Curso de gastronomia forma time de chefs sustentáveis

Projeto lança olhar consciente sobre a cozinha, estimula ao máximo o aproveitamento dos alimentos nas aulas e capacita novos agentes de transformação

Da casca da banana nasce um belo de um brigadeiro, já aquela casca grossa do abacaxi, quem diria? Vira um caldo delicioso coringa para qualquer sobremesa. Talos de hortaliças e legumes também têm vez, vão compor o recheio de quiches e tortas. Essa reinvenção toda de sabor com o uso consciente dos alimentos é experimentada por alunos do curso de Gastronomia Sustentável, um projeto global da Electrolux.

A iniciativa vai no contrafluxo do desperdício, já que, de toda comida produzida no mundo, cerca de um terço acaba parando no lixo. Só no Brasil, são 40 mil toneladas desperdiçadas por dia, de acordo com o World Resources Institute (WRI). Quantidade que daria para alimentar cerca 19 milhões de pessoas diariamente ao longo de um ano.
E é justamente despertar a consciência na ponta da cadeia produtiva um dos principais objetivos dessa ação da Electrolux. “A ideia original nasceu em 2016, dentro da parceria global Feed The Planet, alinhada com a Agenda de Desenvolvimento Sustentável 2030 da ONU, que tem entre as metas o combate ao desperdício de comida”, explica o coordenador de projetos sociais da empresa, Cosimo Scarano. “Então, pensamos em algo de impacto social que empoderasse pessoas fora do mercado de trabalho, as ajudasse a arrumar emprego e que também focasse na sustentabilidade”, completa.
A empreitada teve início em Curitiba no ano passado, capacitando 70 participantes em quatro turmas, das quais 50% já estão empregados e dois empreenderam negócio próprio. Em São Carlos, no interior de São Paulo, o curso acaba de formar 10 novos técnicos de cozinha e mais que isso: agentes de mudanças em suas comunidades.
mulher na cozinha preparando receitas
 “Eles saem daqui com propósito de levar essa preocupação para a casa deles. Eu fiquei superfeliz porque eles começaram a produzir o que a gente ministrou em aula e a vender na vizinhança. Então, eu entendo que não é apenas um curso, é uma forma de engajar o ser humano e de difundir isso também na comunidade”, comemora Edgar Barbosa, um dos cinco chefs voluntários da primeira turma de São Carlos.
Segundo o vice-presidente de Recursos Humanos da Electrolux, Valmir Buscarioli, a ideia é que o curso faça diferença no futuro dos alunos. “Queremos empoderar essas pessoas, em sua maioria arrimos de família, prepará-las para o mercado de trabalho e ajudar a melhorar a vida delas”, afirma o executivo.
alunos com o diploma na mão durante formatura
Janileide Silva Santos, de 23 anos, que parou de estudar na 7ª série, nunca antes havia tido acesso a um curso profissionalizante. “Agora é colocar esse diploma no currículo e, se eu conseguir qualquer coisa em restaurante ou lanchonete, eu vou”, planeja.
Janileide cozinhando
A pernambucana que está há 3 anos em São Carlos sabe bem da importância da culinária consciente. O que vai para a mesa na casa dela é somente o que de fato será consumido, nada além disso.
“Eu tinha sete anos e precisava limpar a casa da vizinha para ganhar um macarrão, um arroz, uma fruta, porque faltava para mim e para meus quatro irmãos, então, eu sempre falo em casa para não desperdiçar. A pessoa que passa fome sabe da importância de não jogar comida fora”, afirma.
Das receitas aprendidas com os chefs voluntários, a do bolo feito com casca de abacaxi foi a que mais a surpreendeu. A mesma que também fez os olhos de Gilvaneide de Souza, de 43 anos, brilharem. Mas essa não foi a única! A cuidadora de idosos, que também está desempregada, vibrou ao saber que aquelas folhas murchas esquecidas na geladeira podem ir para a panela e com tempero e molho de tomate virarem recheio de tortas.
Além das receitas e técnicas de preparo, o cronograma das aulas, que tem duração de 10 semanas, aborda consumo consciente de alimentos, normas e definições de cozinha, treinamento com o RH e empreendedorismo.
aluna janileide com diploma nas mãos

Cozinha, consciência e afeto

O curso Gastronomia Sustentável tem uma madrinha de peso, a chef morena Leite, formada há 20 anos na renomada escola Le Cordon Bleu, de Paris. Ela é o nome a frente do grupo de restaurantes Capim Santo.
De sustentabilidade, comida e afeto pelo outro e pelo planeta, ela entende. Criada em Trancoso, no litoral da Bahia, ela cresceu no meio das panelas à beira do fogão à lenha, vendo os pais colherem verduras do quintal e separando o lixo. Mas essa consciência explodiu dentro dela quando tirou um ano sabático em Bali, no continente asiático, e conheceu a escola Green School, tida como um centro de ensino mais comprometido com o futuro do planeta. De lá para cá, ela leva cada vez mais essa preocupação para seus projetos.
Morena leite
Com a Electrolux, Morena criou o Instituto Capim Santo, uma escola de cozinha que capacita jovens e adultos para se inserirem no mercado de trabalho. “Eu tenho uma relação superfiel e apaixonada pela Electrolux porque eu acredito nos princípios e nos valores da marca. Então, estamos nessa parceria há um bom tempo e entendemos o quanto a cozinha pode ser um meio de transformação social”, destaca.

“Eu acho que a sustentabilidade vem aliada a uma palavra chamada consciência. É o consumo consciente, a ação consciente de tudo que eu faço.” (Morena Leite)

Para a chef Morena, a cultura brasileira da fartura à mesa é um dos pontos que mais acentua o problema do desperdício, mas reduzir isso está ao alcance de todos, segundo ela. “Fora do Brasil, como as pessoas viveram em guerra, existe um cuidado muito maior com o desperdício. Aqui como a gente tem muita abundância, desde as famílias mais simples, elas não têm consciência de que um talo de salsinha, a casca do coco, enfim, tudo pode ser aproveitado”, avalia.
Junto com a Electrolux, a chef quer levar este projeto de transformação social e o consumo consciente dos alimentos para os fóruns sobre sustentabilidade ao redor do mundo.
Além de São Carlos (SP) e Curitiba (PR), o Gastronomia sustentável – que conta com o apoio da AIESEC, prefeituras das cidades participantes, Sodexo On-site, Instituto Stop Hunger e a World Chef – será estendido a outras cidades brasileiras e também a outros países.
Argentina, Egito e Suécia estão no roteiro. “A gente está com um planejamento até 2030 com planos de expansão global. Estamos presentes em mais de 60 países, a Sodexo igualmente e a AIESEC, em 120 países. Então, parceiros não faltam, é só alinhar as expectativas”, conclui o coordenador Scarano.
Ficou com vontade de fazer você também a sua parte? Nenhum lugar é tão oportuno como a cozinha para aplicar o que Lavoisier dizia: “Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”.

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