Pequeno Dicionario da Cozinha Baiana

Verbete-B Bolo de Tapioca 
O Bolo de Tapioca faz parte das "Merendas na Bahia", uma refeição leve, composta por pequena porção de alimentos, entre as refeições principais, geralmente entre o almoço e o jantar. 























Para Comer, Tem que merecer. 
A palavra Merenda, vem do latim merere, "merecer", onde para comer algo, todos tinham que fazer por merecer. 
A proposito, existe uma relação muito tênue entre o alimento e o merecimento. 
Os romanos mantinham fornos coletivos (O fornax), onde se assavam os famosos panis, metade indispensável da política imperial do panem et circenses, se concentravam próximos dos arcos dos aquedutos (que eram chamados de fornix), local onde se aglomerava o populacho para fazer fila e espantar o frio e a fome. 
Ali também as trabalhadoras do sexo ganhavam seu pão, daí a palavra fornicare, ganhou significado de meretrício, prostituição. 
O termo meretriz, vem do verbo merere = merecer, aquela que "tem que fazer por merecer" , da mesma raíz, só comiam merenda (palavra romana que significava a refeição do meio entre o almoço - prandium - e a janta - cena) aqueles que julgavam a si próprios como "os que merecem". 
 Tapioca 
"Tudo é meio rustico, alva que chega a brilhar, cor de roupa quarando sob o sol, branquinha fina flocada ou de caroço, a Tapioca não é para principiantes, qualquer deslise, poe a perder a preparação."

Diferentemente de outras regiões do nordeste, na Bahia, a Tapioca se refere basicamente a farinha, onde sua grande concentração de amilose, faz com que se torne grudenta e pegajosa, bem sabiam os índios tupi-guarani que a batizaram de tipi'óka «aglutinado». 

A culinária brasileira deve aos indígenas o legado da utilização da mandioca, os tupi-guaranis, ocupavam a faixa litorânea leste do território brasileiro desde o sul até o norte, foram os responsáveis pelo domínio das técnicas da domesticação da mandioca, que, produzida sob o sistema da agricultura de subsistência, era a base da alimentação do Brasil até a chegada de Pedro Álvares Cabral. 

"Deu Branco" 
A expressão "deu branco" talvez seja uma injustiça com a falta de memoria, a tapioca faz parte do inconsciente coletivo quando falamos em comidinhas afetivas, todos nós temos claras lembranças da cozinha de nossas mães e avós. 
O coco seu eterno companheiro lhe confere sabor e cheiro refinado, da Fufuca (mistura do coco ralado e da tapioca, torrados) ao Cuscus cozido ou cru, do delicioso sorvete nas tardes da Ribeira, e os Beijus Molhadinhos, envoltos em folhas de banana do café da manhã, passando pelo Mingau, ou mesmo as famosas Punhetas batizadas por Jorge Amado, são tidas como comidas brancas.

Alegria para corações melancólicos este bolo, tornou-se Torta, acrescido de Doce de leite cremosos, lá pelos idos dos 70, nas docerias do Relógio de São Pedro, então centro nervoso da Cidade do Salvador, até hoje fazem bela figura nas horar da tarde que batem a fome. 
Um ótimo acompanhante pode ser um cafezinho preto, sem açúcar de preferencia. 

“Aprendi fazendo, quebrando a cabeça até encontrar o ponto (Não foi amando que aprendi a amar, não foi vivendo que aprendi a viver?).” 

A cozinha feminina sempre se valeu da intuição e da afetividade. 
As fronteiras entre real e ficcional se desvanecem no relato da culinarista Dona Flor, em carta enviada ao Jorge Amado.

"Vinte bolinhos de massa puba ou mais, conforme o tamanho que quiser. 
Aconselho dona Zélia a fazer grande de uma vez, pois de bolo de puba todos gostam e pedem mais. 
Até eles dois, tão diferentes só nisso combinando: doidos por bolo de puba ou carimã. Por outra coisa também?
Me deixe em paz, seu Jorge, não me arrelie nem fale nisso. Açúcar, sal, queijo ralado, manteiga, leite de coco, o fino e o grosso, dos dois se necessita.
(Me diga o senhor, que escreve nas gazetas: por que se há de precisar sempre de dois amores, por que um só não basta ao coração da gente?) As quantidades, ao gosto da pessoa, cada um tem seu paladar, prefere mais doce ou mais salgado, não é mesmo? A mistura bem ralinha. Forno quente." 

O livro Dona Flor tem algumas receitas da culinária baiana, onde a protagonista é professora da « Escola de Culinária Sabor e Arte ». 
Compartilhar uma refeição saborosa é parte do prazer corporal, ao qual se seguem outros momentos ainda mais « doces » ou « apimentados ».
Cozinhar é uma das práticas de sedução da mulher, pois, como diz o ditado, ela faz de tudo para « agarrar o marido pelo estômago ». 
Vadinho, seu parceiro também é frequentemente associado a determinados alimentos, como « meu doce de coco » ; na distância a falta se manifesta como “fome” do ser amado; no jogo da sedução um « devora » o outro com os olhos. 

As metáforas culinárias no jogo amoroso são constantes e fazem parte do nosso cotidiano. 
O maroto Vadinho quase sempre se dirige a Flor usando metáforas em que ela representa o alimento : « meu manuê de milho verde, meu acarajé cheiroso, minha franguinha gorda » e outras variações ; designá-la como comida saborosa dá a dimensão da relação física entre dois amantes que nem a morte conseguirá separar. Segundo o narrador do romance, essas « comparações gastronômicas davam justa ideia de certo encanto sensual e caseiro de dona Flor » (Amado, 1984b, p. 16). 
A associação entre culinária e erotismo aparece também no trocadilho de Vadinho com o nome da Escola Sabor e Arte : « quero saborear-te » (Amado, 1984b, p. 79). Os dois personagens – Flor e Vadinho - se complementam na cama; se ela é comida, ele é bebida: « A presença noturna de Vadinho a embriagava, vinho de buquê inebriante, como resistir à sedução de sua boca de palavras e língua ? » (Amado, 1984b, p. 102). 

Dona Canô grande doceira santamarense, conhecia bem o trato e os segredos da utilização da tapioca, que ela chamava de Bolo Angélico

A alquimia que a matriarca dos Veloso, desenvolveu na cozinha do casarão em que a família viveu tem raízes bem fincadas na culinária típica do Recôncavo baiano, com ingredientes mais do que tradicionais como o dendê, o sururu, a puba e a tapioca, além é claro do camarão seco.

Dona Deinha, mãos de fada na cozinha e minha professora de banca, também preparava divinamente este bolo, com requintes na extração do leite de coco, que sempre avisava ser o ponto fundamental na execução de pratos da cozinha baiana.











Bolo de Tapioca receita de Dona Deinha.
Ingredientes:
3 xícaras (de chá) de farinha de tapioca granulada 
1 coco seco 500 ml de leite 
1/2 xícara (de chá) de farinha de trigo 
3 colheres (de sopa) de manteiga sem sal 
1 e 1/2 xícara (de chá) de açúcar 
4 ovos 1 colher (de sopa) de fermento em pó Royal

Modo de Preparo:
Descasque o coco, inclusive aquela parte marrom junto à polpa. 
Deixe só a parte branca. 
Corte em pedaços pequenos e coloque no liquidificador, junte o leite e bata bem até ficar bem fino. 
Depois junte a manteiga, o açúcar e as gemas e bata um pouco mais. Em uma tigela coloque a farinha de tapioca e a farinha de trigo. Junte a mistura que está no liquidificador delicadamente com as farinhas na tigela. 
Acrescente o fermento e misture novamente. 
Bata as claras em neve e delicadamente agregue à massa do bolo. 
Despeje a massa em uma forma untada e enfarinhada (com farinha de trigo) e leve ao forno médio (180 graus) por mais ou menos 40 minutos. Ou até que você enfie um palito e ele saia limpo. Espere esfriar para desenformar, se quiser cubra com doce de leite cremoso. 

Como extrair o leite de Coco 
Leve o coco ao forno pré-aquecido a 200-220 °C por aproximadamente 20 minutos, ou até rachar – pode colocar o coco direto na grade do forno. 

Mais saudável, totalmente artesanal e fácil de fazer, o leite de coco pode ser extraído em duas versões: a grossa (primeira extração) e a fina (a que vem da polpa já moída pela primeira extração). Leite de coco grosso: basta bater no liquidificador, por 4 minutos, 2 xícaras (chá) de coco ralado (você pode ralar a própria polpa ou comprar ralado, desde que seja fresco) com 1 xícara (chá) de água mineral, ou mesmo de água de coco. Numa tigela coberta por um pano de prato limpo, despeje a mistura. Faça uma trouxinha com o pano e aperte bastante para extrair todo o líquido da polpa. Eis o leite de coco grosso. Leite de coco fino, ou ralo: use a mesma trouxinha contendo o bagaço que sobrou do leite de coco grosso. Coloque dentro de uma tigela e abra o pano. Regue com 1 xícara (chá) de água morna. Volte a espremer a trouxa. Molhe-a no líquido que agora está na tigela e volte a espremer. Repita o processo por cerca de 8 vezes, até que o líquido fique branco. Tem que apertar bem, para extrair tudo! A saber, a versão rala tem menos gordura do que a grossa.

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