Baiana descobre novas espécies de algas em parceria com Harvard e homenageia "mulheres negras representativas"

A baiana Priscila Barreto de Jesus é autora principal de um estudo, feito por um grupo de biólogos, que descobriu três novas espécies de algas vermelhas do tipo Hypnea.

Preta nascida em uma comunidade de Salvador, a pós-doutora não pensou duas vezes antes de batizar as espécies em homenagem a outras três mulheres pretas de destaque.

As escolhidas foram a filósofa Djamila Ribeiro, a escritora Conceição Evaristo e a ativista Angela Davis.

O artigo “Phylogenomics and taxon-rich phylogenies of new and historical specimens shed light on the systematics of Hypnea (Cystocloniaceae, Rhodophyta)” está em processo de publicação na revista Molecular Phylogenetics and Evolution, um periódico altamente conceituado na área.

Hypnea é um gênero de algas vermelhas e uma carragenófita bem conhecida (planta produtora de polissacarídeo carragenina )

A Hypnea é cultivada em muitos países tropicais, como Filipinas, Brasil, Bangladesh, Índia e Vietnã, para alimentação e seus extratos de kappa-carragenina.

Depois de Eucheuma/Kappaphycus, é a segunda fonte mais importante de carragenina nos trópicos, porém é cultivada apenas em ambientes experimentais e não comercialmente. 

A tecnologia necessária para fazer isso ainda está sendo desenvolvida e requer mais investigação. A maioria das atividades de cultivo experimental foi feita usando Hypnea musciformis , e sua morfologia altamente variável pode ser parcialmente responsável pela inconsistência nos resultados desses experimentos.

A carragenina tem uma ampla gama de aplicações, desde alimentos até usos farmacêuticos. Os extratos de várias espécies de Hypnea foram investigados por suas propriedades antivirais, antibacterianas, antioxidantes e antifúngicas.

A descoberta das espécies Hypnea davisiana, Hypnea djamilae e Hypnea evaristo e aconteceu após o sequenciamento do genoma de cada uma delas, numa parceria com a Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, referência mundial.

Atualmente, Priscila é professora adjunta da Universidade Federal do ABC (UFABC) e, ao jornal O Estado de S. Paulo, contou que a escolha dos nomes levou em conta sua própria trajetória, quando começou a estudar na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). 

“Foi na faculdade que eu me descobri negra, quando saí da periferia de Salvador e fui estudar em um ambiente repleto de homens brancos”, conta a pesquisadora, que, nesse processo, começou a ler sobre o racismo, escolhendo “Pequeno Manual Anti-racista”, de Djamila, e “Olhos D’água”, de Conceição Evaristo, como as primeiras leituras. Ao mesmo tempo, foi apresentada ao pensamento da norte-americana Angela Davis.

O estudo é uma coautoria de outras mulheres, a também baiana Goia Lyra, Hongrui Zhang e Mutue Toyota Fujii, além de Fábio Nauer, José Marcos de Castro Nunes e Charles C. Davis. Mesmo sendo a única negra da equipe, a ideia de Priscila de fazer uma homenagem às três figuras foi bem aceita pelo grupo de estudo, que teve orientação da professora Mariana Cabral Oliveira.

“Essas homenagens são representativas e deixa o legado dessas pessoas vivo para sempre”, relata a pós-doutora sobre a prática de homenagear pessoas, que costuma encontrar alguma resistência no meio acadêmico.

"Fiquei profundamente emocionada quando soube que a Drª. Priscila Barreto de Jesus batizou uma espécie de alga vermelha com meu primeiro nome. Muito obrigada pelo reconhecimento tão especial! Nunca imaginei viver algo assim, fiquei muito tocada. Viva as nossas pesquisadoras", celebrou Djamila, em suas redes sociais.

As três novas espécies foram encontradas em herbários de universidades fora do Brasil, na Polinésia Francesa, na Coréia do Sul, e na Índia. A pesquisa foi publicada no último dia 7 de março, véspera do Dia Internacional da Mulher.

Foto: Taba Benedicto/Estadão. 

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