Pequeno Dicionario da Cozinha Baiana

Verbete-C Canjica de Milho
Ao juntar o Milho e o Coco, os baianos contribuíram profundamente no sabor de alguns pratos, e criaram um distintivo culinário, que eu diria único, uma marca indelével de sabor e personalidade.
A suavidade do creme de milho, mais os sabores untuosos do coco e da manteiga, fazem desta preparação algo digno das melhores mesas, com personalidade rompendo padrões regionalistas.

Muito desta inovação se deve as peritas mão negras, eximias cozinheiras baianas, que não abriam mão de "perder" horas no preparo de tal iguaria.


O dicionário Houaiss cita como uma provável origem do português, canja, enquanto o pesquisador Ney Lopes (Dicionario Banto no Brasil)acredita que a palavra vem de kandjica, da língua africana quimbundo, que é falada em Angola, há mais possibilidades também de ser originária do quicongo, língua banta falada pelos quicongos em Angola "kanjika" como sinônimo de papa de milho grosso cozido.


O sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, o termo deve-se a nossa herança Tupnambá, e que o termo provém do termo Tupi "Acanjic", outra hipótese sustentada pelo filólogo Antonio Geraldo da Cunha (Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa-Nova Fronteira, 1986) também tentou decifrar o enigma etimológico da canjica. Cunha se distancia tanto da hipótese ameríndia quanto da africana. 
O perito entende que canjica vem de uma outra palavra portuguesa. Para ele, a origem de canjica é o termo canja, o termo viria de Kanji, termo da língua malaiala falada na região de Malabar, sudoeste da Índia e que significa “arroz com água”. 
Assim, conforme os estudioso, o nome de batismo da canjica tem origem asiática. Devido a intensa a presença portuguesa na Índia, particularmente em Goa, a partir do século 16, lembra-nos Eduardo Viaro que os “portugueses tiveram contato direto com vários povos da Ásia”. 
O mesmo estudioso afirma que o malalaia enquadra-se dentre as línguas indianas com as quais os portugueses mais tiveram contato, ao lado do concani e do tâmil. 
Em Viaro estando correto, a brasileiríssima canjica é prato híbrido, cujo nome procede do distante oriente. Assim, o insosso arroz foi substituído pelo milho, e o leite de coco tomou o lugar da água.
Favorecendo a hipótese de Viaro, temos que considerar as intensas relações comerciais entre Índia e Portugal entre 1497 e 1860. 
'Castelo de Santo Ângelo' ou 'Fortaleza de Cananor', localizava-se na cidade portuária de Cananor, no estado de Kerala, na costa sudoeste da Índia.
A chamada “carreira da Índia”, o roteiro marítmo, incluía o porto da Bahia, por meio dele, muitos produtos orientais, particularmente indianos, foram trazidos ao Brasil, ao longo dos séculos 16, 17, 18 e 19. 
É o caso do cravo e da canela, dois condimentos da celebrada canjica. Vê-se, pois, que o delicioso manjar junino, a Canjica, pode ter se originado em três distintos pontos da geografia: Brasil; Angola/Congo e Índia (Goa). 
 Aos peritos em etimologia, fica a tarefa de dirimir qual das três hipóteses é a mais acertada, ou apresentar uma outra mais condizente com a documentação. 
 
Um Pouco das Origens da Canjica
Apesar dos índios brasileiros já consumirem o milho antes da chegada dos colonizadores ao nosso pais, considera-se que foram os jesuítas os responsáveis pela introdução do Milho no Brasil.
O curioso é que os índios que habitavam o Brasil antes da chegada dos portugueses, também faziam importantes rituais durante o mês de junho. 
Apesar de essa época marcar o início do inverno por aqui, eles tinham várias celebrações ligadas à agricultura, com cantos, danças e muita comida. 
Índios Puris da Zona da Mata

A chegada dos jesuítas portugueses, representou uma fusão entre os costumes indígenas e o caráter religioso dos festejos juninos, celebrando santos católicos, e uma variedade de pratos feitos com alimentos típicos dos nativos. 

Observando a grande quantidade de pratos típicos, tão comuns nesta época, que tem sua base nos grãos e raízes que nossos índios cultivavam, como milho, amendoim, batata-doce e mandioca. 


A colonização portuguesa, deu maior dimensão adicionando novos ingredientes, técnicas e receituário, principalmente quanto ao milho, bolo, cremes e manjares ou mesmo o milho em natura, cozido ou assado na brasa, passaram a fazer parte e abrilhantar os festejos; além disso era prato quase obrigatório no jejum da Sexta-feira Santa, fazendo parte do hábito da data.
Relatos da vida cotidiana de São Paulo no seculo XVIII, como o Códice Cesar Matoso(1749) estão repletos de relatos sobre a preparação do Curau, como é conhecido pelos paulistanos, segundo o Dicionario de Palavras Brasileiras de Origem Indígena, consta a palavra provem do Tupi antigo, que significa "Que volta a cabeça".
Canjica, Jimbelê ou Curau, importa pouco, quando falamos do delicioso sabor desta iguaria tipica brasileira, ralados na pedra o milho, sem adição de líquidos, adquiria 
consistência cremosa,  que apurada em grandes tachos de cobre, regalavam panças abastadas dos proprietários de engenhos, mas o que realmente fará a grande diferença nesta preparação, será a adição do leite de Coco.

           A contribuição negra na Canjica
             
Vendedoras de Milho Verde- Debret

Acredita-se que a Canjica tenha chegado ao Brasil com os escravos e era alimento bastante comum nos quilombos e senzalas e foram se hibridizando com ganhou novos ingredientes, formas de preparo e embalagens, hoje visto nas melhores delicatessens.
Infelizmente muito da nossa tradição culinária vem se perdendo, devido a muitos fatores, que não é necessário elencar, mas quem em sua mocidade teve a oportunidade de provar a feitura de uma boa Canjica, saberá do que falo.
Felizmente o brasileiro vem deixando o costume de consumir somente nas festas juninas, onde esta iguaria está sempre presente junto com outros alimentos à base de milho, como pipoca, pamonha e milho verde.
Receita de Canjica da Bahia de Dona Alice Dias de Abreu.

Ingredientes: 
20 espigas de milho grandes; 
2 cocos secos médios; 
1/2 xícara rasa de manteiga de boa qualidade; 
Açúcar a gosto; 
1 pitada de sal; 
1 boneca de gaze com Cravo e Canela 

Modo de preparo: 
Com o coco ralado de costas, passar em tecido fino, para extrais o leite grosso, esquentar um pouco de água e acrescentar o coco, para extrai o leite ralo, depois reserve. Rale o milho e passe numa peneira de arupemba, somente para tirar o bagaço. 

Em seguida, moer na maquina de moer, aparando o suco. 
Obs. Nunca colocar água neste processo, passe por peneira fina o líquido cremosos obtido. Leve ao fogo o caldo passado na maquina, junto com o leite ralo do coco, o açúcar, a boneca de tecido com as especiarias, o sal e a manteiga de boa qualidade, mexendo sempre. 
Atente para o ponto da Canjica, sem deixar de mexer, e vá pouco-a-pouco adicionando o leite grosso do coco e mexa até dar o ponto. Se reconhece o ponto, colocando em um pires, umedecido, um pouco da Canjica, ela deve ficar coalhada e com a superfície lisa. Na época da minha infância, esta preparação era feita para dois tipos de Canjica: 
A de corte e a de beber. Serve-se com canela em pó

Comentários

  1. O milho é uma das grandes riqueza de nossa culinária. Ele incrementa muitos pratos , sejam doces ou salgados, dando um sabor incomparável quando associado ao coco . Esse Dicionário da Língua Portuguesa é um Luxo!

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