Semiárido: 600 bancos de sementes crioulas serão construídos até 2016

Objetivo é promover inclusão produtiva de pelo menos 12 mil famílias de agricultores da região.
Até fevereiro de 2016, serão construídos 600 bancos comunitários de sementes crioulas no Semiárido com o
objetivo de beneficiar pelo menos 12 mil famílias de agricultores que fazem parte do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. Na ação, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) vai investir quase R$ 21 milhões.

Com os bancos comunitários, os agricultores familiares terão acesso a sementes de qualidade (crioulas, adaptadas e varietais). A expectativa é ampliar a produção de alimentos que garantam a segurança alimentar e nutricional das famílias que já têm acesso à água por meio do Programa Cisternas.

O secretário nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Arnoldo de Campos, afirma que a medida faz parte de um conjunto de ações para incluir produtivamente as famílias pobres da área rural. “Este projeto vai ajudar a enfrentar um grande desafio no Semiárido que é a implantação de sistemas produtivos que convivam melhor com a realidade da região. A produção e a disponibilização de sementes e mudas adaptadas vão contribuir muito para isso”, disse.

Para a implantação dos bancos, o MDS firmou parceria com a Associação Programa Um Milhão de Cisternas para o Semiárido (AP1MC). O termo foi publicado na terça-feira, (20/1), no Diário Oficial da União (DOU).

A entidade vai ser responsável pelo planejamento, identificação e seleção dos beneficiários e prospecção, definição e estruturação dos locais de implantação dos bancos de sementes. Além disso, vai realizar ações de mobilização e de capacitação e garantir assistência técnica às famílias.
O que são as Sementes Crioulas?
No princípio as sementes eram diversas e esta diversidade servia de alimentos sadios e ricos em nutrientes para saciar a fome da humanidade. Ainda hoje há uma grande diversidade, mas muitos tipos já se perderam. As sementes são fontes de vida, origem e o sustento da vida. Delas nascem e por elas continua a vida de todos os seres vivos. Na história do povo egípcio, ao passarem fome, pediram a José: “Dá-nos sementes, a fim de que vivamos.” (Gn 47,19)
As sementes, para muitos povos e comunidades, são vistas como sagradas. Elas são um presente dos deuses e pertencem aos povos, nações, e a toda humanidade. É um bem comum, patrimônio da humanidade, direito inalienável e símbolo de vida.
A relação e convivência com as sementes e com a terra expressam também o modo de vida e de religiosidade que é própria da vida na roça. O camponês e a camponesa, ao cultivar com sementes crioulas, além de alimentar a cultura e a sabedoria popular, faz a re-ligação do sagrado e do simbólico, reavivando a história de cada geração.
As sementes crioulas são aquelas melhoradas e conservadas pelas famílias agricultoras ao longo de séculos, adaptadas às suas condições de solo e clima, às suas práticas de manejo e preferências culturais. Historicamente, as comunidades agrícolas têm sido responsáveis pela conservação de uma riquíssima diversidade de espécies e variedades, adaptadas aos mais diferentes usos e necessidades. Essa diversidade faz parte da estratégia produtiva desses agricultores: elas fornecem alternativas de alimentos, forragem, fibras e remédios ao longo do ano, entre outras vantagens, enriquecendo a dieta e diversificando as possibilidades de obtenção de renda.
Essa riqueza também está relacionada aos diferentes usos (alimentação, forragem, comércio, preparação de comidas típicas etc.) e características de interesse (duração do ciclo, resistência à seca ou à umidade excessiva etc.). Assim como a diversidade de espécies, a diversidade genética dentro de uma mesma espécie é de enorme importância para diminuir a vulnerabilidade dos agricultores: se numa lavoura existirem diversas variedades de feijão, por exemplo, dificilmente uma doença, praga ou extremo climático dizimará todas.
Apesar dessa enorme importância, ao longo das últimas décadas, a legislação e as políticas públicas caminharam no sentido de colocar essa riqueza em risco. Até bem pouco tempo, as sementes crioulas sequer eram reconhecidas pela legislação brasileira: eram consideradas “grãos”, e não sementes, e ficavam excluídas de todas as políticas. Com a aprovação da nova Lei de Sementes (10.711), em 2003, as sementes crioulas passaram a ser oficialmente reconhecidas e ficou vedada sua exclusão de programas de financiamento ou de programas públicos de distribuição ou troca de sementes destinados a agricultores familiares. Essa mudança permitiu avanços importantes no trabalho de resgate, conservação e uso de sementes crioulas em muitas regiões do Brasil, mas algumas dificuldades permanecem.
Todo o trabalho de resgate e preservação das sementes crioulas requer muita perseverança. Cabe lutar por um controle coletivo das sementes, construir mecanismos efetivos de soberania alimentar, partilhar informações e articular resistências. A transformação virá no tempo certo, pois a boa semente que cai em terra boa dá bons frutos.
Muitos camponeses e camponesas cuidam de guardar as sementes crioulas em casa, para o próximo plantio. Na colheita, selecionam as melhores sementes para a reprodução. Contudo, além do armazenamento em casa, uma experiência muito importante são as Casas de Sementes, espaços construídos por comunidades camponesas para o armazenamento de sementes crioulas. Ali, são selecionadas, armazenadas e bem cuidadas, para que não falte a semente na hora certa. As Casas de Sementes também são espaços de articulação e formação das comunidades, onde se discutem a agroecologia, a convivência com o semiárido, os males do uso de agrotóxicos, a história das sementes e a importância do resgate e conservação das sementes crioulas.

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