O melhor crítico de restaurantes que os portugueses desconhecem

Por Ricardo Dias Felner

Um livro acabado de publicar por Ana Marques Pereira destaca um dos mais brilhantes — esquecidos e polémicos — escritores gastronómicos do século XX: Luís de Sttau Monteiro.

A receita apareceu no semanário Se7e e causou confusão. Chamava-se “costeletas à Manuel Pedrosa”. Na composição entrava margarina, latas de sumo de alperce — “as que forem necessárias” — misturadas com vinho branco e uma pasta de alho. Estava-se nos anos 1980, Portugal comia gordura vegetal às colheres, matava a sede com polpas de sumo doces como pavlovas e dava-se a grandes desvarios jornalísticos. 

No texto, o autor mete-se com o dono da receita, supostamente seu compincha. “O Manuel Pedrosa é vago quanto à origem desta receita — ele, que é capaz de falar horas sem fim sobre a origem da maioria dos pratos!”, atira, para mais à frente finalizar: “Gostaria, honestamente, de dar mais receitas deste meu amigo, mas é extremamente difícil arrancar-lhas”. 

Mas quem eram, afinal, Manuel Pedrosa e Paulo Santana? Ambos assinavam artigos nos media, mas ninguém tinha provas da sua existência física. O primeiro era crítico de restaurantes n’O Jornal; e uma pesquisa rápida nos arquivos da RTP, alojados na Internet, confirma também a existência de uma série da sua autoria, chamada Caldo de Pedra. Já sobre Paulo Santana só se sabia que escrevia no Se7e, alternando a rúbrica gastronómica com um Júlio Santana. Nenhum fora alguma vez visto. 

A resolução do mistério das identidades ajuda a perceber porque é que um dos mais brilhantes escritores gastronómicos de Portugal permanece desconhecido da grande maioria das pessoas. Luís de Sttau Monteiro era o homem por trás de ambos os nomes, mas nunca se assumiu como crítico de restaurantes. Foi sempre valorizado como escritor, como homem do teatro e do romance, como um menino rico anti-fascista, que gostava de competições de automóveis e de maçar a PIDE — relegando-se a sua escrita gastronómica para uma nota de rodapé. 

Uma injustiça e um erro. 

Apesar de ter escrito sobre comida durante três décadas, a sua biografia e o estudo da sua obra desprezam gritantemente esta faceta. Para mim próprio, que procuro estudar estas coisas, ela foi uma revelação. Antes de ler o livro que Ana Marques Pereira acaba de editar, intitulado “Luís de Sttau Monteiro, Gastrónomo”, e de ir depois pesquisar mais a fundo as suas críticas de restaurantes, ele era o autor de “Felizmente Há Luar”, um amigo de José Cardoso Pires e de uma grupeta de intelectuais hedonistas, que viam na mesa um pretexto para a revolução, para o petisco e para o vinho. 

Hoje, a minha opinião mudou. Tenho por certo que, nos últimos 50 anos, nunca, em Portugal, alguém escreveu sobre comida como ele e foi tão ferozmente — lucidamente — crítico do consenso nacional sobre o lugar insuperável da cozinha portuguesa no mundo.  

Um estrangeirado desabrido

Para compreender essa postura é preciso compreender a sua vida. Filho do embaixador Armindo Monteiro, viveu em Londres na juventude, regressando à capital inglesa mais tarde, entre 1962 e 1967, já depois de tirar o curso de Direito e exercer advocacia. A mudança para Inglaterra foi uma fuga ao regime, mas no regresso ao país acabaria por ser detido, por causa dos seus escritos sobre a guerra colonial e a ditadura.

A prisão não o deteve de escrever o que pensa, mas ter-lhe-á refinado a escrita. Sttau Monteiro gostava de se desmultiplicar com vários nomes no espaço público, mesmo se entre eles não existiam personalidades diferenciadas. Era já assim com as famosas crónicas da Guidinha, também publicadas no suplemento A Mosca, do Diário de Lisboa, mas a profusão de pseudónimos que lhe estão associados relacionam-se sobretudo com as crónicas sobre gastronomia que publicou desde os anos 1960, o primeiro dos quais se chamava “inspector Gourmet” e oficiava na revista Almanaque.

Na década de 1970, quando estava mais desabrido, Sttau Monteiro terá sido o mais delicioso crítico de restaurantes que os portugueses desconhecem. Produziu milhares e milhares de caracteres sem qualquer reconhecimento de monta — só o respeito interpares, praticamente, e mesmo assim comentado baixinho.

A principal responsabilidade por essa ignorância é do próprio autor, ao usar uma dúzia de pseudónimos nos seus escritos na imprensa — contribuindo como ninguém para o eclipse da sua obra. Mas a academia e as instituições pouco fizeram contra isso.

Ana Marques Pereira chegou a pensar que o uso dos pseudónimos teria razões políticas. “Pus a hipótese de serem resquícios da perseguição a que fora sujeito”, disse-me esta médica de formação, historiadora e coleccionista de artigos ligados à culinária portuguesa, recentemente, em sua casa, um museu vivo de livros e louça e instrumentos de restauro. A afirmação teria por base, sobretudo, a prisão a que Sttau Monteiro fora sujeito, no regresso de Londres. Sucede que a tese tem pés de barro. “Não fazia muito sentido, na verdade, porque depois ele dava o seu nome verdadeiro nos artigos que escrevia sobre automóveis, por exemplo, ou nos livros”, acrescenta.

É preciso ver que o uso de pseudónimos na imprensa anti-regime era usual. Aliás, nos anos 1970, praticamente todo o suplemento Mosca, do Diário de Lisboa, usava pseudónimos. Dirigido por António Ruella Ramos, o suplmento era uma extraordinário espaço de vanguarda libertária e provocação — muito à frente do seu tempo e do seu país — e Sttau Monteiro um dos seus intérpretes mais talentosos. As suas crónicas, na maioria das vezes em forma de diário gastronómico, eram quase sempre absolutamente destruidoras. Nelas, o escritor contava episódios do seu quotidiano, misturando as suas experiências a comer fora com reflexões mais vastas sobre a cozinha portuguesa. 

Em qualquer caso, a verrina fazia mossa. Se os restaurantes eram “atipicalhados” — com carapaus “veneráveis na antiguidade” e “um odor honesto, fritos em óleo já usado para fritar besugo, toucinho e chouriço da terra” — apanhavam. Se eram más cópias do que acontecia no estrangeiro, levavam também. 

Do Ritz à Tia Matilde

Veja-se o que escreveu sobre o Ritz, por exemplo. A introdução é informativa, com uma ironia suave. “O snack do Ritz, por exemplo, criou um prato novo cujo nome é, se não elucidativo, pelo menos divertido. Trata-se nem mais nem menos de uma simples ‘omellette’ (o nome é francês…) que a casa serve com duas rodelas de pickles de beterraba (o ´pickles´ é uma invenção inglesa, a beterraba de origem portuguesa…), algumas azeitonas negras (portuguesíssimas) e uma folha de alface saloia”.  

Depois, lança a questão ao público. “Pois que nome julgam os leitores que a casa deu a este prato?”, questionava, para, no fim, dar a estocada final. “Nada mais nada menos do que o nome de ‘omelette à americana’. É claro que se tivesse posto o nome de omelette arménia, de ovos à moda da Síria ou de fritada de ovos caucasiana, ninguém teria dado pela diferença, porque no fundo as omeletes sem recheio só podem pertencer a uma de duas espécies: as bem feitas e as mal feitas.”

A avaliação do menu era muitas vezes acompanhada de apreciações sociológicas, exercício em que a literatura o treinara. A burguesia com pretensões estava sempre na sua mira. “A esta gente é indiferente comer sopa de pacote, caldo verde da véspera ou seja o que for, desde que a sopinha figure na lista como sendo vichyssoise e custe, pelo menos, 25$00. Não espanta, nestas circunstâncias, que os proprietários dos restaurantes se riam e sirvam alcunhada de vichyssoise qualquer restinho de puré de batata que tenham no frigorífico e ainda esteja em estado de poder ser misturado com um pouco de leite e uns restinhos de cebola promovida a alho-porro.”

Em todo o caso, aquilo que punha Sttau Monteiro mesmo furioso era a ideia de que o tradicional popularucho é que era bom, de que a tasca portuguesa eram uma instituição insuperável, de que a culinária lusa não tinha comparação. Disse-o sem veleidade, com uma crueza inédita, tendo frequentemente por comparação o que acontecia a Norte dos Pirinéus. “Quando comparamos o que se come nos pequenos restaurantes routiers de França com o que se nos é oferecido por esse país fora, vêm-nos as lágrimas ao estômago”. Na revista Almanaque, em 1960, já criticava quem dizia que “a boa comidinha portuguesa e a boa pinguinha da Bairrada são imbatíveis”, sem ter ponto de comparação.  “Em Lisboa, à excepção de um restaurante chinês, de dois restaurantes levemente à italiana e de dois ou três restaurantes que fazem os possíveis por serem franceses, não há locais onde os portugueses possam provar pratos estrangeiros”, lamentava.  

Não havia semana, nos anos de 1970 e 1971, quando a sua verve estava mais temperada, que o escritor não se mandasse a alguma casa de Lisboa e arredores. Veja-se, por exemplo, o que disse sobre o Frango Real, em Cascais, em Maio: “O Frango Real adquiriu proporções de instituição de utilidade pública em Cascais. (…) A lista não é notável: ninguém em casa se gabaria dos pratos pretensamente caseiros que lá fabricam e dos restantes não vale a pena falar. Sobre o balcão, ovos de codorniz — um desgraçado pássaro que só não optou pela espécie dos mamíferos porque não lhe disseram que os seus ovos iam parar aos Frangos Reais deste mundo.”  

Semanas antes, tinha sido outra a instituição glosada, a Tia Matilde, em Lisboa. “O restaurante é do tipo garagem e o ambiente condiz. Cheio, evidentemente de petisqueiros lusitanos da velha estirpe, isto é, daqueles que vão no cabrito e no coelho à caçadora sete dias por semana”, arrancava, para depois concluir: “A comida nem é boa nem é má. É do tipo caseiro, se por caseiro entendermos um género de comida pouco imaginativa e distraidamente temperada que é costume designar por trivial. O coelho servido com uma tal abundância de fígado e de miudezas que o julgámos um caso clínico, não estava notável.”

De entre os poucos que lhe mereceram elogios encontra-se, à cabeça, o Tavares, então o restaurante mais luxuoso da cidade. Sttau Monteiro usou-o sempre como ponto de comparação, mesmo quando se falava de cozinha popular portuguesa. “Ainda que isto doa a quem não conhece o Tavares, a verdade é que as nossas castiças cozinheiras deviam ir aprender a fazer comida castiça com o chefe desse restaurante, mas como é da tradição dizer que nos restaurantes castiços é que se come bem, lá vamos cantando e rindo”, escreveu, em 1970. 

Mesmo relativamente a restaurantes de que gostava, olhava sempre para o lado mau. Numa das suas crónicas, aliás, sentiu-se forçado a explicar essa postura, tantas eram as cartas ao director que recebia por parte dos donos dos restaurantes. “É necessário e útil que se critique violentamente o que se passa no país até porque servir o turismo não é proteger os que servem bodegas aos turistas”, atirou, não sem antes classificar os restauradores da nação. “Não há proprietário de restaurante que se não julgue baluarte do turismo e que, por ter atingido a invejável categoria social de ‘comerciante estabelecido’, se não considere intocável. (…). Um cidadão estabelecido é um cidadão como outro qualquer e não tem direitos ou privilégios especiais. Um comerciante estabelecido tem as portas abertas ao público e, portanto, à crítica.” 

Mesmo quando gostava do sítio, reservava sempre espaço para assinalar falhas. Veja-se o que escreve sobre o Gambrinus, “um dos poucos restaurantes de Lisboa que sabe o que é um restaurante”. “O consomée estava morno, o cheiro dos mariscos, à porta, não era convidativo, os pratos não tinham sido aquecidos e o sorvete pedido por um dos convivas não tinha uma graça que o distinguisse dos servidos em qualquer restaurante de segunda ordem.”  

Sttau Monteiro, o cozinheiro e o gastrónomo

A sua visão crítica ultrapassava a própria restauração, tinha também que ver com a falta de diversidade dos produtos. “De um modo geral, comemos sempre as mesmas coisas e a nossa cozinha de quotidiano é de uma pobreza evangélica. Na província, então, a coisa ainda é mais grave. Quando nos lembramos da variedade de legumes que se encontra em qualquer praça de aldeia francesa e entramos numa praça portuguesa é que verificamos como a nossa cozinha é pobre e pouco variada.”

Esta visão ter-se-á tornado menos pessimista com o decorrer dos anos. O seu foco mudou dos restaurantes para o receituário e para a história da gastronomia. Ana Marques Pereira, porventura quem mais se dedicou a estudar a sua literatura gastronómica, assinala sobretudo a fase em que já se posiciona como um gastrónomo que alia a execução e o estudo. 


Ana Marques Pereira

Aparentemente, a dada altura, Sttau Monteiro terá sentido a necessidade de ter um conhecimento mais sólido sobre o tema, para combater a ideia de bitaiteiro irresponsável, que alguns lhe terão associado. José Quitério, ex-crítico do Expresso, seu sucessor no palco da crítica nacional (iniciou-se em 1976), numa entrevista a Alexandra Prado Coelho, em 2015, admitindo que ele era um espírito brilhante e culto, dizia que ele “era um bocado fantasista” e escrevia uma secção “onde se referia a restaurantes e tinha uns artigos gerais sobre gastronomia”.

Era certamente um estilo diferente de Quitério. É certo que Sttau Monteiro leu Escoffier ou parte dele e saberia fazer um béchamel e um hollandaise, mas talvez aquilo que mais o tenha distinguido dos demais, antes e depois dele, foi o registo anglossaxónico, quer na escrita directa, quer no humor, quer na ironia. Enquanto muitos companheiros de mesa e de páginas de jornal, pertenciam à ala intelectual francófona e procuravam a crítica equilibrada e académica, a verdade gastronómica absoluta, o que estimulava Sttau Monteiro era a provocação e a crítica de costumes, a piada sem filtro e sem pudor, a crítica aberta numa cidade onde toda a gente conhecia toda a gente.  

Pseudónimos e pseudo-críticos

Se isso teria sido possível caso assinasse com o seu nome verdadeiro? É duvidoso. E é polémico. A discussão sobre o uso de pseudónimos na assinatura de críticas de restaurantes é antiga. A regra, em Portugal como no resto do mundo, é os autores dos textos assumirem a sua identidade na autoria dos artigos. É isso que acontece, por exemplo, com Pete Wells, crítico do New York Times, ou Fortunato da Câmara, do jornal Expresso (que, aliás, fez a apresentação do livro de Ana Marques Pereira sobre Sttau Monteiro).

Mas existe também uma longa tradição de uso de nomes falsos, ou pseudónimos, como foram os casos de Adam Platt, na New York Magazine, ou, em Portugal, de Lourenço Viegas, na Time Out, revista que ainda hoje mantém essa prática, tanto na edição portuguesa como nas estrangeiras. 

Há quem veja nesse procedimento uma forma de desresponsabilização. Há tempos, falando com um conhecido crítico português, que assina com o seu nome, ele dizia-me. “O crítico que assina com pseudónimo acha que pode dizer o que quiser, porque ninguém lhe vai cobrar nada”, afirmou, mostrando-se contra. A ideia faz sentido, ainda que os órgãos de comunicação social e o autor da crítica estejam sujeitos ao mesmo escrutínio da lei e dos tribunais aplicado a quem assina com o seu nome verdadeiro. 

Mas pode-se precisamente defender o uso do pseudónimo com base no mesmo argumento. Poder dizer-se o que se quer é algo valioso, numa área onde reinam os conteúdos pagos ou patrocinados e os almoços grátis, onde há um grande condicionamento por parte de chefs e assessores de imprensa e onde prevalece a crença patrioteira.

No fundo, o uso do pseudónimo pode ajudar a que crítico se sinta livre para criticar chefs ou instituições poderosas e intocáveis ou ir contra convenções, tendências e modas. Sttau Monteiro foi prova disso. Não me lembro de, alguma vez, por exemplo, ter ligo algo sobre um restaurante do Ritz que fosse, sequer, aproximado ao que ele escreveu. Da mesma forma, nunca li opiniões tão cáusticas sobre a cozinha portuguesa como as dele. “Come-se muitíssimo mal neste jardim à beira mar planta­do, que já se equiparou, em ma­téria de preços, aos melhores estrangeiros, situação para a qual concorre o facto destes restaurantes serem frequenta­dos por uma quantidade imensa de gente ligada à famigerada actividade que dá pelo nome genérico de public relations e que, por ignorância e outros motivos, tende a considerar-se bem servida desde que a notinha das despesas seja suficientemente elevada para deslumbrar o cliente.”

A questão é saber-se até quando durou o anonimato do crítico Sttau Monteiro. Por certo que, entre os pares e entre a comunidade de restauradores de Lisboa, nos anos 1970 e 1980, a sua identidade foi sendo reconhecida. Lisboa é uma cidade demasiada pequena para se guardar um segredo destes durante tanto tempo. Mesmo com a mudança frenética de pseudónimos, o seu estilo era singular e o impacto do que escrevia imenso. 

José Quitério, na mesma entrevista ao Público, lembra-se de Sttau Monteiro lhe contar que recebia, “por semana, não sei quantas cartas’”. Quitério terá chegado à conclusão que seria “blague” dele. Mas pode não ter sido: são profusas as citações de cartas a reagir aos seus textos, umas com comentários de leitores, outras dos restauradores visados.

Talvez também por isso Sttau Monteiro se tenha adocicado. No livro de Ana Marques Pereira temos sobretudo a sua faceta gastronómica mais séria. A dada altura, ele terá sentido a necessidade de reforçar a sua cultura e começou mesmo a anotar conhecimentos que repescava da sua biblioteca. Ana Marques Pereira não encontrou a sua biblioteca gastronómica privada, mas encontrou os cadernos onde Sttau Monteiro anotava os títulos que citava. 

Dos vinagres às sopas do mundo

Esses documentos, pequenos dossiers imaculadamente preservados, foram comprados pela historiadora num alfarrabista. Ana Marques Pereira diz não saber como eles foram lá parar, nem em que data terão sido redigidos. O registo de escrita, todavia, é completamente distinto do que ele praticava na rubrica A Melga no Prato, do Diário de Lisboa, ou mesmo, já nos anos 1980, no Se7e. Aqui são pequenos textos meramente informativos e factuais, organizados como entradas de um dicionário, mas também como “Apontamentos para a História da Península Ibérica”. Estes apontamentos, prenunciariam, segundo Ana Marques Pereira, a publicação de um livro sobre a história da alimentação na Europa Ocidental, vontade já expressa numa reportagem para a RTP. 

No último capítulo de “Luís de Sttau Monteiro, Gastrónomo” aparecem ainda recortes de textos do semanário Se7e, que a autora guardou, e agora transcreveu. Aqui é o Sttau Monteiro cozinheiro que surge. A escrita volta a ter humor, sarcasmo e ligeireza. Não há nada de muito sofisticado, mas há mundo. Sttau Monteiro quer ensinar os portugueses a temperar vinagres (a melhor forma de desmascarar um pretenso gourmet — sustenta —, é olhar para a sua prateleira de vinagres), a fazer pickles caseiros, sorvetes e gnocchi alla romana (uma das suas especialidades mais celebradas, prato que a mãe faria com primor), bem como sopas de além-fronteiras — como a vichyssoise ( “a rainha das sopas”), a sopa de peixe do Harry’s Bar, em Veneza, a avgolemono grega, de limão, e o gaspacho andaluz.

Só destoam, nisto tudo, as “costeletas à Manuel Pedrosa”, prato apátrida e de confecção duvidosa. Para além do suspeito tempero de margarina e sumo de alperce, Sttau Monteiro indicava que assassem durante uma hora no forno “a uma temperatura média” — o que, normalmente, as tornaria rijas e secas como solas. Percebendo a cabeça de Sttau Monteiro, pode ter sido só mais uma patranha do crítico mais malandro do Portugal contemporâneo, uma espécie de assassinato público do seu anterior pseudónimo. O texto, aliás, rematava assim: “Manuel Pedrosa, se este artigo te for parar às mãos, não me trames. Olha que eu sou teu amigo…”

Fonte: Eggas

Ricardo Dias Felner  Escritor e Jornalista

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