grelos são resilientes.



Comentários

Postagens mais visitadas