A boca movimenta o mundo.

Tal qual a musica e a religiosidade, a Gastronomia Afro-Brasileira, é sem sombra de duvida, um dos grandes legados da cultura negra no Brasil, fruto de uma complexa construção entre etnias, ela reflete claramente as características de nossa gente.























 Estética e Cromatismos:
A cozinha baiana, teve forte influencia dos negros que foram aqui trazidos como escravos, misturando, criando e adaptando produtos, foram construindo uma requintada cozinha multi-cromática, de verdadeiro complexo de refinamento estético.
Quando degustamos um prato, todo repertório de sentidos é exercitado, nosso arsenal de memórias é ativado, ao ponto que muito do que ingerimos, pode nos remeter a lembranças da nossa infância, ao cheiro da cozinha da avó e dos almoços de domingo em família.
As cores vibrantes do Azeite de Dendê, tem forte simbolismo para as religiões de matriz africana, além disso, estimula o raciocínio, a percepção e a criatividade, também pode ser usada para representar alegria, otimismo e riqueza.

Sons, texturas, paladares, cheiros, cores são possibilidades de identificação do universo e são tanto mais seguras quanto mais fiéis à capacidade exclusiva de cada uma daquelas emanações dos sentidos.” (FERRARA, Lucrécia D’Aléssio. Leitura sem palavras. SP: Ática, 2007)










Considerada povos primitivos, por muitos, os africanos, produziram no Brasil, uma cozinha que nos remete a elementos da natureza, fruto da percepção do contexto em que viviam, abstraindo através da sua religiosidade, um sentido de imanência.

Segundo o antropólogo Julio Tavares "A comida sempre desempenhou um papel de ligação deste mundo material com o mundo espiritual.
Através da comida acontece, na verdade, uma espécie do aproximação entre os habitantes de ambos os mundos."
Dar comida a santo é, simbolicamente, compartilhar com o universo dos orixás o estado de vida existente nesta terra”.
E foi a comida que fortaleceu o negro simbolicamente, comida revestida de oferenda, plasmado no grande leque de cores que constituem a cozinha baiana.

Elementos e técnicas: 
"Entender da comida, decodificar cada ingrediente, oferecer, provar, nutrir, são alguns dos caminhos que o candomblé segue na aliança permanente com a ação de alimentar, fortalecer e manter vivos deuses e homens. Essa preocupação está nos planos do sagrado e do humano."
(LODY, 1992:54)

Singularmente a cozinha africana foi se reelaborando em terras brasileiras, se adaptando a novos produtos, sem preder seu principal sentido, a generosidade.
Devido a escarces de alimentos e a fome, muitos negros e negras foram aproveitados para o serviço domestico e culinário, onde foram reproduzindo e reelaborando suas praticas culinárias,
Povos jejes, bantos, nagôs-iorubas, foram dando forma a uma das cozinhas mais emblemáticas do Brasil.

Os negros comiam basicamente frutas, leguminosas e verduras, plantados e colhidos por eles próprios em pequenas hortas ao redor das senzalas.
As folhas e ervas, também faziam parte desta alimentação, preparados cozidos ou acrecidos a alguma preparação.
Comidas pastosas ou cremosas, são algumas referencias até hoje como no caso do Bobó e do Vatapá.
Segundo pesquisadores, o consumo de amidos nos dá uma boa ideia da diversidade de soluções de vida.
 Analisando arquivos da Santa casa de Misericórdia, encontramos informes sobre o consumo da farinha de mandioca vinha em primeiro lugar, seguida pelo milho (em quantidade 10 vezes menor) e pelo arroz (metade da produção do milho), representando o feijão 70% do arroz estocado.

A arte da sedução através de preparos e combinações exercida pelos serviçais, foi claramente se impondo a mesa do colono, adaptando elementos europeus, aos produtos da terra, conferindo assim, um sabor muito particular.

Identidade Alimentar: 
Para a Antropologia, Identidade consiste na soma nunca concluída de um aglomerado de signos, referências e influências que definem o entendimento relacional de determinada entidade, humana ou não humana, percebida por contraste, ou seja, pela diferença ante as outras, por si ou por outrem. Portanto, Identidade está sempre relacionada a ideia de alteridade, que é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage e interdepende do outro.
É necessário compreender alteridade, não como concordância e sim, uma aceitação de ambas as partes. ou seja, é necessário existir o outro e seus caracteres para definir por comparação e diferença com os caracteres pelos quais me identifico.

A alimentação, quando constituída como uma cozinha organizada, torna-se um símbolo de uma identidade, atribuída e reivindicada, por meio da qual os homens podem se orientar e se distinguir. Mais do que hábitos e comportamentos alimentares, as cozinhas implicam formas de perceber e expressar um determinado modo ou estilo de vida que se quer particular a um determinado grupo. Assim, o que é colocado no prato serve para nutrir o corpo, mas também sinaliza um pertencimento, servindo como um código de reconhecimento social.


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