A Beldroega na Cultura Portuguesa.
A grande novidade, é que não há novidade...
Quando falamos em PANCs, esquecemos de recordar que muitas delas consideradas plantas daninhas, tiveram origem anterior ao ser humano e evoluíram desde os primórdios da Terra.
Quando falamos em PANCs, esquecemos de recordar que muitas delas consideradas plantas daninhas, tiveram origem anterior ao ser humano e evoluíram desde os primórdios da Terra.
São plantas pioneiras de sucessão secundária.
Pioneiras, pois são as primeiras plantas a colonizar áreas de sucessão secundária, ou seja, locais onde ocorreu algum distúrbio ambiental que eliminou previamente a vegetação existente.
E porque os habitantes de Lisboa são chamados de alfacinhas?
O nome cientifico das Beldroegas, já identificam a importancia dada a esta planta na cultura Portuguesa, ’portulaca oleracea".
Uma das tantas hipóteses, é de que o grande consumo de beldroega (’portulaca oleracea’) espalhados pelo centro de Lisboa, tenha conferido este apelido aos Portugueses.
Portugal é um país fofo, com gente pacífica e simpática e muita hortaliça nas sacadas e quintais.
Portugal é um país fofo, com gente pacífica e simpática e muita hortaliça nas sacadas e quintais.
“Há quem explique que nas colinas de Lisboa primitiva verdejavam já as plantas hortenses utilizadas na culinária, na perfumaria e na medicina, que dão pelo nome de alfaces. ‘Alface’ vem do árabe, o que poderá indicar que o cultivo da planta começou quando da ocupação da península pelos fiéis de Alá”.
Os lisboetas já tiveram de viver só da hortaliça
Continua a coluna O Poço da Cidade: “Há também quem sustente que, num dos cercos que a cidade foi alvo, os habitantes da capital portuguesa tinham como alimento quase exclusivo as alfaces de suas hortas”.
Continua a coluna O Poço da Cidade: “Há também quem sustente que, num dos cercos que a cidade foi alvo, os habitantes da capital portuguesa tinham como alimento quase exclusivo as alfaces de suas hortas”.
As mulheres de Lisboa não se moviam muito, assim como a hortaliça.
No seculo XV na Cozinha Portuguesa, já haviam relatos da utilização por exemplo da Beldroega (Portulaca oleracea), escrito num português castiço, esta receita.
O manuscrito original exibe um tipo gótico cursivo, encadernado em capa de carneiro, e compõe o “Livro de Cozinha da Infanta D. Maria de Portugal”, a neta do rei D. Manuel I de Portugal, não a autora da obra.
Não se sabe quem escreveu. Sabe-se que é o mais antigo livro português de receitas existente. Uma importante contribuição à memória da linguagem nacional portuguesa, e ao entendimento do que era a arte de cozinhar, dos hábitos e da vida social na época quinhentista.
“Tomaraõ a carne de porco ou de carneyro muyto gordo, que naõ leue osos e picalaaõ muyto meuda e teraõ acola a farinha peneyrada per huna peneira de seda e teraõ dez ou doze jemas dovos duras e entaõ meteraõ en cada pilouro tamanho como pela de jugar de carne picada e huna jema dovo e entaõ efarinhado aquele pilouro na farinha e entaõ deytalosam dentro nhuã panela de mãteyga que este feruendo sobre as brasas ou taõbem qualdo de carneyro muyto gordo mesturadocõ mãteyga e deytarlheaõ huns poucos de cheyros atados enteyros dentro e entaõ abafaraõ esta panela cõ hun testo en rriba e amde dar huna volta a panela de maneira que naõ quebrem as pelas e amnas de deytar cõ aquele qualdo basto nhun prato de maneira que naõ se quebren e aõde ter gosto destes adubos, crauo e asafraõ pimenta e gengibre e se o qualdo he pouco seuaõno cõ o qualdo das outras panelas.”
Então, esta é uma receita de almôndegas do século XV, ou no léxico do período, “he a rrecejta das boldroegas”. “Boldroega”, cruzamento de “beldroega” (planta alimentícia popular) com “bodega” (comida grosseira), traços de espanhol e árabe.
Então, esta é uma receita de almôndegas do século XV, ou no léxico do período, “he a rrecejta das boldroegas”. “Boldroega”, cruzamento de “beldroega” (planta alimentícia popular) com “bodega” (comida grosseira), traços de espanhol e árabe.
Os mercados da Lisboa seiscentista
Testemunho de uma convivência salutar
Nas suas águas, embarcações de porte e tonelagem diversa enchiam de cor e vida a zona ribeirinha da cidade. Naus, galeões, fragatas, caravelas, navetas e pequenos botes descarregavam no cais gentes, produtos e preciosidades provenientes de terras longínquas.
No porto, como nas ruas, lojas, oficinas e mercados, uma polifonia de vozes testemunhava o encontro com mundos extraordinários e com uma natureza extravagante.
A cada chegada das naus da Carreira da Índia a população acorria curiosa a assistir a um verdadeiro espectáculo. Para além das valiosas encomendas régias ‒ como pedras preciosas, sedas, pérolas, âmbar, bezoares ou gaiolas com animais exóticos ‒ eram desembarcados sacos com especiaria, potes de grés contendo drogas, frascos de conservas, caixas com sementes e vasos com plantas.
Frutas deliciosas, plantas venenosas, folhas com poderes mágicos, raízes com propriedades miraculosas, produtos com insondáveis qualidades terapêuticas trouxeram à velha Europa novos sabores e aromas que, para além da possibilidade de surpreender os paladares mais exigentes debelavam os males mais persistentes.
Usados nos quotidianos longínquos, muitos produtos tropicais passaram a ser enviados de forma contínua através das naus da Carreira da Índia para ser vendidos em Lisboa.
A diversidade de origens dos produtos oferecidos pelos mercados da cidade atestava a convivência multicultural das gentes desta capital imperial.
A par dos figos, uvas, cidras e limões também os cocos, bananas e laranjas da China eram vendidos nas praças alfacinhas.
Usados nos quotidianos longínquos, muitos produtos tropicais passaram a ser enviados de forma contínua através das naus da Carreira da Índia para ser vendidos em Lisboa.
A diversidade de origens dos produtos oferecidos pelos mercados da cidade atestava a convivência multicultural das gentes desta capital imperial.
A par dos figos, uvas, cidras e limões também os cocos, bananas e laranjas da China eram vendidos nas praças alfacinhas.
Nas bancas do Mercado da Ribeira, os alimentos dispunham-se de forma ordenada.
Para além das cabanas de madeira destinadas ao negócio do sal, encontravam-se aquelas onde se vendia caça, animais de criação e ovos. Protegidas por guarda-sóis quadrangulares seguiam-se as bancas das vendedeiras de peixe, das escamadeiras e das salgadeiras de sardinha.
Para além das cabanas de madeira destinadas ao negócio do sal, encontravam-se aquelas onde se vendia caça, animais de criação e ovos. Protegidas por guarda-sóis quadrangulares seguiam-se as bancas das vendedeiras de peixe, das escamadeiras e das salgadeiras de sardinha.
Logo ao lado, encontravam-se as da fruta verde e seca proveniente, em grande parte, dos pomares dos arredores da cidade.
Nas bancas de hortaliça, as mulheres apregoavam as couves, segurelha, alfaces, nabos cenouras, acelgas, abóboras, beldroegas, cebolas, bredos e salsas.
Neste mercado também se vendiam passas, figos, queijos do Alentejo e das Flandres, assim como tâmaras, arroz, mel e manteiga. Por fim, passados os fornos de pão e as bancas das padeiras, já perto do rio, surgiam os espaços destinados à venda do marisco.
Uma enorme profusão de lagostas, caranguejos, ostras, camarões e amêijoas e outros crustáceos era anunciada à clientela com sonoros pregões. A frescura dos artigos à venda nesta praça era assegurada pela apertada fiscalização conduzida pelos provedores da saúde.
Para além deste mercado de frescos, por toda a cidade se mercadejavam outros produtos: dos pastéis e confeitos das pastelarias do Chiado, à venda ambulante de doces, legumes cozidos, mariscos e laranjas da China ou de flores à porta da igreja da Misericórdia, Lisboa oferecia ao visitante uma enorme diversidade de artigos.
A abundância de mel, açúcar, ovos, leite, natas, pinhões e amêndoas permitiu o aparecimento de uma doçaria conventual variada e refinada. Nos numerosos conventos da cidade, as religiosas diversificavam a oferta de doces e confeitos tão apreciados pela população. O doce açúcar foi também usado na preparação de frutas cristalizadas ou em calda, assim como em geleias, compotas ou marmeladas.
Para além das ginjas, romãs, laranjas, limões, pêssegos e alperces eram usuais os preparados com peras e marmelos em conservas doces ou salgadas.
À medida que o século XVII ia avançando, os portugueses foram permitindo a introdução de algumas novidades vegetais americanas na sua dieta.
O milho-maiz, a batata, a batata-doce e o tomate, apesar de entrarem de forma gradual, trouxeram novos sabores às cozinhas lisboetas.
Nas mesas mais abastadas, as especiarias orientais condimentavam os pratos e deliciavam os convivas.
Nos livros de cozinha, para além das vulgares salsa, coentro, hortelã e cebolas, uma grande maioria das receitas não prescindia do sal, pimentas, cravinho, noz-moscada, cardamomos e gengibre assim como de outros condimentos mais requintados, como o açafrão, a canela ou o tão apreciado caril.
Mas também outros produtos mais valiosos podiam ser usados na preparação de iguarias como o cacau, o almíscar, o âmbar ou os pós de aljôfar, de coral, de ouro ou de pedra de bezoar.
Nesta opulenta Lisboa, onde se acotovelavam gentes de todas as nações do mundo e se cruzavam os mais diversos usos e costumes, a novidade fervilhava nas ruas, nos mercados, nas mesas e nas boticas. Acolhendo as práticas e costumes de outras gentes, o povo de Lisboa deu testemunho de uma singular capacidade de abraçar e divulgar as tradições, os aromas e os paladares próprios de outras culturas.
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