Pequeno Dicionario da Cozinha Baiana

Verbete-B Baiacu de Moqueca
Baiacu em Gameleira.

Meter-se a cozinheiro, sem um pouco de feitiçaria, talvez não seja pra qualquer um, mas a literatura e no realismo magico nós permite adentrar no universo eternizado pelo João Ubaldo Ribeiro e suas historias de Itaparica. 
Lá onde Rita Popó deliciava seu homem, ao vapor do baiacu, reconhecidamente o melhor peixe do mar, iguaria para homenagens e confraternizações, cujo sabor e finura são reputados sem rival.


O Baiacu ou baiacu mirim (Sphoeroides testuneus)  possui a propriedade de encher-se de ar ou água e eriçar centenas de pequenos espinhos, como defesa natural para não ser atacado por peixes maiores. 
Sua coloração pardacenta no dorso e amarelada nos flancos. Apresenta pintas e manchas por todo o corpo, tem ventre branco e corpo alongado e liso, com pequenos espinhos espalhados pelo mesmo, boca pequena, contendo um par de dentes fortes e fusionados em cada maxila, lembrando um bico de pássaro. 

Sua dieta alimentar inclui moluscos, crustáceos e algas. 

O Baiacu é um peixe venenoso devido à presença da neurotoxina tetradotoxina (TTX) concentrada na pele, fígado, no baço e nas gônadas. Para os pescadores da localidade de Baiacu, em Vera Cruz, na Ilha de Itaparica, esta toxina se concentra numa estrutura do corpo que eles denominam “umbigo” 
Uma vez retirada a glândula, a carne do baiacu torna-se um tradicional ingrediente para múltiplas preparações como o sashimi (Fugu) ou no nosso caso o Baiacu de Moqueca.

No Caribe, há relatos da utilização da tetradotoxina extraída de baiacus em cultos de magia negra, especificamente o vodu, onde os zumbis seriam indivíduos supostamente mortos, mas sob doses controladas de TTX e outras neurotoxinas “reviveriam” posteriormente. (DAVIS, 1988)

Nos restaurantes japoneses, os chefes de cozinha que preparam fugu são cuidadosamente treinados para evitar a contaminação da carne quando removem as gônadas tóxicas. 
O fugu é a única iguaria que é proibida para o Imperador do Japão e sua família. 
Enquanto, no Japão, o fugu é considerado uma iguaria, no Brasil o baiacu não é aceito como um acepipe a ponto de constar no menu dos diferentes restaurantes especializados em frutos do mar. 
Contudo, este peixe é bastante apreciado pelos pescadores em Baiacu – Vera Cruz.
Baiacu, baiagu, sapo-do-mar, peixe-balão ou lola (ainda que este termo se aplique mais ao gênero zoológico Takifugu) são as designações populares comuns a diversos peixes da ordem dos Tetraodontiformes, comuns na fauna fluvial da América do Sul e, mais especificamente, do Brasil.

Moqueca- decifra-me ou te devoro
Bahia, é nesse pedaço de chão que tudo começa, antropologicamente se mistura e culturalmente se engrandece. 
No alto de um pequeno morro, as paredes que restaram de uma igreja do Século 16 são sustentadas por raízes de gameleiras, árvores sagradas do candomblé.
Dentro, imagens de Jesus Cristo se misturam a Iemanjás, Iansãs, Padilhas e Pretos Velhos.
Raízes sustentam paredes quebradas, teias e aranhas.
“A igreja foi fundada em 1561, no entorno de uma aldeia indígena. É a região onde se estabeleceu o primeiro culto aos eguns. 
Uma índia, no Século 16, teria incendiado a primeira versão da edificação. 
Hoje, vários terreiros da ilha fazem cultos no local.
No fundo tem um cemitério ainda usado pela comunidade de Baiacu.


O nome da comunidade, Baiacu, em Itaparica,  tem origem tupi, mayacu, “peixe tetraodontiforme (venenoso), que possui em abundância na contra-costa da Ilha” (PAIXÃO, 2012, p. 01). 
A atividade pesqueira faz parte da história da Ilha de Itaparica. Os registros históricos apontam que, desde a ocupação portuguesa, em 1560, há presença da atividade. A ocupação pelos jesuítas, nas terras da Ilha, se fez no ano de 1560. Foi, então, instalado um pequeno povoado que recebeu o nome de Vila do Senhor da Vera Cruz e, nele, foi construída a primeira Igreja Católica da Ilha, assim como um mosteiro. Esse povoado foi emancipado e passou a ser chamado de Vila de Baiacu, que, em meados da década de 1970, era a mais importante colônia de pesca da Ilha de Itaparica (MINEIRO 2010).

Salga do Baiacu
Uma especificidade do resgate histórico da comunidade de Baiacu, a qual na contemporaneidade não se faz presente graças a outras formas de manejo e conservação do pescado, era o processo de “salgar” o peixe, onde os pescadores destacam que houve algumas transições importantes sobre a atividade pesqueira na comunidade, e que as mulheres sempre possuíram papel central na produção pesqueira. 
A atividade pesqueira faz parte da história da Ilha de Itaparica.

Baiacu ao sol foto:(Agliberto Lima)

A “História da província de Santa Cruz” descrita pelo capitão Baltasar Ferreira ou como é mais conhecido Pero Magalhães Gandavo, a origem do nome Baiacu é decorrente do nome do pescado venenoso presente no local. 
Para Moreira (2009), a comunidade do Baiacu é assim designada em virtude dos moradores relacionarem uma quantidade significativa de peixes da espécie baiacu na localidade que tomaram por moradia. 
Eles associam o pescado à comunidade a sua história de ocupação, sua paisagem, seu povo, os traços da atividade pesqueira artesanal como parte de sua cultura. 


Uma herança deixada pelos indígenas e negros que “ganhou” aperfeiçoamento e manuseio das técnicas e atualmente possui status profissional.
Observa-se na comunidade a herança da cultura primitiva, tradicional e primária, no que se refere ao manuseio da pesca, pois os pescadores ainda cultivam os hábitos e costumes indígenas, seja no uso de material da pesca [...] seja para “perguntar” à natureza se a maré e o tempo estão bons para a pescaria. 

Os registros históricos apontam que, desde a ocupação portuguesa, em 1560, há presença da atividade. 
A ocupação pelos jesuítas, nas terras da Ilha, se fez no ano de 1560. Foi, então, instalado um pequeno povoado que recebeu o nome de Vila do Senhor da Vera Cruz e, nele, foi construída a primeira Igreja Católica da Ilha, assim como um mosteiro. Esse povoado foi emancipado e passou a ser chamado de Vila de Baiacu, que, em meados da década de 1970, era a mais importante colônia de pesca da Ilha de Itaparica (MINEIRO 2010). 
Essa ocupação fomentou a caça da baleia em Itaparica. 
Tudo começou em 1602, quando a Coroa Ibérica (união de Espanha e Portugal) permitiu que estrangeiros pescassem baleias nas águas do Brasil. 
O reino espanhol aproveitava a experiência de Pêro de Urecha e seu sócio, Julião Miguel, que iniciaram seus trabalhos na Bahia. 
Eles vinham da província de Biscaia (província localizada no norte da Espanha), e possuíam tradição de captura do cetáceo (CASTELLUCCI JUNIOR, 2005). 




No início do século XVI (1560), Baiacu era considerada a mais importante e tradicional das comunidades existentes na Ilha de Itaparica.
Tornou-se vilarejo, batizada de Vila de Nosso Senhor de Vera Cruz, onde o jesuíta Luís da Grã e seus companheiros de catequese aportaram e edificaram a segunda igreja católica matriz no Brasil, sob a invocação do Nosso Senhor da Vera Cruz, catalogada entre as primeiras edificações religiosas do Brasil, por onde passou o padre Manoel da Nóbrega e José de Anchieta. 
As ruínas da segunda capela (foto acima) evidenciam uma igreja do século XVIII de obra jesuítica. 
A igreja matriz de Vera Cruz situada em pequena elevação à margem da estrada que liga a sede do município com o povoado do Baiacu, próximo à costa sudoeste da Ilha de Itaparica. 

A pesca (como se afirmou anteriormente) é a atividade mais antiga presente no Baiacu. 
Os tupinambás, indígenas que ali moravam antes da ocupação portuguesa, já praticavam a pesca como forma de subsistência. 
Com a vinda dos negros escravizados, e os próprios portugueses com a prática da pesca da baleia para extração do óleo vegetal, a pesca artesanal absorveu novas técnicas de produção, a exemplo da pesca noturna e de rede. 
Destaca Diegues (1983), uma característica de pescaria é típica dos africanos. 

Com o decorrer dos anos, a pesca no Baiacu vai deixando seu aspecto de subsistência e passa a ser uma atividade com dupla função: tanto para o próprio consumo dos moradores quanto para atividade comercial. 
Esta especificidade trará para a atividade pesqueira mudanças significativas e novas formas de apropriação. 
Tais mudanças não se darão apenas no aspecto econômico, sobretudo nas questões sociais, nas relações, questões ambientais e principalmente sobre a identidade de ser/se fazer pescador(a). 
Apesar da pesca artesanal e a mariscagem serem, atualmente, as principais atividades econômicas da comunidade, ela enfrenta muitos desafios pela sua permanência cultural tanto no Baiacu quanto para o próprio município de Vera Cruz.

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