Quem eram os Malês? Quais as relações com os Orixás FunFun e a possível mistica Sufi na Bahia.

A Revolta dos Malês foi protagonizada por um certo setor da população negra que residia na Bahia da época: os negros Africanos, em especial os Malês que correspondiam aos africanos islamizados.
Os Malês exerciam influência em boa parte da população africana e negra da Bahia, não apenas entre os praticantes do Islã. Muito de sua cultura está até hoje presente na população do estado, como é o caso do uso de abadás.


Levante Malê"
A vitória vem de Alá!", dizia o fragmento em árabe encontrado dentro de um amuleto malê confiscado pela polícia, durante o Levante Malê, cerca de 600 revoltosos, muçulmanos e não muçulmanos, responderam ao chamado e participaram do levante.Até os africanos que não participaram do levante de 1835 sofreram perseguição policial.
Um decreto assinado pelo chefe da Polícia, Gonçalves Martins, autorizava qualquer cidadão a dar voz de prisão a escravos, muçulmanos ou não, que estivessem reunidos em número de quatro ou mais. Reunir gente em casa, por exemplo, passou a ser terminantemente proibido.
No entanto, a tão esperada vitória não chegou.
Os corpos dos 73 rebeldes mortos foram jogados em valas comuns de um cemitério local.
Os mais de 500 presos foram interrogados, julgados e punidos.As penas variavam de açoites para os escravos a deportação para os libertos.
Quatro deles receberam a pena máxima: enforcamento. 

As autoridades mandaram construir forcas novas no Campo da Pólvora, em Salvador.
Mas se esqueceram de contratar um carrasco para fazer o serviço, na falta de um, os condenados foram mesmo fuzilados, em praça pública, por um pelotão improvisado.

Ao longo da primeira metade do século 19, muitos dos africanos muçulmanos traficados para a Bahia - em sua maioria haussás, etnia que prevalece na região hoje equivalente ao norte da Nigéria - eram soldados capturados durante uma jihad, ou "guerra santa" em árabe.

"Eles se diferenciavam dos demais por serem alfabetizados em árabe e por terem conhecimentos de matemática", explica Ribeiro.

Os negros de Salvador tinham uma vida não tão confinada quanto a dos negros do interior, ou por alguns serem libertos, ou por serem os chamados “escravos de ganho” que passavam boa parte do dia longe de seus senhores.


O islã foi trazido ao Brasil no final do século XVIII pelos escravos oriundos das regiões islamizadas da África. Sua influência na África começou no século VII com a invasão pelos povos árabes do norte do continente. A resistência foi pouca e a região passou a ser governada por califas, que introduziram a religião islâmica nas terras conquistadas, juntamente com práticas culturais árabes.
O islamismo é até hoje a religião dominante nessa área, existindo porém um amálgama com práticas animistas e fetichistas ancestrais em diversas tribos.
O islamismo de escravidão tem, portanto, seu início com a chegada ao Brasil, principalmente na Bahia, de milhares de prisioneiros advindos de guerras político- -religiosas na região do Sudão Central, que hoje equivaleria ao norte da Nigéria.
O califa haussá, do grupo étnico fulâni, Usuman du Fodio, em 1804 declarou uma guerra santa, jihad, contra outros reinos haussás, acusados por não praticarem a religião do Profeta de modo digno, misturando-a com práticas animistas (Reis, 2003, p. 73).
Do longo conflito resultou a tomada de prisioneiros de ambos os lados da batalha, que eram vendidos aos traficantes de escravos, embarcados nos navios negreiros para o Brasil, sendo a grande maioria do sexo masculino, pois raramente mulheres eram feitas prisioneiras de guerra. Esses prisioneiros tinham em comum, além da pele negra, a crença islâmica, apesar de algumas diferenças nas práticas e dogmas. Em solo brasileiro, porém, o destino trágico compartilhado não tardou por unir os antes inimigos em uma forte identidade comum.
Os primeiros muçulmanos a chegarem ao Brasil, trazidos à força, eram haussás na sua maioria, seguidos de cativos dos reinos Gurma, Borgu, Borno, Nupe e outros reinos vizinhos dos haussás, localizados no Sudão Central (Reis, 2003, pp. 159-63).
Sendo área ricamente influenciada pela cultura árabe, esses naturalmente trouxeram consigo a religião muçulmana e aqui ficaram conhecidos pelo nome de malês, que vem do termo iorubá imali, significando “renegado, que adotou o islamismo” (Ramos, 1951, p. 317).
Apesar de esses negros malês possuírem um grande desenvolvimento cultural – sabiam ler e escrever em árabe –, foram obrigados a despir suas túnicas brancas e a viajar trajados sumariamente em porões escuros dos navios negreiros.

Na obra aqui citada é possível observar que este fato deu a possibilidade de os negros, até mesmo os escravizados, conseguirem organizar sua vida com uma muito pequena autonomia frente o branco escravista, pequena mas suficiente para permitir encontros festivos e religiosos – Malês ou do Candomblé – que serviram como formas de organização, e mobilização.
Alguns negros chegavam a ter pequenas moradias, ou quartos alugados, onde guardavam pertences pessoais, artefatos culturais, e até mesmo armas brancas, utilizadas pelos africanos na Revolta dos Malês. 


Para Arthur Ramos, “o islamismo dos negros malês do Brasil sempre esteve eivado das práticas religiosas africanas”, fenômeno que havia se iniciado na própria África. “Adoravam Alá, Olorun-uluá (sincretismo de Olorum dos Yorubá e Alá) e Mariana (mãe de Deus).” Ramos acredita, portanto, que as sobrevivências malês acham-se diluídas nas práticas e cultos jeje-nagôs ou bantos, das macumbas e candomblés do Rio, Bahia e outros pontos do Brasil, tendo a cultura malê se amalgamado às outras culturas africanas, criando sincretismos, podendo hoje só ser detetadas por meio de alguns termos, roupas e práticas (Ramos, 1951, pp. 332-3).
Segundo Roger Bastide (1971), em 1937, o candomblé baiano tinha ainda conotação malê, demonstrada por algumas palavras, expressões e orações com semelhança na aplicação dos rituais malês.
Pierre Verger (1968, p. 520), bem depois, estudando as religiões africanas no Brasil sugere a possibilidade de existirem muçulmanos pertencentes a uma das irmandades negras dedicadas a Nossa Senhora do Rosário em Salvador, Bahia. Waldemar Valente (1976) realizou diversos estudos, buscando as sobrevivências do islã negro através das marcas muçulmanas nos xangôs de Pernambuco e demais cultos afro-brasileiros.


Awúre àwúreBó kún súré àjàláÒjísé t'ayóOlóri nşe èrò èrò
Que baba Ajala, o modelador de cabeças, abençoe nosso Ori com muita calma para que nos alcancemos à felicidade.
Que nosso pai Oxalá nos abençoe no dia de hoje !Epa Epa Babá

Òrìsà-Nlá ou Obàtálá, “O Grande Òrìsà” ou “O Rei do Pano Branco”, ocupa umaposição única e inconteste do mais importante orixá e do mais elevado dos deuses iorubás.Foi o primeiro a ser criado por Olódùmarè, o Deus Supremo.

É também chamado Òrìsà, ouObà-Igbò ou Òrìsà-Ìgbò 
[...] Foi encarregado por Olódùmarè de criar o mundo com o poder desugerir (àbà), e o de realizar (àse), razão pelo qual é saudado com o título de Aláàbáláàse [...]
Os deuses da família Òrìsàálá-Obàtálá deveriam ser, sem dúvida, os únicos a serem chamados de Orixás, sendo os outros deuses chamados por seus próprios nomes.
Essa família de Orixás Funfun, os Orixás [da cor branca], é a daqueles que utilizam oefum (giz branco) para enfeitar o corpo. São-lhes feitas oferendas de alimentos brancos, como pasta de inhame, milho [branco], caracóis e limo da costa.

O vinho e o azeite proveniente do dendê, e o sal, são suas principais interdições.
As pessoas que são a ele consagradas devem vestir-se sempre de branco, usar colares da mesma cor e pulseiras de estanho, chumbo ou marfim.
A coroa de Òrìsànlá-Obà-Ìgbò teria sido conservada até hoje no palácio do Óòni, Reide Ifé.
Essa coroa, chamada aré, é elemento essencial na cerimônia de entronização de um novoÓòni.
Este, antes de sua coroação, deve dirigir-se ao templo de Òrìsànlá [...] Os sacerdotes deÒrìsànlá desempenham um papel importante nessas ocasiões [pois] participam de certos ritosdurante os quais eles próprios colocam a coroa na cabeça do novo soberano de Ifé [...]
Além disso, o Óòni deve enviar todos os anos seu representante a Ideta-Oko, onde residiu Òrìsànlá.

O representante deve levar oferendas, recebendo as instruções e as bênçãos de Òrìsànlá.
Os nagôs, que no século XIX, formavam a maioria dos escravos baianos, celebravam em suas terras africanas o culto ao Orixá criador, a quem atribuíam à condição de filho do Deus supremo e o status de Pai Soberano entre as outras divindades, prestando-lhes um culto especial em colinas.

O Senhor do Bonfim, orago da sagrada colina, de um templo onde se celebrava com escorrer de água um rito periódico, é Jesus Cristo, o filho de Deus, invocado como Pai Soberano de todos os Santos. Além disso, se Oxalá é o criador, o pai da vida por excelência, tem a ver coma morte, tal como o Senhor do Bonfim.

Desta forma, a cerimônia da lavagem do Bonfim trouxe à memória desses escravos nagôs da Bahia os ritos lustrais, praticados por seus antepassados, característicos do culto a Oxalá, mas essa memória não é vista aqui como um resgate de um determinado tipo de culto praticado em África.
Ela tem uma função social.
É o momento em que esses africanos e afro-descendentes constroem uma identidade religiosa e reafirmam suas formas de sociabilidades.
A água é muito utilizada nas religiões de matrizes africanas. Em muitos rituais ela aparece tendo um significado muito importante, desde o ritual do ìpàdé, quando ela é utilizada para acalmar as ajé, até a cerimônia das águas de Oxalá, quando ela simboliza a limpeza lustral do “egbé ilé” (comunidade de terreiro).
A água está relacionada através das Àyabás (Òrìsàs, mães Rainhas) à fecundidade, riqueza e à feminilidade.
Cada um desses Orixás domina uma fonte própria de água como: rios, mares, lagos e cachoeiras.
Colocar água sobre a terra significa não só fecundá-la, mas também restituir-lhe seu sangue branco com o qual ela alimenta e propicia tudo que nasce e cresce em decorrência, dos pedidos e rituais a serem realizado.
Deitar água (jogar ao chão) é iniciar e propiciar um novo ciclo.
Outro significado das águas de Oxalá no Candomblé, em que a água é reverenciada como elemento portador do axé da vida, é que ela é essencial para renovar situações. 
Aqui no caso, foi o reconhecimento de Xangô ante o poder de Oxalá.
Os banhos litúrgicos chamados de àgbos, amacís e omierós, são a junção do ejé ewé (sangue das folhas) com o àse (força) das águas.
Estes banhos são utilizados nas iniciações, limpezas espirituais, encantamentos e prevenções de doenças.            

Foi Oxalá, na qualidade de Òbàtálá, quem moldou na argila o ser humano, deu-lhe um nariz para respirar,olhos para ver, uma boca, ouvidos, deu-lhe enfim um rosto e uma personalidade.
Entretanto Eléèmi é quem lhe deu o sopro vital. 
A cor branca, que contém as cores, exprime a ideia do ser indiferenciado e imóvel; é representada pelo àlá, o grande pano branco que esconde o mistério da vida e da morte, que cobre Oxalá, e o corpo das ìyàwo durante a iniciação.

Como Deus da criação Oxalá e onipresente o branco de Oxalá está presente em todo ritual, em todo peji, em toda comida de santo que deve incluir invariavelmente o egbo de milho de Oxalá.Oxalá é, portanto um deus branco, o deus funfun; o povo de santo diz é um deus árabe que atravessou o deserto para fundar a nação yorùbá, nação na qual se fundem, a ideia do branco da criação, a idéia da raça branca como raça superior que estaria na origem do povo yorùba, e a idéia do herói mítico Odùduwá que veio de leste para fundar Ifé.

Tudo que é de Oxalá é branco; tudo que lhe é oferecido; animais, comidas, flores deve ser branco e imaculado.
Seus filhos devem vestir-se de branco no dia que lhe é consagrado, a sexta-feira; todos no candomblé, seja qual for o seu santo, e inclusive os outros orisàs quando se manifestam, devem vestir-se de branco.

Por ser Òxalá o deus funfun, quem é albino é considerado no candomblé como filho dele.  
Oxalá é o Sopro Divino, a primeira manifestação individualizada de Olorun que é a vida una, eterna, invisível, mas onipresente; sem princípio e sem fim; inconsciente, mas Consciência Absoluta; incompreensível, mas realidade existente por si mesma. 
Oxalá o  Sopro-Divino, provoca o movimento que fecunda e energiza o Eterno em repouso no Oceano-do-não-ser, onde tudo existe sem forma e, ocasionando o surgimento da diferenciação, desperta o Plano Divino, onde jaz oculta a elaboração de todos os seres e coisas futuras.

Elbein dos Santos (1993, p. 75), por sua vez, afirma que ele “simboliza o elemento fundamental do início da criação, da matéria original de água e massa de ar que deram origem a novas formas de existência, tanto no aiyé (a terra)como no òrun (o céu), sendo ambos controlados por ele.
O Ojà, o grande pano branco, é seu emblema, onde ele abriga a vida e morte”.
Na língua Iorubá, a cor branca chama-se funfun. 
Ela, ao lado de outras duas cores como o osun (vermelho) e o waji (azul escuro) podem representar muito bem a síntese do pensamento negro-africano yorubá reconstruído no Brasil.
Diferente da conotação ocidental da paz e do conceito islâmico de pureza, embora possa dialogar com estas duas concepções, a cor branca representa a criação, o momento primordial, o “começo do começo” quando ainda não havia separação entre o mundo invisível e o visível, conforme nos conta alguns mitos. Por isso que branco é a cor do alá de Oxalá.
Um pano de algodão sem forma sobre o qual todos se abrigam. Funfun é a cor de Oxalá chamado Orixá N´Lá, Orixás das Alturas.
Designação genérica dos primeiros grupos humanos que partiram do Continente Africano em todas as direções para povoar o mundo. Branca é a cor de Oduduwa, o criador do Universo, das primeiras civilizações que realizavam trocas utilizando panos tecidos com o algodão.

Branca é a cor de Obatalá, “rei do pano branco”, o criador dos seres vivos, também conhecido pelo nome de Alabaxé, aquele que detém o princípio de realizar todas as coisas.
Branca é a cor dos ancestrais fundadores das primeiras cidades iorubás como Obalufon; Oxolufan e Elejibô.

Branca é a cor de Orunmilá, aquele que entrou a frente de Oduduwa na terra criada como seu conselheiro.
Branca é a cor de orixá Okô, a agricultura, indispensável ao desenvolvimento das civilizações e surgimento das cidades.
Branca é a cor de Orixá Okê, as montanhas, um dos primeiros seres criados no mundo. Branca é a cor de Yemowo, companheira inseparável de Obatalá.

Branca é a cor de Ayalá, aquela que baila com os antepassados no mercado e dança na frente do Rei.
Branca é a cor do renascimento, da existência sem forma, da continuidade, do mistério, dos antepassados, daqueles que nossos olhos não alcançam.
Branca é a cor do Efun, pó mágico que nos esconde da morte e que a noite cega a visão.
Branca é a cor dos ancestrais adorados nas árvores como Dankô, Ayan, Iroko, Apaoká e Iwin.
É por fim, a cor do invisível.
Ela nos protege daquilo sobre o qual não se pode falar.
Do segredo que escapa a compreensão de algumas pessoas.
É por causa destes significados que o candomblé veste branco em todos os ritos de passagem.
Ela acompanha o nascimento e a morte.

O nascer e o morrer cobre-se de branco.
Branca é a cor dos Ciclos, mas em especial do Ciclo das Águas, chamada Awon Omi Oxalá, Águas de Oxalá, onde até a nossa cabeça é coberta pelo efun em sinal de respeito, adoração e memória às nossas origens.
Diante do que é funfun nos silenciamos, nos recolhemos, nos guardamos para vivenciarmos o mistério.
Mistério da vida que se renova ao amanhecer do dia através dos primeiros raios de sol e alimenta as plantas durante a noite através do orvalho, nos enchendo de esperança. Ai são alguns motivos que fazem vestir branco e seguir para a Casas do Rei e Senhor das Alturas.Babá"
Vilson Caetano

Òrisalá, Òrisanlá, Osalá ou Obatalá simboliza um elemento fundamental do começo dos começos, massa de ar e massa de água; um dos elementos que deu origem a novas formas de existência – a protoforma e à formação de todos os tipos de criaturas – no aiyé e no órun.
Os funfun(traduzido como branco) são as entidades que manipulam e têm o domínio sobre a formação de seres deste mundo – os ara-aiyé – e também a formação dos seres do além.
Os vivos e os mortos, os dois planos da existência, são controlados pelo àsé de Orisanlá.
O àlà, o grande pano branco, é o seu emblema.
É embaixo do àlà estendido que ele abriga a vida e a morte. Um dos ritos, quando do ciclo litúrgico de Osalá, consiste em estender um longuíssimo pano imaculado suspenso e sustentado por cima da cabeça dos participantes, e todos os presentes se colocam embaixo, cantando e dançando numa procissão ritual, simbolizando assim o fato de que eles se colocam sob a proteção do grande Òrisá-funfun”.    

        “O esoterismo islâmico”


E não é só a cor branca e sua intrínseca relação com a criação do mundo e os sentidos de pureza e espiritualidade que remontam o uso desta cor – que é a cor da lã! – que podemos aproximar e analisar como uma síntese religiosa entre a prática ancestral africana e o chamado mundo muçulmano,em África.


Influencia do Sufismo.
Segundo Mario Alves da Silva Filho, em seu trabalho "A mística islâmica em Terræ Brasilis: o sufismo e as ordens sufis em São Paulo", seria impossível afirmarmos até que ponto o Sufismo influenciou os muçulmanos negros no Brasil.
Supõe-se que havia entre eles dervixes ou, pelo menos, a sobrevivência de alguns costumes Sufis.
Após a Revolta dos Malês houve grande perseguição aos muçulmanos, especialmente na Bahia, com deportação, morte ou fuga para outros Estados.
Seu afastamento das fontes africanas fez com que a fé se enfraquecesse, culminando no desaparecimento dos malês.

No entanto, as outras práticas como a da reclusão, cânticos, poesias – há autores que associam os Itans (poesias de sacerdotes de Ifá, na decifração do destino) a uma possível influência da poética “muçulmana” – e uso de músicas rituais, como não podem ainda ser datadas,geram múltiplas questões e dúvidas sobre se a prática islâmica – compreensão de mundo a partir dos ensinamentos de Maomé, que datam do século VII – foi fator determinante da prática sufi, ou se os sufistas – prática de muitos clãs africanos concentrados ao norte da África, e anterior ao Islã –criaram, a partir da assimilação de conceitos islâmicos, uma nova ideologia e prática religiosa,expandida na hégira muçulmana.
Podemos imaginar que os escritos do Corão podem ter servido aos clãs africanos como os escritos Mosaicos – As Tábuas de Moisés – serviram para orientar e doutrinar judeus e, posteriormente, os cristãos.
Essa passagem pode ser compreendida como o início do contato com a escrita em contraposição a tradição de oralidade dos povos africanos contactados.

A Mistica Sufi

O que difere o Sufismo das demais religiões, numa primeira olhada, é o que também lhe confere uma especificidade dentro do próprio islamismo: sua condição de busca esotérica (pelo menos em boa parte do Sufismo, pois existe também, em alguns países islâmicos, o sufismo popular, caracterizando-se como uma religiosidade popular).
Nesse sentido, como todo esoterismo, a via súfica se caracteriza como um caminho interior e que privilegia este jeito de busca com tudo que ele exige: um processo de iniciação, rituais que marcam esta iniciação, a existência de um mestre (sheiq), estágios e práticas interiores, corporais, coletivas etc, a serem cumpridas.
E, sobretudo, há o cultivo de um segredo a ser mantido, segredo este diante do que não se deve e não se pode falar, mas, sobretudo, deve ser vivido e experimentado, pois ultrapassa em muito as categorias com as quais se pode explicitar, além de ser um segredo que resguarda a intimidade dos amantes: o Amado e o buscador ou gnóstico.

Luísa Mahin: Liderança na Revolta dos Malês 

Mulher negra africana nascida em Costa Mina, na África, que veio para a Bahia, no Brasil, como escrava e que se tornou líder da Revolta dos Malês (1835). Pertencia à nação nagô-jeje, da tribo Mahin, daí seu sobrenome, nação originária do Golfo do Benin, noroeste africano que no final do século XVIII foi dominada pelos muçulmanos, vindos do Oriente Médio.

Tornou-se livre (1812) e sobreviveu trabalhando com quituteira em Salvador, Bahia, e dizia ter sido princesa na África. Participou de todos os levantes escravos que abalaram a Bahia nas primeiras décadas do século XIX, entre elas a Revolta dos Malês, a maior de todas as rebeliões de escravos ocorridas na Bahia.
O movimento iniciou-se na noite de 24 para 25 de janeiro (1835), liderado por escravos africanos de religião muçulmana, que eram conhecidos na Bahia como malês. 

O dia foi escolhido propositalmente, pois enquanto os senhores celebravam no Bonfim, em Salvador, o dia de Nossa Senhora da Guia, os malês encerravam o Ramadã, mês de jejum dos muçulmanos.
Cerca de 600 escravos e recém-libertos, por algumas horas tornaram-se senhores das ruas de Salvador, mas apesar dos comunicados entre revoltosos serem através de mensagens escritas em árabe e levante ter sido planejado cuidadosamente, os planos dos revoltosos foram revelados às forças da repressão e os líderes do movimento foram perseguidos e castigados brutalmente.
Foram cerca de 70 mortos e 500 insurgentes punidos com penas de morte, prisão, açoites e deportação. A pretensa rainha conseguiu fugir para o Rio de Janeiro (1837), onde continuou a luta pela liberdade de seu povo até ser presa e desapareceu (1838), podendo ter sido deportada para a África. Como negra africana, livre, da nação nagô, pagã, sempre recusou o batismo e a doutrina cristã, e um de seus filhos naturais tornou-se poeta e um dos maiores abolicionista do Brasil, Luís Gama (1830-1882), nascido em Salvador e morto em São Paulo.
Por iniciativa do Coletivo de Mulheres Negras de São Paulo, seu nome foi dado (1985) a uma praça em Cruz das Almas, bairro da capital paulista.

Fontes


Luiz L. Marins

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