Efó, uma crônica culinária

Por:Fatima Dannemann 
 A Globalização mudou a culinária. Comida típica na mesa dos baianos agora é salmão, carpaccio ah… e trufas de chocolate. 

Nada contra isso, pelo contrário, menciono com água na boca alguns dos meus pratos preferidos. Mas, por essas e outras é que a culinária da terra anda esquecida. Muita gente desconhece o que seja um arroz d’Haussá (delícia das delícias para quem aprecia arroz e erivados), um bobó de camarão (tem gente que nunca viu um pessoalmente) e pior: desconhecem completamente, o supra-sumo da culinária baiana, o rei dos pratos, sua magestade, o Efó. 
Por conta da “culinária sem fronteiras” que estamos assistindo, estou há algum tempo sem provar o efó, uma delícia esquecida. 
Mas, ainda bem que já comi alguns efós (muito bem feitos, aliás) em minha vida, pois comer este prato é como beijar ou andar de bicicleta, quando a gente experimenta, nunca mais esquece porque só tem duas possibilidades, ou você ama ou detesta esse exótico prato feito com folhas e a mesmíssima base de temperos do vatapá, caruru e demais pratos baianos (culinária baiana é a mesma coisa que doce de aniversário, só trocar o leite condensado por dendê, camarão seco, castanha, gengibre, amendoim e cebola e você faz maravilhas com esses temperos). 
O detalhe é que não achamos nem mais quem prepare um bom efó as donas de casa se queixam que a língua de vaca ou a taioba (folhas usadas para fazer efó) além de difíceis de serem encontradas nas feiras e supermercados (aposto que ninguém nem procura) não rende depois de cozida. 
Encolhe e tornam o efó economicamente inviável. Esse papo não cola muito não. 
Espinafre encolhe, couve encolhe e ninguém deixa de comer souflé de espinafre ou caldo verde por causa disso. 
Uma pena disto tudo é que sem a baba do quiabo, o peso do vatapá ou do feijão fradinho, o efó tinha tudo para ser o grande sucesso das mesas locais. 
Leve, saboroso e acho que nem engorda porque é feito com folhas, e justamente por isso, politicamente correto nesses tempos de culto ao físico. 
Muito me admira é que justo quando comer folha vira moda o efó esteja vivendo uma aposentadoria precoce e forçada. Acho que num canto da horta, a taioba e a língua de vaca pensam lá com suas nervuras: “o que o espinafre tem que eu não tenho?” É que soube que andam fazendo efó com espinafre como se fosse para ser servido ao Marinheiro Popeye. Mas, não deve ter o mesmo gosto. 
Mas, baiano come repolho (no árabe), alface (na salada), couve (no cozido), espinafre (nos lanches naturebas), mas não come mais efó dizendo que não rende e que as cozinheiras não sabem fazer. 
Grandes coisas, a base é a mesma do caruru, vatapá e todos os pratos pois, como já disse, comida baiana é que nem doce de aniversário: só trocar um dos ingredientes e mexer a panela de forma diferente. 
Mas, a temperada é só a mesma e mais: o efó alimenta e os ecologistas iam adorar ver aquela coisa verde na tigela, parece musgo. 
Mas, como quem não tem cão caça com gato, estou indo até a esquina comer um abará. 
Quando nada, vem enrolado numa folha. 
De bananeira, mas verdinha que nem manda o figurino.

Fevereiro 19, 2009 
Maria De Fatima Dannemann é jornalista e escritora

Comentários

  1. <3 Disse tudo!!! O supra sumo da comida baiana!! Alem de ser o o mais maravilhoso dos pratos, ele é modesto, reservado, só se dá pra quem merece! HAHAHAH <3

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  2. Ah, Fátima Danneman, pois eu vou preparar um efó de taioba amanhã, com algumas grandes folhas que comprei na feira do MST, na Piedade. Estava procurando a receita e me deparei com sua crônica, que adorei!

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  3. O suprassumo da perda de identidade gastronômica da Bahia, revelou-se no dia em que, ao indagar, na Feira de São Joaquim, onde poderia comprar língua-de-vaca para fazer efó( como fazia minha avó, no Rio de Janeiro), fui orientado, por muitos, a ir nos fundos do Mercado, onde eram descarnados bois. Fiquei abestado. Reparei, então que dois senhores, sentados e já idosos, conversavam tranquilamente em iorubá. Com calma, interrompi-os, me desculpando pelo ato, e lhes pedi orientação a respeito: responderam-me atenciosamente, que encontraria, mas que teria que encomendar antes. E pensei comigo: -"triste Bahia! Não é mais a de meus pai nem dos meus antigos"...e fui beber uma também triste cerveja.

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